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O impacto positivo da Lei Anticorrupção

Corrupção é uma expressão multifacetada, que comporta inúmeros significados. Desde uma acepção técnico-jurídica estrita até a mais coloquial significação. Todas, contudo, levam a uma única conclusão: não é uma conduta aceitável socialmente. Não é aceitável porque rompe um pacto social ético e moral que deveria nortear o comportamento. Não é certo que uma pessoa ou grupo de pessoas obtenha vantagens à custa de prejuízo de outra ou da sociedade.

Um ato de corrupção usualmente envolve duas partes, o corruptor e o corrupto. Embora partes do mesmo ato, corruptor e corrupto têm em geral uma forma bastante diversa de comportamento perante a sociedade. O corrupto, salvo exceções, é discreto, quando não secreto. Procura manter o ato ilegal sob o mais estrito sigilo. Normalmente peca pelos sinais externos de riqueza incompatível com a sua renda, que tenta justificar como derivada de uma herança ou trabalho da esposa.

Interessante é a contraparte no ato de corrupção. O corruptor, ao contrário do corrupto, usualmente não se reconhece infrator. Gaba-se de ter obtido a licença ambiental negada a tantos. Vangloria-se de manter sob pagamento um servidor ou todo um órgão público para as liberações, alvarás e autorizações necessárias à sua atividade econômica. Ou reclama o dinheiro perdido na propina. Para o corruptor, o infrator é sempre o outro.

Estranhamente, dada a necessidade de duas partes para a prática da maioria dos atos de corrupção, o objeto de reprovação jurídica e social tem sido, em geral, apenas a conduta dos agentes públicos. A Lei n.º 12.486/13, denominada Lei Anticorrupção, que entra em vigência a partir de fevereiro de 2014, pode constituir um poderoso instrumento para incluir no foco das investigações e punições dos atos de corrupção a parte sem a qual inúmeras condutas ilegais não poderiam materialmente ser praticadas: as empresas corruptoras e corruptas.

A nova lei apresenta uma relação de condutas bastante conhecidas daqueles que fraudam a administração pública: dar ou oferecer vantagem indevida a servidor público; fraudar licitações ou contratos públicos; manipular contratações públicas; criar pessoa jurídica de modo fraudulento para participar de licitações (de modo a escapar de sanção), dentre outras tantas. A pessoa jurídica que praticar qualquer das ações ilegais poderá sofrer sanções que vão desde o pagamento de significativa multa fixada com base no faturamento bruto, passando pela perda de bens ou valores, suspensão parcial das atividades, até a dissolução compulsória.

Cogita-se que a lei não seria necessária, pois já teríamos leis suficientes aptas a punir empresas corruptas. É certo que a impunidade não é produto de insuficiência de normas. Deve-se reconhecer, porém, que uma lei nova sempre traz o benefício da novidade e, com ele, ao menos a sensação de mudança positiva. Porém, mais do que alterações legislativas, a sociedade brasileira carece de mudança para assimilar culturalmente o fato de que a corrupção não é produto de conduta exclusiva de servidores públicos, e passar a identificar nas empresas ou pessoas particulares corruptas o mesmo vício nefasto que tanto prejuízo acarreta para o interesse público. Talvez assim o corruptor ao menos passe a ter vergonha de revelar a propina paga.

José Anacleto Abduch Santos, advogado e procurador do Estado, é mestre e doutor em Direito Administrativo pela UFPR e professor do Unicuritiba.

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