O clima estava morno na primeira semana da 20.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança do Clima, a COP 20. Essa apatia inicial fez com que alguns participantes antecipassem sua volta aos seus países de origem, mesmo sabendo que a semana principal do evento começaria no dia 8.
Até a delegação oficial brasileira passou boa parte da primeira semana sem fazer as costumeiras coletivas de imprensa ao fim de cada dia. A primeira só foi realizada no dia 5, quando foi reforçada a proposta que o país submeteu à Convenção, conforme já havia sido apresentado em uma reunião anterior. Chamada de "círculos concêntricos", essa proposta consiste em classificar os países-membros da Convenção em três anéis de uma mesma esfera: o central, com 37 países desenvolvidos que teriam metas de redução de emissões e de ajuda financeira aos menos desenvolvidos e em desenvolvimento; a esfera do meio, dos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, que teriam metas de corte de emissões relativas ao Produto Interno Bruto (PIB), população e projeção de emissões futuras; e a esfera externa, dos países menos desenvolvidos, que seriam apenas encorajados a reduzir emissões.
No ano passado, o Brasil havia apresentado uma proposta na COP de Varsóvia, defendendo que os países apresentassem compromissos em função da sua responsabilidade histórica pelo aumento da temperatura, observado desde a Revolução Industrial até hoje; e sugeria que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) definisse uma metodologia para calcular a taxa a ser utilizada por cada país.
Essa posição é muito similar à que foi apresentada na COP 6, em Haia, na Holanda, em 2000. Naquele tempo, o Brasil tinha a posição firme de defender com unhas e dentes o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Esse foi um ponto apresentado inicialmente pelo Brasil, e que acabou sendo incorporado ao Protocolo de Quioto, criado em 1997 durante a COP 3.
Depois de duas décadas, o que está sendo apresentado em Lima é mais do mesmo, insuficiente para provocar as mudanças necessárias. O Brasil segue com o seu mesmo discurso de que os países do Anexo 1 (os desenvolvidos) do Protocolo de Quioto precisam promover grandes mudanças para que os demais comecem a fazer alguma coisa. O caminho não é bem por aí.
O Brasil pode fazer muito mais. Pode reduzir o desmatamento e até zerá-lo em poucos anos. Pode parar de subsidiar o preço dos combustíveis fósseis e de reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos automóveis, e passar a investir mais em combustíveis e em energia limpa. Porém, o que temos visto no país é justamente o contrário, como apontou o Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa (Seeg), lançado em novembro pelo Observatório do Clima. O Seeg mostrou que as emissões nacionais de gases de efeito estufa (GEEs) aumentaram 7,8% de 2012 para 2013. Todos os setores da economia monitorados tiveram aumento de emissões; os mais expressivos foram o desmatamento e o consumo de combustíveis fósseis para transporte e geração de energia. O pior de tudo é que, apesar do aumento das emissões, o crescimento do PIB no período foi pífio, o que significa que o país está poluindo mais do que crescendo, ou seja, está carbonizando seu PIB.
Todo mundo precisa fazer o máximo de esforço possível para que as mudanças ocorram agora. A Convenção do Clima deveria criar uma forma de estimular todo e qualquer esforço positivo para a redução das emissões de gases de efeito estufa. Não dá mais para esperar.
André Ferretti é gerente de Estratégias de Conservação da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, coordenador-geral do Observatório do Clima e participou de diversas COPs.
Dê sua opinião
Você concorda com o autor do artigo? Deixe seu comentário e participe do debate.