| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Estamos discutindo mais uma reforma da Previdência – e certamente não será a última antes de eu me aposentar. Aumento na idade mínima, maior contribuição, menor benefício. Por que isso aconteceu?

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A previdência no Brasil é solidária: depende das contribuições presentes para seu funcionamento. A nossa aposentadoria não é como uma conta individual, em que minhas contribuições serão resgatadas por mim no futuro. É um só sistema contributivo e coletivo. No entanto, as pessoas estão se aposentando cedo para os padrões dos seus benefícios, vivendo mais e tendo cada vez menos filhos.

Não tem jeito – ou revertemos a queda da taxa de fertilidade agora ou as próximas reformas irão impor maior idade mínima, maior contribuição e menor benefício. Teremos poucos jovens sustentando o sistema com uma parte grande de seus salários, e muitos idosos com benefícios insuficientes.

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O estrago já está feito: a população brasileira ficou mais velha e tivemos uma queda na taxa de fertilidade

Além disso, o estrago já está feito: ao mesmo tempo em que a população brasileira ficou mais velha – o que é bom, com aumento na expectativa de vida pulando de 54 anos em 1960 para 74 anos em 2014 –, tivemos uma queda na taxa de fertilidade: de 6,21 filhos por mulher em idade fértil em 1960 para 1,79 em 2014. A taxa de reposição da população é de 2,1 filhos por mulher. Isso significa que já não conseguimos mais repor a população, e nas próximas décadas teremos uma diminuição do número de brasileiros, o que causará impactos complexos na economia e na sociedade. Teremos uma baixa na população economicamente ativa, menos contribuintes, menos trabalhadores, menos famílias e famílias menores.

Desde pequenos, fomos bombardeados com a história de que a população, principalmente a mais pobre, cresce mais rápido do que a nossa capacidade de produzir alimento, ou que nossos recursos são insuficientes para tanta gente. Essa ideia não é nova, e já tem mais de 200 anos no mercado. Foi primeiramente publicada por Thomas Malthus, tendo ganhado novas roupagens no século 20. No entanto, todo esse alarde é uma grande lorota. Um artigo publicado no número 528 da revista Nature aponta este como um mito que não quer morrer, mesmo já tendo sido refutado. Não há falta de recursos naturais, nem alimentos, nem água, nem espaço. Há, sim, desigualdades que precisam ser corrigidas.

A queda da taxa de fertilidade é, antes de tudo, um típico problema de primeiro mundo, com resultados conhecidos: uma empresa portuguesa começou a pagar aos seus trabalhadores um bônus de 500 euros para seus funcionários terem filhos (lá, a taxa de fertilidade é de 1,21). As crianças alemãs de hoje devem ter de trabalhar até os 71 anos para se aposentarem (lá, a taxa de fertilidade é de 1,39). A Itália, que tem taxa de fertilidade igual à alemã, pode dar 800 euros por mês para cada bebê que nascer no país. A China tenta reverter desesperadamente o problema demográfico permitindo um segundo filho – lá, a taxa de fertilidade é de 1,56.

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Casos concretos de como podemos reverter esse problema vêm da Suécia e da França, que conseguiram manter ao longo dos anos uma taxa próxima da reposição da população (1,89 para a Suécia e 1,99 para a França). A solução adotada passa eminentemente pela valorização da família, entendendo que ela é a base da nossa sociedade; favorecendo o envolvimento dos avós numa lógica de solidariedade, em que pais, filhos e avós possam contribuir para o desenvolvimento da família; promovendo a responsabilidade social das empresas, diminuindo as desigualdades entre sexos; e permitindo a conciliação entre família e trabalho.

Francisco Augusto Garcia é especialista em políticas públicas para primeira infância.