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Nunca um livro voltou a ter tanta atualidade como o escrito por três latino-americanos e publicado em 1996. Editado em espanhol, sua versão em português foi lançada dois anos depois. "O Manual do Perfeito Idiota Latino-americano" é trabalho de três marxistas arrependidos: o colombiano Plínio Apuleyo Mendoza, o peruano Álvaro Vargas Llosa e o cubano Carlos Alberto Montaner, com prefácios, na edição castelhana, de Mário Vargas Llosa – pai de Álvaro – e de Roberto Campos, na edição em português. Sua crescente atualidade deve-se ao cada vez maior número de políticos, jornalistas, economistas, etc., que assumem os traços do "idiota latino-americano" ali mostrado de corpo inteiro, "com grande verve, boa pesquisa histórica e agudo senso econômico", no dizer de um dos prefaciadores.

Quando no panorama nacional e internacional tantos insistem em culpar a vassoura pela presença do lixo e exorcizar demônios errados, uma visita ao Manual poderia oferecer motivos de reflexão, pelo menos para aqueles não possuídos do que Nelson Rodrigues costumava chamar de "obtusidade córnea ou má fé cínica" – vesguice quase sempre de um rançoso fundo ideológico – ou os que não estejam a serviço de interesses contrariados.

Sendo um livro que focaliza principalmente o lado hispânico dos latino-americanos, é parca a contribuição brasileira na composição do retrato traçado pelos autores. Esta limita-se às do falso frade Frei Betto e de FHC, nosso risonho ex-presidente. Aquele, ativista da Teologia da Libertação, amigo e confessor de Lula e baboso adorador de Fidel Castro, contribuiu com uma infindável lista de asneiras ditas com certa unção piedosa, o "placet" da CNBB e as bênçãos do PT – ontem como hoje, o maior repositório de "idiotas de carteirinha"; asneiras, tais como a afirmação de que "Cuba é o único país onde a palavra dignidade tem sentido".

O nosso sociólogo comparece como co-autor do livro que durante muito tempo foi uma das "bíblias" do "idiota" latino-americano. Publicada em 1969, em colaboração com Enzo Faletto e intitulada "Dependência e Desenvolvimento na América Latina", a obra é uma tentativa frustrada de, em suas 26 (!) reedições, justificar o fracasso das teorias cepalinas para diminuir a distância entre os países do Centro (EUA e Canadá) e os "periféricos" da América Latina, inclusive o Brasil. São tantos os equívocos apontados pelos entendidos que parece plenamente justificado o apelo do autor para que esquecessem o que ele escrevera. Acontece que o sociólogo – embora jamais curado de seu marxismo juvenil – fez com inegável êxito sua transposição do academicismo para a política, subindo a rampa do Palácio do Planalto, montado no Plano Real e com um surpreendente programa reformista de modernização capitalista que o fez alvo da fúria dos "idiotas" defensores do populismo demagógico e estatizante, sob uma chuva de acusações de neo-liberal e globalizante. Acusações que ele não merecia porque, entre outras coisas e como é de seu feitio, não aderiu totalmente aos preceitos da economia de mercado e fez seguidas concessões aos seus velhos amigos de esquerda, gerando indefinições e tropeços na condução da política econômica. Confusão explicável para quem, por razões eleitoreiras, foi eleito por um arranjo em que estavam representados a esquerda da Ação Popular e os "caciques" nordestinos do PFL.

Nos dias de hoje, as crises que se sucedem em vários países da América Latina dão novo alento aos "idiotas" que, reacendendo velhos e desmoralizados "slogans", estão levando vários países a reafirmar seu compromisso com o atraso, elegendo demagogos e populistas, tentando buscar alhures as justificativas para os erros, dificuldades e carências internas. Como nossos "hermanos" argentinos, que se queixam do FMI e parecem esquecer que grande parte de sua dívida externa foi feita para comprar armas destinadas à malograda aventura nas Malvinas.

Nós outros ficamos a discutir se o desenvolvimentismo inflacionário dos anos de JK é alternativa para as dificuldades decorrentes da árdua defesa da moeda que fez o ministro Malan e continua fazendo o seu sucessor Palocci, hesitantes, perplexos e desnorteados entre "um capitalismo sem incentivos e um socialismo sem convicção". Definições essas ainda não assumidas, posto que não nos libertamos dos retrocessos que nos impôs a malfadada Constituição-panacéia do finado e pranteado Dr. Ulysses, quando tivemos, em dez anos, um ministro da Fazenda por ano. E depois, para piorar as coisas, elegemos para a presidência da Nação um demagogo inepto, falastrão e incapaz de distinguir uma coisa da outra.

Raymundo Negrão Torres é acadêmico e pertence ao Centro de Letras e ao Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.

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