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OPINIÃO DO DIA 1

O sigilo fiscal existe?

Resta saber se a dúvida e a incerteza que agora acometem o contribuinte serão sanadas com a indenização, ou se o prejuízo e a exposição não serão muito mais danosos do que a responsabilização dos envolvidos

Dados os acontecimentos recentes envolvendo o vazamento de informações sigilosas de dados atinentes à declaração de imposto de renda pessoa física de familiares ou parentes próximos de candidatos políticos, a dúvida que surge é: a Secretaria da Receita Federal do Brasil consegue manter o sigilo fiscal que o contribuinte espera e imaginava existir?

A Constituição Federal do Brasil é clara ao determinar no artigo 5.º, incisos X e XII a inviolabilidade da imagem e da intimidade das pessoas bem como de seus dados.

A declaração de ajuste anual de imposto de renda pessoa física é um documento sigiloso ao extremo, pois nele constam dados a que na maioria das vezes nem os membros da própria família têm acesso. Afinal, todos os bens e o patrimônio erigido ao longo dos anos constam na declaração e não é para qualquer pessoa que se mostrará esse tipo de informação.

Entretanto, agora, na nova moda de evento em que o Brasil é especialista com sua inventividade, o vazamento dessas informações se torna cada vez mais frequente.

O sistema da Receita Federal do Brasil foi desenvolvido para não permitir falhas ou acesso fácil de informações sigilosas; todavia, não existe qualquer impedimento ou restrição de acesso para funcionários que trabalhem ou estejam diretamente ligados às declarações de imposto de renda.

Eis o cerne da questão, uma vez que ao acessar esses dados um funcionário pode indevidamente fornecer seu conteúdo para seu "contratante", que tem um elevado interesse em saber de informações a que os cidadãos comuns não têm acesso.

No âmbito penal, uma série de responsabilizações é possível: a primeira delas por violação de sigilo funcional, em conformidade com o artigo 325 do Código Penal, mas nada impede que existam outros crimes cominados, como corrupção passiva, artigo 317 do CP ou, até mesmo, o crime de peculato, artigo 312 do CP.

Tudo dependerá da gravidade da informação que foi exposta indevidamente e do quantum que a pessoa infratora colaborou no exercício de sua função e, para os mais céticos, que afirmam que no Brasil nada se resolve e que tudo sempre termina numa grande pizza, eis a novidade: as coisas mudaram com a chegada da informática; afinal, é possível saber quem acessou indevidamente o sistema, por quantas vezes e quais foram as informações acessadas.

De posse disso, cabe ao superior abrir um processo administrativo contra o funcionário, que responderá pelos crimes concernentes. Contudo, e a pessoa que teve seus dados violados o que pode fazer? Por certo, processar a Secretaria da Receita Federal por dano moral e material, de acordo com o artigo 927 do Código Civil: a responsabilidade civil objetiva.

Resta saber se a dúvida e a incerteza que agora acometem o contribuinte serão sanadas com a indenização, ou se o prejuízo e a exposição não serão muito mais danosos do que a responsabilização dos envolvidos. A única conclusão certa é que o sigilo fiscal existe, mas...

Antonio Gonçalves, mestre em Filosofia do Direito, é especialista em Direito Tributário, Direito Penal Empresarial e Direito Penal – Teoria dos Delitos pela Universidade de Salamanca – Espanha.

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