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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

Viver em sociedade exige segurança. Não só segurança do ponto de vista físico, mas segurança jurídica. Tradicionalmente, o Direito é promotor da segurança. Ele nos diz o que podemos esperar dos outros – e os outros de nós. A lei é a fronteira que marca esse espaço. Só que a legalidade por si só nada garante. A legalidade precisa de instituições (administração, Judiciário, Ministério Público etc.). Elas são garantidoras da estabilidade prometida pelo Direito. Isso é especialmente relevante quando se considera o papel das cortes superiores. A elas cabe dar estabilidade ao sistema, colocando um ponto final nas discussões. O problema é que, de uns tempos para cá, há uma dupla crise a afetar a segurança que se espera.

Em primeiro lugar, as normas jurídicas trazem em si a insegurança derivada da ausência de consensos claros na sociedade. Há normas primorosamente ambíguas, pois nelas não há consenso algum. E normas pouco claras geram resultados incertos.

Não bastasse isso, temos assistido a uma progressiva instabilidade das nossas instituições. Cada vez menos elas contribuem para a estabilidade. Evidente que o Direito deve ser calibrado para se amoldar à realidade e, como um corpo vivo, ele se adapta ao ambiente. Não é disso que se trata. O problema é a modificação de entendimentos sem qualquer justificativa objetiva.

Não é saudável que uma corte decida algo e depois se desautorize decidindo em sentido diametralmente oposto

Na raiz desse fenômeno parece estar a apropriação pessoal das instituições. Muitas vezes aqueles que ocupam posições estratégicas não se curvam aos entendimentos já consolidados e isso estimula a reabertura de temas já decididos. É o que se dá quando membros de um tribunal ignoram a própria jurisprudência por razões de convicção pessoal. Não reconhecem, assim, que deliberações colegiadas impõem que o entendimento da maioria prevaleça. E que, uma vez obtido o consenso, ele deve ser prestigiado, malgrado as opiniões pessoais divergentes. Não é saudável que uma corte decida algo e depois se desautorize decidindo em sentido diametralmente oposto.

Essas considerações vêm a propósito quando se noticia que o STF pode rever o controvertidíssimo tema da prisão antes do trânsito em julgado da condenação (seja em processo individual ou pela via de procedimentos cuja decisão se dá com efeitos gerais). O promissor ramo da futurologia jurídica já faz seus prognósticos sobre como cada um dos ministros votará. O noticiário político vibra. Há apostas de toda ordem. E isso não é bom. A simples cogitação de se revistar tema tão grave em tão curto espaço de tempo parece ser a confirmação de que o STF não é um colegiado, mas sim a soma de 11 pessoas.

Decisão errada tem de ser revista:Entre o direito e o poder-dever de não errar por último (artigo de Márcio Berclaz, professor da Universidade Positivo)

A mudança de opinião pessoal ou a alteração subjetiva dos membros da corte não podem conduzir à reabertura de questões já decididas (ao menos não em tão curto espaço de tempo, sem ter havido qualquer fato novo à revisão do entendimento). Prevalecendo esse hábito, teremos perdido o que o STF tem de mais importante, que é a capacidade de pôr um ponto final em temas de interpretação constitucional.

Por mais que se possa discordar de determinado entendimento de nossas cortes, fato é que uma hora as discussões precisam ter fim. Se nos permitirmos perenizar as discussões, teremos um Direito cada vez mais inseguro. E quem perde com isso somos todos nós. Instituições que reverberam inseguranças deixam de cumprir sua missão. Quando isso é promovido pelo STF, o quadro é sobremaneira mais grave.

Bernardo Strobel Guimarães, advogado, mestre e doutor em Direito do Estado, é professor da PUCPR.
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