O ano sequer completou sua primeira semana e as novidades já parecem batidas. Num mundo em constante polvorosa, onde o pó (polvo, em espanhol) jamais assenta, a repetição e a rotina acabam sendo bênçãos. A humanidade não aguentaria viver sem hábitos, rotinas e referências capazes de domesticar o inesperado. Exceto quando as lições não aprendidas resultam em mortes. Neste caso é incúria, crime de responsabilidade. Isso revolta.
As novas enchentes e deslizamentos nas encostas no Rio de Janeiro nada têm a ver com as anunciadas mudanças climáticas; acontecem infalivelmente no início do verão e, se a nossa imprensa não fosse tão nova (pouco mais de 200 anos), o registro das catástrofes estivais seria mais extenso e encorpado.
Há exatos dois anos uma tromba dágua na região serrana fluminense causou um número recorde de mortos (900): água e lama inundaram Nova Friburgo, escorregaram em cima de Teresópolis e, em seguida, alcançaram os fundos de Petrópolis. Nesta semana, a enchente em Xerém, no sopé da mesmíssima serra, revela uma trágica linha reta que só não é perceptível nos mapas e consciências das autoridades.
Presidente, governadores e ministros logo interrompem seus recessos, sobrevoam a região flagelada em seus formidáveis helicópteros, impressionam-se com estragos, solidarizam-se com as vítimas, destinam generosas verbas... e as generosas verbas não saem dos cofres. Brasília é um belíssimo monumento arquitetônico, mas seu processo decisório lembra uma estrada esburacada onde impulsos e boas ideias anulam-se 100 metros adiante do local onde foram assinados.
No Palácio do Planalto dizem que tudo funciona, é possível, mesmo sabendo que em 2012 foram gastos apenas 32% da verba destinada à prevenção de desastres naturais. Porém, na mesma Praça dos Três Poderes, os legisladores (quando não estão ausentes) ocupam-se unicamente com a manutenção de seus privilégios. Entre eles e a Esplanada dos Ministérios (situada a mil metros), a única ligação efetiva, vital, são as emendas orçamentárias propostas pelos parlamentares irreais, aleatórias, fragmentadas, totalmente desligadas de qualquer projeto regional mais urgente ou consistente.
A posse de José Genoino como deputado federal não pode ser vista como afronta: o ex-presidente do PT foi eleito como suplente com 92 mil votos e a ação em que foi condenado ainda não transitou em julgado. Sinal e sintoma do descalabro institucional é o desafio anunciado pelos bravos deputados do PSol: apoiarão qualquer candidato à presidência da Câmara Federal que se comprometa a acabar com o 14.º e 15.º salários dos representantes do povo.
Tudo indica que votarão em branco uma novidade espetacular em meio aos degradantes rituais de resignação e complacência que marcam o nosso calendário moral/existencial.
Alberto Dines é jornalista.
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