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O déficit habitacional no Brasil é um problema que preocupa sobremaneira a maioria de nossos políticos. A visão de favelas, cortiços, sem-teto e moradores de rua sempre os incomodou... No entanto, só depois de muitas décadas foi tomada a primeira grande decisão para mudar essa paisagem sombria que eles assistiam: a capital federal foi transferida, do Rio de Janeiro para Brasília! Lá, o projeto urbanístico e a fiscalização rígida não permitem a instalação de favelas no Plano-Piloto. Os ainda modernos palácios e edifícios públicos compõem uma paisagem ampla e monumental. A topografia local também favorece, pois não há morros e as cidades-satélites estão a uma distância tal que as torna quase invisíveis, mesmo do prédio mais alto. Mas não pensem que os políticos ficaram alheios ou incólumes aos problemas habitacionais de nosso país: eles continuam a senti-los na própria pele! Prova disso é que o Senado resolveu construir um "puxadinho", quer dizer, o Anexo III, e, com isso, acomodar melhor seus 81 membros e 3.500 funcionários – mais de 43 por senador! A justificativa é que as inúmeras secretarias, lideranças e comissões técnicas estão trabalhando no limite, ou precariamente. O Senado, nessas condições, deve, de fato, parecer um cortiço! "Tadinhos"...

A solução envolve um investimento de R$ 130 milhões, que inclui a construção de um edifício de 12 andares e um auditório para 600 pessoas, totalizando 83 mil metros quadrados! Um "puxadinho" de alto nível, concebido em 1984 e, recentemente, atualizado, para incorporar tecnologia de ponta! Assim, as dependências originais ficariam reservadas exclusivamente para gabinetes de senadores e órgãos da Mesa Diretora. Com isso, a maioria de nossos senadores teria mais espaço para acomodar reuniões de alto nível e suas múltiplas ausências do DF. O valor é alto e o contexto sócio-político, totalmente inadequado; mas a direção da "casa", de forma "corajosa", considera que a obra não pode mais ser adiada, e garante que terá acompanhamento atento do TCU, para evitar qualquer sombra de desconfiança.

Bem, uma moradia popular com quarto, sala, cozinha e banheiro – míseros 36 metros de área total, simples e rápida de construir – custa algo em torno de R$ 15 mil. R$ 130 milhões permitiriam, então, a construção de 8.667 dessas casas, com 312.012 metros quadrados e abrigar 34.668 pessoas. Isso seria uma gota d’água no oceano do déficit habitacional do país, mas já seria um começo! Entretanto, qualquer alusão desse tipo será tachada de piegas, populista, tendenciosa e despropositada, pelos defensores do Anexo III... Mas, francamente, para que o Senado precisa de mais espaço físico? Isso apressará o andamento dos projetos? Tornará as Comissões de Inquérito conclusivas e confiáveis, aos olhos do povo? Diminuirá as despesas operacionais? Em suma, implicará modernidade gerencial e credibilidade pública? E por falar em modernidade: alguém aí já ouviu falar em sistemas de informação, escritório virtual, etc? Precisa ampliar espaço físico para implementá-los? Além disso, qual é a real utilidade do Senado? Não falo daquela prevista na Constituição Federal ou no discurso dos políticos, nobre e que remonta à Antiguidade; mas do que ele tem, efetivamente, proporcionado ao país!

Infelizmente, apesar dos méritos individuais de alguns senadores, a imagem do Senado é a de, apenas, mais um meandro burocrático num percurso lento, obscuro e acidentado: um forno onde queimam fogueiras de vaidades; uma raquete no interminável e insensível pingue-pongue com a Câmara dos Deputados e outros poderes. E isso tem muito pouco a ver com democracia! Considerando isso o Anexo III, e grande parte da estrutura física ocupada pelos três poderes, em todos os níveis de governo, poderia ser substituído, com vantagens, por fornos de pizzaria, com ou sem tecnologia de ponta.

Reformas e ampliações são necessárias, de fato; mas existem algumas que geram economia, em vez de despesa. A Reforma Política poderia ser uma delas, a começar por um ato realmente corajoso e inovador: a reformulação das funções da Câmara Federal e a extinção do Senado! Obviamente, a maioria de nossos políticos não aprovará isso, pois o Senado é um sonho acalentado por muitos deles. Que tal, então, um plebiscito sobre o tema?

Adilson Luiz Gonçalves é escritor, engenheiro, professor universitário e mestrando em Educação.

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