Ouça este conteúdo
À medida que se aproxima o fim do ano, é natural que façamos uma retrospectiva do que aconteceu ao longo do período que se encerra, ao mesmo tempo que nos questionamos sobre o que devemos esperar do ano que se iniciará.
A verdade é que, desde o início do flagelo sanitário causado pela Covid-19, todos nós acabamos tendo de lidar com um certo grau de incerteza a respeito do futuro, pois o mundo passou por profundas transformações desde o início de 2020. O medo, sentimento tão próprio dos seres humanos, pautou as ações dos agentes privados e públicos de forma a alterar previsões econômicas, políticas e sociais.
No centro dessas alterações estão questões que afetam a liberdade de todos, tanto em seu aspecto político quanto no econômico. O combate à doença que vitimou tantas pessoas ao redor do mundo fez sentir o seu impacto no agigantamento do Estado e na consequente redução das liberdades civis fundamentais. No ímpeto de combater um mal desconhecido, agentes públicos optaram por medidas de caráter perdulário e autoritário, relaxando as políticas fiscais e monetárias e aumentado o escopo de seu poder de polícia. A austeridade, a educação e a conscientização foram largamente substituídas por medidas de caráter pouco liberal, para dizer o mínimo.
Com tanta extravagância, é natural que os próximos anos cobrem o seu preço da sociedade. No espectro social, o Estado provou ser capaz de interferir em esferas que antes eram reservadas apenas aos indivíduos, como as liberdades de trânsito, culto e comércio, relativizadas sob o manto da constitucionalidade e justificadas (ainda que por uma causa nobre) pela supremacia do interesse público. É justamente quando os fins parecem justificar os meios que a liberdade é mais ameaçada.
Ainda é cedo para mensurarmos o impacto que tudo isso teve em nossas liberdades, principalmente na econômica, mas podemos olhar para pesquisas como o Índice de Liberdade Econômica, elaborado em nível nacional pelo Instituto Fraser do Canadá e, em nível estadual, feito pelo Centro Mackenzie de Liberdade Econômica, para arriscar alguns “palpites educados”.
No âmbito nacional, os indicadores que compõem o referido índice levam em conta: 1. o tamanho do governo; 2. o sistema legal e de proteção aos direitos de propriedade; 3. a estabilidade monetária; 4. a liberdade de comercializar internacionalmente; e 5. a regulação. Analisando o possível cenário futuro, com base em dados de 2019, fica claro que tanto o tamanho do governo aumentou quanto a estabilidade monetária foi comprometida pelas medidas de auxílio e socorro que fazem seus efeitos serem sentidos na inflação. A liberdade de comercializar internacionalmente também foi afetada, com o fechamento de diversas fronteiras e o surgimento de um suposto gargalo logístico. Nesse aspecto, não apenas o Brasil, mas praticamente o mundo inteiro se encontra na mesma delicada situação.
É justamente quando os fins parecem justificar os meios que a liberdade é mais ameaçada.
No cenário estadual brasileiro, os indicadores que compõem o referido índice levam em conta: 1. gastos do governo; 2. tributação; e 3. regulamentação dos mercados de trabalho. Nessa esfera, embora existam estados mais livres que outros, a situação geral que se espera não é animadora, pois os governos estaduais parecem ter gastado muito e não tão bem, ao passo que a tributação também foi ampliada pelo aumento de diversas alíquotas.
Diante desse cenário pouco otimista, a liberdade no país provavelmente não melhorará no período eleitoral de 2022, pois em anos eleitorais tradicionalmente ocorre um aumento nos gastos do governo, que, combinado com o surgimento de promessas de campanha pouco republicanas, acaba por comprometer ainda mais o desenvolvimento de um país verdadeiramente livre.
Allan Augusto Gallo Antonio é formado em Direito, mestre em Economia e Mercados e analista do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica.