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O grande dramaturgo e jornalista Nelson Rodrigues, ao ser perguntado em uma de suas últimas entrevistas que conselho daria aos jovens, respondeu direto: “envelheçam”. Ele era conhecido pelo senso de humor ácido, e neste caso expressou seu inconformismo com o que julgava ser a excessiva valorização da “jovem guarda”, que começava a ocupar espaços na música popular, na cultura de massas e era a inspiração para a moda. Nelson era remanescente da, talvez, última geração em que a juventude constituía no máximo uma transição para a maturidade; adolescentes sonhavam ser adultos, procuravam imitar os mais velhos em roupas e condutas, pois apenas eles tinham direitos plenos.

Ao longo do século vinte os jovens ocidentais passaram a ter maior liberdade de escolha e comportamento, assumindo um protagonismo sem precedentes; a juventude tornou-se novo ideal de vida e a busca pela aparência adolescente em modos e trajes disseminou-se. Ainda que isto tenha aspectos positivos, como a prática de atividades físicas, alimentação saudável e relações mais amigáveis e informais entre as gerações, gera algum constrangimento quando filhos e pais, professores e alunos, parecem desconhecer os limites necessários de seus respectivos papeis na sociedade, na escola e na família.

Ao longo do século vinte os jovens ocidentais passaram a ter maior liberdade de escolha e comportamento, assumindo um protagonismo sem precedentes

Ocorre também, paradoxalmente, que ao lado de muitos adultos que recusam a maturidade numa ilusória juventude eterna, muitas crianças perdem a infância na busca do acesso mais rápido às maravilhas da adolescência. E por isso devemos assumir nossa responsabilidade: em que pese de forma geral amarmos nossos filhos, passamos a acreditar que a infância tal como era concebida há algumas décadas não seria mais necessária. Trata-se de um período apenas de preparação de novas unidades humanas para a futura competição a que estamos todos destinados, de capacitação para “vencer na vida”, seja lá o que isso signifique.

Então, os colocamos em escolas desde tenra idade, e não apenas para um convívio saudável e prazeroso com outras crianças, mas sim para que aprendam a competir, tirar vantagem, ser o melhor, com muitas atividades extracurriculares que possam representar um ganho contra possíveis concorrentes no dia de amanhã, ocupando todo o tempo que poderia ser livre para brincar, jogar sem estruturação adulta, conversar sem finalidade pedagógica, andar em grupos a esmo, ler revistinhas e livros de sua livre escolha.

Sem dúvida é muito por meio da literatura infantil que a criança desperta sua imaginação e tem várias de suas perguntas respondidas sobre o mundo e seu arcabouço, e por isso a viagem pelo mundo das princesas, bruxas, heróis de vários tipos, o espaço interplanetário, desperta sua criatividade, concentração e poder resolutivo, levantamento de hipóteses e modos de sociabilização, desenvolvendo a linguagem oral e mesmo a escrita.

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Pais e professores precisam lembrar que a literatura não tem apenas finalidade educacional, pois quando exigimos das crianças um treinamento constante, em primeiro lugar estamos desprezando sua capacidade de aprender de formas inesperadas, em situações não exatamente desenhadas com tal finalidade, e depois, estamos colaborando fortemente para com a obsessão pelo sucesso a todo custo, provocando o aparecimento do medo absurdo do fracasso escolar ou profissional, que aumenta a ansiedade e impede a correta instrução.

Quando adotamos este comportamento, é imensa a probabilidade de criarmos pessoas estressadas que, na verdade, não amadurecerão, ficarão mais velhas sem ter vivido em plenitude; que procurarão este paraíso perdido ao longo da adolescência e início da idade adulta, adotando comportamentos de risco na vida pessoal e perseguindo quimeras do ponto de vista político ou econômico.

O direito à infância constitui-se verdadeiramente no olhar global do sistema educativo familiar e escolar, incorporando novas dimensões às experiências iniciais, infância e adolescência, destinados a nos tornar versados na arte de existir, em cada fase, no melhor de cada idade.

Wanda Camargo é educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil (UniBrasil).
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