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O partido da imprensa
| Foto: Fabio Abreu

Parte da grande imprensa, com raras exceções, enfrenta crescente perda de credibilidade perante o público. Com o advento das redes sociais, muitos passaram a ter acesso a pontos de vista alternativos, que estavam ausentes na mídia mainstream antes. O viés ideológico dos principais veículos de comunicação, claramente à esquerda, saltou aos olhos dos consumidores, que passaram a cobrar maior pluralismo.

No começo de sua história, a imprensa era partidária mesmo, mas a diferença é que não havia qualquer esforço em ocultar tal fato. Foi a noção do jornalismo isento e imparcial, com foco apenas nos fatos de forma objetiva, que despertou a crença de que era possível buscar a verdade sem qualquer filtro. E essa expectativa acabou produzindo muita decepção.

Mark Levin, em seu novo livro, Unfreedom of the Press, conta essa história e aponta várias evidências do escancarado viés da mídia norte-americana a favor do Partido Democrata. Ele mostra como o ativismo social, o pensamento de grupo com inclinação “progressista”, o partidarismo democrata, a opinião e a propaganda se passando por notícia, a autocensura, a produção de fake news e o viés por omissão estão substituindo a velha reportagem mais objetiva.

A vitória de Trump, naturalmente, exacerbou essa tendência. O presidente é odiado por quase toda a classe jornalística, e em vez de sucumbir diante da pressão, resolveu reagir e declarar guerra, acusando a imprensa de ser “inimiga da nação” (mas, em termos práticos, Trump não tomou medidas para asfixiar a liberdade de imprensa, ao contrário de muitos antecessores, inclusive Obama). Com a chegada do magnata à Casa Branca, a mídia, incrédula, tornou-se ainda mais torcedora, manipuladora, partidária e ativista. Muitos jornalistas passaram a encarar sua missão como “salvar a América” da “ameaça fascista”. E nesse nobre intuito, quem liga tanto para os fatos?

A imprensa que surgiu nos turbulentos anos da guerra de independência tinha partido assumido, era em grande parte patriota e defendia abertamente a revolução. Hoje, boa parte da mídia se vende como imparcial, mas é controlada quase de forma hegemônica por ativistas que seguem uma agenda “progressista” e se enxergam como parte de uma elite esclarecida que precisa ensinar seu público a pensar corretamente. A arrogância é visível em muitos casos.

Os jornalistas precisam descer do pedestal, tratar seu público com mais respeito, não como uma criança imbecil que precisa de tutela para interpretar as notícias

Como resultado desse viés e dessa postura, pesquisas mostram que algo como 80% dos que se consideram republicanos desconfiam da mídia, enquanto quase 80% dos que se dizem democratas confiam nela. Por que será? Não é necessariamente um ataque à imprensa em si: os americanos em geral concordam que a mídia exerce um importante papel na democracia; eles apenas acham que ela não vem cumprindo essa missão de forma adequada.

Essa percepção vem aumentando. Se em 1989 algo como 25% apontavam um “forte viés” na cobertura das reportagens, hoje é quase metade dos entrevistados. E, novamente, há grande distorção entre os partidos: dois terços dos republicanos apontam esse forte viés, contra apenas um quarto dos democratas. O espírito de grupo atua dentro das redações para manter afastados os mais conservadores, vistos como alienados ou, pior, como pessoas com intenções malignas.

A guinada à esquerda da mídia acompanhou a mesma guinada do próprio Partido Democrata, cada vez mais radical. Dessa forma, aquilo que ainda ontem era visto como extremista agora passa a ser a visão mainstream, enquanto o centrista de antes se torna o ultraconservador de hoje. Ideologia de gênero, feminismo radical, aborto tardio e banalizado, socialismo, todas essas bandeiras ultrarradicais para a sociedade em geral são tratadas como normais pela grande imprensa.

A tática mais usada no “jornalismo” moderno é selecionar os fatos que se encaixam dentro dessa narrativa ideológica, e descartar aqueles que vão contra ela. Quando nem isso é possível, parte-se para a criação dos “fatos”, as tais fake news que Trump tanto denuncia, com boa dose de razão.

A imensa maioria dos jornalistas se declara “liberal”, e a cobertura da imprensa é absurdamente desproporcional em termos de notícias positivas ou negativas sobre o governo. Nos principais canais, como CNN e CBS, algo como 90% da cobertura é desfavorável ao governo Trump, algo impensável durante a gestão de Obama. Ironicamente, a Fox News é o canal tratado como o mais partidário ou ideológico, por ser “conservador”, mas sua cobertura é bem mais balanceada: metade favorável e metade desfavorável ao presidente.

É importante destacar aqui a diferença entre repórter e comentarista de opinião. O repórter deveria expor os fatos, e deixar o público julgar. Claro que é impossível deixar todo viés de fora, mas a meta deve ser a busca da imparcialidade. O que se vê hoje é a arrogância elitista de quem acredita ser seu papel filtrar tais fatos para mastigá-los e entregá-los digeridos ao público consumidor de informação. Os “repórteres” de hoje querem dar sentido e propósito aos fatos, o que significa, na prática, submetê-los ao filtro ideológico “progressista”.

O papel de uma imprensa plural e independente é crucial para a democracia. Por isso mesmo é tão preocupante a perda de credibilidade por conta desse viés ideológico. A alternativa é a Torre de Babel das redes sociais ou os sites obscuros que bajulam governantes. Mas os jornalistas precisam descer do pedestal, tratar seu público com mais respeito, não como uma criança imbecil que precisa de tutela para interpretar as notícias. E precisam, também, abandonar essa visão arrogante e narcísica de que são engenheiros sociais remodelando o mundo à sua imagem supostamente mais esclarecida.

O partido da imprensa é tão evidente hoje que se pode falar até em imprensa do partido. E, se a imprensa “pertence” a um partido, então que ao menos isso seja declarado abertamente, sem máscaras de objetividade onde há apenas torcida e propaganda. O público, afinal, percebe o truque, o que derruba ainda mais a credibilidade da mídia, enfraquecendo os pilares da democracia.

Rodrigo Constantino, economista e jornalista, é presidente do Conselho do Instituto Liberal.

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