O banho de água fria com a chegada do ano novo não demorou muito a acontecer. Nessas primeiras semanas de 2022, a variante ômicron da Covid-19 tem provocado um verdadeiro “tsunami” de contágios em todo o mundo, nas palavras da Organização Mundial de Saúde (OMS), atrapalhando a retomada econômica em muitos países, e com o Brasil não tem sido diferente – mas o sinal mais alarmante veio da economia americana.
Pela primeira vez em 31 anos, os EUA registraram 7% de inflação em 2021, algo que não acontecia desde os tempos de Ronald Regan na presidência do país. Os preços aos consumidores subiram 6,2% de novembro de 2020 a outubro do ano passado; a alta de energia foi de 29,3%, e a de alimentos, 6,3%, de acordo com o índice CPI, o índice de preços ao consumidor americano. Afinal, o que provocou essa explosão dos preços nos EUA e qual o impacto na economia brasileira?
A disparada inflacionária americana é reflexo, sobretudo, da alta de combustíveis. De acordo com o Bureau of Labor Statistics, no dia 10 de novembro de 2021 o insumo registrava aumento de 49,5% nos preços no acumulado dos últimos 12 meses, tonando-se o principal algoz da inflação americana. Apenas em outubro, os preços subiram 6,2% em comparação com o mês anterior. E, no ano todo, a gasolina subiu 49,6% e o óleo combustível, 59,1%.
Outra pressão inflacionária veio dos veículos usados, que tiveram alta de 26,4% no ano, fator desencadeado pela falta de chips semicondutores para a fabricação de carros novos, algo que também aconteceu no Brasil. Em seguida, vieram o aumento de preços do gás e eletricidade, de 28,1% e 6,5%, respectivamente, no mesmo período. A valorização de ambos foi de 11,2% no último ano. Ainda na tabela dos itens que mais pesaram no bolso dos americanos neste último ano estão o transporte (4,5%), o vestuário (4,3%), a moradia (3,5%) e o plano de saúde (1,7%). Outro fator que salgou a receita da inflação americana foi a escassez de mão de obra, em um movimento em que a falta destes profissionais pressiona para cima os salários, e este custo é repassado aos clientes.
Entre os componentes externos que pressionaram a inflação nos EUA estão o cenário de crise mundial ainda em tempos de pandemia, com matérias-primas mais caras (como aço, semicondutores e combustíveis), crises energéticas na Europa e China (com pressão sobre o gás natural), o aumento internacional no preço do frete (provocado pela falta de contêineres) e a escassez de insumos para as indústrias.
Não por menos, as perspectivas para o crescimento econômico dos EUA no primeiro trimestre de 2022 são, no mínimo, obscuras. Analistas consultados pelo Wall Street Journal reduziram suas expectativas em mais de 1 ponto percentual, o que apontaria para uma taxa anual de 3%, ante os 4,2% previstos em outubro.
O desafio não será pequeno para as autoridades monetárias do Fed, o responsável pela política monetária americana. Espera-se que o órgão tome medidas no sentido de controlar a alta de preços. Uma delas é a redução de dinheiro em circulação: no último bimestre de 2021, o Fed anunciou uma redução de US$ 15 bilhões nas injeções de dólares na economia, além do aumento na taxa de juros, que está na casa de 0,25% ao ano; espera-se que chegue a 0,75% ao fim de 2022.
Um dos efeitos da movimentação do Fed é o impacto na economia do Brasil, uma vez que essas ações fortalecem o dólar perante o real, jogando ainda mais lenha na inflação do país, e impulsionando a alta da taxa de juros. O reflexo mais evidente é a recuperação econômica brasileira ainda mais difícil, com maiores dificuldades relacionadas à tomada de empréstimos e realização de investimentos. Para muitos analistas, estes fatores já estão acontecendo e por isso a retomada brasileira continua estagnada.
A desvalorização do real foi um dos causadores da inflação no Brasil em 2021: o IPCA (índice geral de preços que mede a inflação ao consumidor) no ano passado foi de 10,06%. Os combustíveis também foram os vilões da inflação brasileira, com a gasolina registrando aumento de preços de 50,78% em 2021, assim como o gás de botijão (crescimento de 38,88%), a refeição (7,46%), o aluguel residencial (6,59%) e passagens aéreas (36,53%). Para conter o aumento de preços – e com o objetivo de que a inflação brasileira volte à casa dos 2,25% a 5,25% ao ano –, o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou, no dia 2 de fevereiro, a taxa básica de juros (Selic) para 10,75%.
O impacto no ambiente de negócios brasileiro também já se faz sentir: a criação de ampliação de novos projetos fica comprometida com o dólar alto, o que também encarece matérias-primas e deixa empréstimos nas alturas, por causa da elevada taxa de juros. Espera-se para 2022 um crescimento do PIB brasileiro abaixo de 1%, assim como o risco de novos tempos de recessão econômica para os brasileiros.
Caíque Ferreira é economista da Costdrivers
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