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Jogo de cartas em cassino.
| Foto: Bigstock

Há mais de 30 anos que se tenta legalizar os jogos de azar no Brasil, desde a apresentação do Projeto de Lei 442/91, em 21 de março de 1991. Sempre com forte resistência da sociedade, recentemente a discussão desse PL retornou à pauta na Câmara dos Deputados. Na proposta busca-se aprovar a permissão de jogos tais como caça-níqueis, abertura de cassinos, regularização do jogo do bicho e a volta dos bingos.

Evidentemente que hoje há jogos clandestinos no Brasil, que são repelidos de forma modesta. A jogatina no Brasil, apesar de proibida, não é tipificada no Código Penal. Os delitos estão contemplados no artigo 50 da Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei 3.688/41), no capítulo dos costumes, cuja sanção prevista é prisão simples de três meses a um ano, e multa. Infelizmente, a nossa legislação é muito acanhada no combate e na punição desses delitos, transmitindo uma quase certeza da impunidade.

Contudo, existe um lobby muito forte que busca convencer os congressistas sobre as benesses que tal legalização traria ao desenvolvimento pátrio, valendo-se de uma narrativa recheada de informações falsas, entre elas a de que seriam gerados mais de R$ 22 bilhões em arrecadação de impostos, o que não é verdade. O senador Eduardo Girão, por exemplo, citando o Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois (EUA) Ricardo Gazel, revelou no plenário do Senado que o incremento máximo a título de imposto seria no aporte de R$ 1,3 bilhão.

Os defensores do referido PL não mensuram os custos, mas apenas inflaram os lucros, afirmando que haveria incremento ao turismo, principalmente nas cidades-sede dos cassinos, com criação de milhões de postos de trabalho e outras supostas vantagens. Porém, não há dados que comprovem essa tese. Fato é que o crescimento do turismo no Brasil nos últimos anos se deu sem os estabelecimentos desses jogos, porém sempre impulsionado por suas belezas naturais e diversidade, suficientes para atrair turistas internacionais e ainda com grande potencial de exploração.

Deve-nos preocupar, na verdade, que a liberação e incentivo da jogatina deverá provocar mais males sociais do que bem. Como exemplo não muito distante, relembramos que a liberação dos bingos, em meados da década de 90, apesar de ter gerado alguns empregos, a maioria de baixa qualidade e remuneração, em contrapartida gerou um número assustador de viciados em jogos, principalmente na faixa etária de idosos aposentados que perdiam todo o seu dinheiro nestes famigerados bingos.

Se esta lei for implementada, temos por certo que se multiplicarão nos futuros “paraísos brasileiros dos jogos” os pródigos, o tráfico de drogas, a prostituição de luxo e o turismo sexual, que, geralmente, vem acompanhado da pedofilia.

A promessa de que o Estado terá lucro com a tributação e que haverá milhões de empregos gerados não se confirma, visto que a sonegação e evasão de divisas ocorre em setores onde a tributação é regulada, mas os meios de fiscalização e controle são deficitários. Por que achar que o setor de jogos de azar, uma vez regulamentado e permitido por lei, seria diferente?

Ademais, não se pode esquecer que a legalização desses jogos no Brasil terá o condão de atrair o braço do crime organizado internacional para o nosso território, e com isso a possibilidade de mais uma alternativa de lavagem de dinheiro para essas organizações criminosas.

Além de ser uma questão moral, portanto, esta é uma questão social e de controle dos gastos públicos. Toda norma legal precisa passar pelo crivo do princípio da função social do direito estabelecido, cujo fim comum deve estar dentro de um ambiente que viabilize a paz social. Entendemos que a liberação e a regulamentação da jogatina no Brasil não promoverão a paz e a persecução do bem comum.

Existe uma máxima no mundo dos cassinos: “a casa sempre ganha”. Isso leva-nos a refletir um pouco mais profundamente sobre se a aprovação de um projeto de lei que legaliza jogos de azar poderia contribuir ou não para o bem comum, o qual deve ser o objetivo de qualquer lei. Tal princípio é colocado de maneira expressa na Constituição, em seu artigo 3.º, inciso IV, o qual dispõe que entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil está o de promover o bem de todos. O bem comum deve, assim, ser entendido como o resultado de condições sociais que permitem às pessoas ir ao encontro de seus objetivos junto à sociedade, proporcionando virtudes e os bons frutos que lhe seguem para o benefício próprio e social.

Em nada há de acrescentar ao bem comum eventual legalização da prática de jogos de azar, que desestimula o ganho através do trabalho e que, em sentido oposto, geralmente torna as pessoas ainda mais suscetíveis ao desperdício daquilo que granjearam em seu digno labor.

Afonso Celso de Oliveira, Warton Hertz de Oliveira e Thiago Rafael Vieira são membros do Grupo de Estudos Constitucionais e Legislativos do Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR).

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