A “revolução americana”, como se chama a independência das antigas colônias inglesas no território norte-americano, no século 18, recebeu de modo justo essa denominação tanto pelas motivações para a independência, como pela construção genial de um modelo de “república federativa”.
No cerne do debate estava um dilema: como garantir a participação política da maioria dos cidadãos evitando a “tirania da maioria”?
A tirania da maioria é um processo de dominação política e social decorrente da imposição, por parte da maioria da população, de seus valores e interesses. Uma sociedade justa e democrática tem por dever garantir a preservação das minorias.
A solução nos EUA foi, basicamente, criar um sistema institucional de poderes separados e concorrenciais, que seriam o Executivo, o Legislativo e um novo poder moderador, a Suprema Corte. Ao mesmo tempo, a nova nação teria uma Constituição garantidora de direitos a todos os cidadãos e que seria guardada pela Suprema Corte. Um sistema de pesos e contrapesos que dividiria o poder e garantiria aos cidadãos uma maior liberdade.
Hoje, no Brasil, temos uma república federativa e contamos não com três, mas quatro poderes (Executivo, Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal e o Ministério Público Federal). Mas, infelizmente, não está havendo o devido equilíbrio entre os quatro poderes, porque o STF tem invadido as atribuições dos outros poderes, em especial o do Ministério Público Federal, por conta de um processo investigativo criado pelo presidente do STF e que foi arbitrariamente designado a um relator, um outro ministro do STF. Sim, o poder julgador está investigando.
Um outro fator que causa profunda preocupação é que decisões monocráticas estão se tornando comuns no STF, que deveria ser uma casa colegiada. Afinal, são apenas 11 ministros com poder de decisão sobre os direitos de todos os cidadãos brasileiros. Mas quando as decisões de apenas um deles prevalece significa que estamos diante de um processo que levará à tirania da minoria, o que é inaceitável a uma república democrática e federativa.
Que os demais poderes reclamem suas atribuições contra o STF. Que o Senado Federal assuma o papel constitucional de ser um poder controlador dos excessos cometidos por indivíduos no cargo de ministros do STF, seja efetivando uma rigorosa sabatina contra os pretendentes, seja investigando excessos cometidos sem temer uma “crise institucional”. E, finalmente, que os indivíduos investidos no STF não confundam seus interesses pessoais com os da instituição. Promover essa distinção é uma virtude republicana. Confundir seus interesses pessoais com os da instituição é um vício patrimonialista.
Adriano Cerqueira, cientista político e professor do IBMEC-BH.