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Estamos às vésperas da realização de mais uma prova do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem. Este instrumento serve a várias finalidades: como prova de valor total ou parcial para ingresso às instituições universitárias, uma espécie de vestibular; como parte de uma política pública de universalização do acesso ao ensino superior, sendo indispensável sua realização para o estudante concorrer a bolsas de estudo do Prouni, financiamento do Fies e, mais recentemente, ao programa Ciência Sem Fronteiras.

No aspecto do processo seletivo, o Enem tem sido razoavelmente eficaz (em que pesem certos acidentes de percurso, devidos em parte à sua própria magnitude), os eixos cognitivos das provas realizadas são bem estruturados, já se propuseram questões interessantes que procuravam selecionar o aluno atento à realidade que o cerca, privilegiando o entendimento sobre o mundo e o relacionamento entre os homens, e entre esses e a natureza, em detrimento da valorização excessiva do conhecimento meramente decorado.

Enquanto política de acesso, deveria, em princípio, propiciar que alunos de baixa renda pudessem cursar boas escolas, sejam públicas ou privadas, pois bolsas de estudo ou financiamentos a juros extremamente baixos são oferecidos aos alunos melhor colocados, permitindo que, com os impostos pagos por todos os cidadãos, o país dê chances reais aos jovens dedicados aos estudos. No entanto, recentes pesquisas têm mostrado que a inclusão ainda é relativamente baixa, pois o aluno realmente carente dificilmente terá um desempenho no exame que lhe possibilite a participação nesses programas; talvez o processo de inclusão deva começar de forma ampla e ambiciosa com a melhoria de qualidade do ensino fundamental e médio.

A falta de uma política de permanência também interfere nesse objetivo, pois cursar uma universidade implica em gastos com materiais didáticos, transporte, alimentação e, em grande parte dos casos, impossibilidade de trabalhar em período integral.

Mas foi como sistema de avaliação do ensino médio nacional que o Enem foi criado, sucedendo ao "Provão", e essa função é vital para a melhora da educação brasileira. Qualquer organização não submetida a avaliações periódicas torna-se autorreferente e, pior, autocomplacente, ignorando as próprias falhas e acreditando com sinceridade que suas práticas são as melhores, independentemente dos resultados obtidos. É nesse quesito que o Enem tem tropeçado mais, e jamais obteve consenso entre os especialistas da área.

Vários fatores interferem no processo avaliativo, dentre os quais podemos destacar o que é chamado de "efeito escola", o conhecimento realmente agregado ao aluno pela instituição de ensino durante a sua permanência nela. Melhores condições de partida do aluno, como maior acesso a bens culturais na família, tenderão a proporcionar melhores condições de chegada, com menor esforço da escola. Os alunos que não dispõem desses pré-requisitos demandarão maior empenho para suprir esta carência, o que nem sempre ocorre, infelizmente. Evidentemente, quando comparamos o resultado final unicamente levando em conta o critério da nota do aluno na saída, as escolas que atendem aos alunos de melhores condições iniciais, caso da maioria das instituições privadas, serão mais bem avaliadas do que aquelas que recebem alunos em condições não tão boas, como a maioria das instituições públicas, embora estas talvez tenham proporcionado a seus discentes uma melhora relativa muito maior.

Conta muito, também, a adesão do próprio aluno à prova do Enem. Instituições que conseguem criar um clima de envolvimento e compromisso dos alunos com a sua imagem, envolvendo-os no "orgulho" de pertencer a elas, geralmente terão participantes que farão a prova com mais atenção e afinco. E isso faz muita diferença, quando sabemos que uma parte dos alunos apenas "cumpre tabela" nessas provas, abandonando a sala dentro do prazo mínimo de permanência, independentemente da dificuldade encontrada para a resolução das questões.

Além disso, o Enem tem, na opinião dos docentes, apresentado questões cada vez mais próximas àquelas de um vestibular comum, abandonando um pouco a ideia original de privilegiar raciocínio e não a "decoreba", pelo alto número de candidatos em relação ao de vagas oferecidas em cursos extremamente concorridos.

Assim, são muitos os aspectos a serem analisados para uma compreensão real do sistema educacional. Comparar resultados de dois dias de provas – com o consequente cansaço e desgaste gerado – entre escolas de características regionais distintas, diferentes níveis socioeconômicos e defasagens culturais extremas – não tem mostrado ser eficiente para a correção de rumo necessária para tornar a educação brasileira melhor e mais competitiva.

Wanda Camargo, professora, é assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil.

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