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| Foto: Juan Barreto/AFP

Nos últimos meses, milhares e milhares de pessoas têm fugido da Venezuela, seja pela fome, seja por motivos políticos. A entrada de venezuelanos nos países limítrofes tem criado problemas de ordem humanitária nessas nações. Natural, portanto, a pergunta do título.

O Direito Internacional é um instrumento à serviço da política internacional e trabalha com precedentes. Está ancorado em três pressupostos: pluralidade de Estados soberanos, comércio internacional e princípios jurídicos coincidentes.

Aqui estamos diante de um primeiro problema: Estado soberano! A soberania é uma qualidade do Estado e pressupõe dois aspectos: o interno, a chamada autonomia, compreendendo os direitos de organização política, de legislação, de jurisdição e de domínio; e o externo, a chamada independência, que diz respeito aos direitos de legação ou representação política, de celebrar tratados e/ou convenções, de fazer a guerra e celebrar a paz, à igualdade e ao respeito mútuo. Todos os Estados usualmente evitam precedentes que impliquem em uma intervenção estrangeira, mesmo porque qualquer um poderia sofrer tais medidas.

Intervenção humanitária, só com a aprovação do Conselho de Segurança, mas China e Rússia vetariam

Então, o que fazer com a Venezuela?

Na época da Guerra Fria, existia a figura do Estado cliente, que tudo podia, menos renunciar ao credo político. Serviu como justificativa para esmagar, do lado oriental, os levantes da Alemanha Oriental (1954), Hungria (1956), Tchecoslováquia (1968) e Polônia (1980); e, no bloco ocidental, República Dominicana (1965), Panamá (1979) e Granada (1983). Hoje, tal situação é totalmente sem sentido.

Intervenção humanitária? Só com a aprovação do Conselho de Segurança das Nações Unidas, sendo que China e Rússia vetariam! Restam, portanto, sanções externas com reflexos internos na Venezuela, como o boicote aos produtos venezuelanos. Medidas como represálias, retorções e embargos beiram um limite perigoso.

Leia também: O drama dos venezuelanos no Brasil (editorial de 27 de fevereiro de 2018)

Leia também: Venezuelanos, lei migratória e hospitalidade (artigo de Thiago Assunção, publicado em 26 de fevereiro de 2018)

Se externamente não há muito o que fazer, há o elemento interno: uma insurgência! A insurgência é mais do que um simples motim. Os rebeldes teriam de apresentar algumas das seguintes características: dominar efetivamente uma porção do território, impor suas próprias leis no espaço dominado, respeitar as leis internacionais e, finalmente, ter suas forças moldadas sob uma hierarquia militar. Com esses aspectos, os Estados soberanos poderiam reconhecer o “estado de insurgência”, possibilitando acordos com os insurgentes, como a venda de armas e mantimentos. Mas não é o que ocorre na Venezuela, onde o governo parece ter o controle total da situação.

Se externa e internamente não há muito o que fazer, resta atender aos efeitos mais trágicos dessa situação: os refugiados. Em um Estado como o Brasil, onde o acesso à saúde pública é universal, isso representa gastos não previstos em grande escala. Críticos de plantão podem alegar que parte de nossa população passa fome e está desempregada. Destinar nossos parcos recursos a estrangeiros, mesmo que refugiados, seria injusto. É, é injusto. E toda a situação é injusta! Contudo, é o que pode e deve ser feito. Criar meios eficazes para atender os que foram obrigados a fugir de suas casas, evitando-se assim que a tragédia seja ainda maior.

Luís Alexandre Carta Winter é professor de Direito Internacional da PUCPR e doutor pela USP.
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