À primeira vista é difícil imaginar que gastar tanto dinheiro apenas para trazer os jogos da Copa e da Olimpíada seja um bom investimento
Quem escreve fica muitas vezes pensando o que o leitor escreveria. Fica desejando saber qual a opinião do leitor. Pessoalmente, é esse sentimento que tenho ao saber que o governo do Brasil vai consumir até R$ 142 bilhões para conseguir trazer para cá a Copa do Mundo de 2014. Com a Olimpíada de 2016, o orçamento inicial prevê gastos de R$ 29,5 bilhões, em infraestrutura urbana, construção e reforma de instalações esportivas, além de custeio do comitê organizador, quase oito vezes o que foi investido para tirar o Pan 2007 do papel (R$ 3,8 bilhões). Apenas para a Copa são esperados 10.500 atletas de cerca de 190 nações. Antes, porém, o Brasil recebe, neste ano, os Jogos Mundiais Militares; em 2012, o Rio + 20 (Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável); e, em 2013, a Copa das Confederações.
Os custos acima são os básicos para levar os torcedores do aeroporto até ao estádio e hotéis, além de outras obras que servirão especialmente e quase exclusivamente à Copa e à Olimpíada. Além disso, temos os projetos de construção do trem-bala, entre Rio e São Paulo, a um custo estimado pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) de R$ 34,6 bilhões, e da hidrelétrica de Belo Monte, a um custo inicial de R$ 19,6 bilhões.
Durante a Copa, a maior parte dos torcedores nos estádios será de turistas de fora do país, poucos brasileiros estarão entre os torcedores que terão acesso aos jogos nos estádios. Quase todos nós vamos assistir aos jogos pela televisão, como assistimos à Copa do Mundo da África do Sul. Isso vale também para a Olimpíada.
Isso se não valer para a Copa do Mundo a regra que vale hoje no Campeonato Brasileiro: os jogos não são transmitidos para a cidade-sede do jogo, a não ser que o estádio fique repleto de torcedores.
Com esse montante de dinheiro, seria possível melhorar radicalmente a vida do povo brasileiro, por meio de uma espécie de PAC da Saúde, do Emprego, do Transporte Público, da Educação, da Cultura, da Creche, da Moradia e da Urbanização. Dessa forma, todos os brasileiros poderiam ter escolas em horário integral ou, ainda, creches para todas as crianças, ao custo de R$ 1milhão cada uma e Vilas Olímpicas para todos os jovens, ao custo de R$ 8 milhões cada uma. Além disso, seria possível urbanizar e humanizar inteiramente as cidades do País.
À primeira vista é difícil imaginar que gastar tanto dinheiro apenas para trazer os jogos da Copa e da Olimpíada seja um bom investimento. Em Brasília existem hoje dois grandes estádios: o Estádio Bezerrão do Gama e o velho Mané Garrincha, espaços suficientes para o número de torcedores. Foram apenas 35 mil torcedores em todos os campeonatos juntos nos últimos dois anos no Distrito Federal. Só no Mané Garrincha, o governo do DF gastará cerca de R$ 1,2 bilhão com a reforma, a fim de aumentar sua capacidade para 70 mil torcedores. Depois da Copa, Brasília precisará de quatro anos de jogos na cidade para lotar o estádio por causa do pequeno número de torcedores que se interessam pelo futebol da capital do País.
Mas, ao mesmo tempo, todos nós sabemos do orgulho que teremos com o fato de o Brasil receber jogos da Copa e da Olimpíada. Sabemos que os jogos colocarão o Brasil no noticiário internacional, farão este País ainda mais conhecido e reconhecido mundialmente. E nós sabemos como hoje o Brasil precisa melhorar cada vez mais sua imagem e atrair cada vez mais turistas.
Por tudo isso, hoje eu queria ser leitor, ver e ouvir a opinião de quem está lendo este artigo.
Cristovam Buarque é senador (PDT-DF).
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