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 | Hugo Harada/Gazeta do Povo
| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

A Constituição da República completa 30 anos no início de outubro em meio a um cenário que é, ao mesmo tempo, instigante e perturbador. É impressionante o avanço tecnológico irrefreável em todas as dimensões da vida do cidadão. Isso tem acarretado intensas mudanças na forma de a sociedade se comunicar e se informar, bem como nas relações econômicas, na forma de consumir produtos e serviços, e, como se observa cotidianamente, na formação das convicções políticas. A tecnologia da informação está rapidamente avançando sobre todas as atividades do cidadão do século 21 e, por consequência, acelerando a transformação da sociedade.

Mas é perturbador que, ao mesmo tempo em que esse notável desenvolvimento impacta significativa parcela da população brasileira, parte dela ainda continue marginalizada. E o Estado, que poderia ser o catalisador de mudanças positivas para todos os brasileiros, permaneça inerte, em uma crise fiscal severa, com grande dificuldade em achar o caminho para a retomada do crescimento.

A reflexão sobre a Constituição que se faz aqui parte da constatação desse cenário. A sociedade brasileira está mais complexa e mais dinâmica do que aquela em que vivia o legislador constituinte, em 1988, e dificilmente ele poderia imaginar que o mundo seria tão diferente, três décadas após constituir o seu legado.

A sociedade brasileira está mais complexa e mais dinâmica do que aquela em que vivia o legislador constituinte

Daí que as novas questões da atualidade, quando confrontadas com a Constituição, colocam o intérprete diante de um desafio sem precedentes na história – é preciso entender o impacto da tecnologia nas concepções jurídicas, mas sem descuidar das virtudes do texto constitucional.

Afinal, quando erigiram a Constituição, os legisladores olhavam para o retrovisor e o que viam não era um cenário edificante, em um país recém-saído de uma ditadura. E, diante da realidade brutal que a população estava deixando para trás, optaram por erigir um documento com força normativa para que jamais fossem permitidos novos atentados ao regime democrático.

Sob essa perspectiva, os direitos e garantias fundamentais do cidadão se tornaram foco central da atenção do constituinte, a fim de não abrir margem para que decisões arbitrárias, sem respaldo na lei e na Constituição, pudessem voltar a acontecer. A Constituição que foi legada ao povo brasileiro, nesse sentido, é primorosa.

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E é a partir da consciência desse legado que as novas questões que se apresentam na pauta pública – bem como as antigas que ressurgem – precisam ser analisadas. Esta segunda década do século 21, que já vai se aproximando do seu fim, necessita de respostas condizentes a este momento histórico. Ao mesmo tempo, é imprescindível que não se deixem de lado os direitos e garantias fundamentais tutelados pela Constituição de 1988.

O texto constitucional garante ao cidadão que ele jamais terá sua esfera privada violada de forma arbitrária pelo Estado, e também oferece as condições necessárias para se construir uma sociedade igualitária. Não se pode esquecer que a Constituição de 1988 foi apelidada de “Cidadã” justamente por ter colocado os direitos e as garantias fundamentais como tema central de suas preocupações. E, qualquer que seja o rumo que a interpretação constitucional venha a tomar, esses aspectos devem ser levados em consideração num sentido forte, protetivo ao indivíduo, a fim de possibilitar que ele exerça sua liberdade, em condições igualitárias aos demais cidadãos, e permitir-lhe realizar a sua busca pela felicidade.

Durval Amaral é presidente do Tribunal de Contas do Estado do Paraná.
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