Os executivos e os empresários fariam bem se lessem os filósofos. Talvez diminuíssem um pouco o deslumbramento consigo mesmo
Aprendemos com os filósofos e os cientistas que conhecimento científico é conhecimento provado. Alan Chalmers nos ensina que opiniões subjetivas e preferências pessoais não têm lugar na ciência e que "as teorias científicas exigem um grande número de observações feitas sob uma ampla variedade de circunstâncias". Há dois principais métodos de raciocínio: o dedutivo e o indutivo. Eu e você pensamos e argumentamos baseados nesses métodos, mesmo que não tenhamos muita consciência deles.
O método dedutivo é do ramo da lógica e significa deduzir, de premissas verdadeiras, uma conclusão verdadeira. Um exemplo: 1) todos os artigos de economistas são chatos. 2) Este artigo é de um economista. 3) Logo, este artigo é chato. Se as premissas (1) e (2) são verdadeiras, a conclusão (3) tem de ser verdadeira; não há como ela ser falsa.
Alguns empresários e alguns executivos de sucesso constroem um raciocínio supostamente lógico em suas cabeças, mais ou menos assim: 1) as empresas e os executivos que fazem sucesso são competentes. 2) Nós e nossa empresa fazemos sucesso há décadas. 3) Logo, nós somos competentes. 4) Por isso, continuaremos sendo um sucesso. Aí, você pega uma lista de grandes grupos empresariais que fizeram sucesso estrondoso por décadas e depois quebraram, e então imagina que deve haver algo de errado na dedução acima. E há!
Se as premissas (1) e (2) são verdadeiras, a conclusão (3) é verdadeira. Porém uma conclusão adicional (4) bagunçou o método, e ela é falsa. Trata-se de uma "indução" (indevida). O método indutivo é de natureza diferente. Para este, a verdade não deriva da lógica, mas da experiência.
Um erro dos homens de sucesso é que inventam uma verdade supostamente lógica e passam a acreditar nela, quando a experiência (método indutivo) mostra que a coisa não é bem assim. Um exemplo da confusão é o "peru de Bertrand Russell". O filósofo mostrou que misturar as duas coisas (a dedução e a indução) pode resultar em conclusões falsas.
Um peru foi colocado em uma granja e passou a ser alimentado diariamente às 9 horas e às 17 horas. Ele observou que era alimentado sempre nesses horários, todos os dias, todos os meses, nos dias frios, nos dias quentes, com sol, com chuva. Como bom indutivista, tendo feito um "grande número de observações", sob "ampla variedade de circunstâncias", ele concluiu: "Serei sempre alimentado às 9 horas e às 17 horas". Sua conclusão demonstrou ser falsa quando, no dia de Natal, em vez de ser alimentado, ele foi degolado.
O sucesso é um perigo porque tende a transformar empresários e executivos no peru de Bertrand Russell. O fato de você e sua empresa fazerem sucesso durante muito tempo não significa que continuarão fazendo sucesso no futuro. É longa a lista de empresários e executivos que, ao fazerem sucesso, tornam-se arrogantes e começam a se achar infalíveis. Anthony Robbins dizia que "o maior inimigo de hoje é o sucesso de ontem".
Os executivos e os empresários fariam bem se lessem os filósofos. Talvez diminuíssem um pouco o deslumbramento consigo mesmo. Nos dicionários, "deslumbramento" significa "embaçar, por excesso de luz ou brilho, os olhos ou a visão; ofuscar, turvar". O fato de ter sido um sucesso no passado não é garantia de sucesso no futuro, pois não se trata apenas de competência; trata-se de um problema de mercado.
O mundo muda, a tecnologia muda, os hábitos de consumo mudam e as condições de competição podem fazer desaparecer, em pouco tempo, uma empresa que brilhou por muitas décadas. A General Motors era um símbolo do capitalismo industrial americano e exemplo de sucesso. As mudanças tecnológicas, os novos hábitos de consumo e a concorrência dos asiáticos transformaram a GM numa empresa à beira da falência.
Essa realidade se aplica também ao sucesso pessoal e profissional. Contam-se aos milhões, os artistas, os atletas, os políticos e os executivos que, quando morrem, não são nem sombra do sucesso que foram no passado. Portanto, nada mais ridículo do que um executivo ou um garoto posando de arrogante e infalível apenas porque atingiu um alto cargo em uma organização ou porque faz sucesso com o público. Mal sabem eles que um mero ataque de raiva do patrão (no caso do executivo) ou o simples cansaço do público (no caso do artista) são suficientes para colocá-los de volta à sua insignificância.
Um pouco de humildade é um bom começo para quem não quer, como o peru, ser degolado pelo mercado ou pela vida.
José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.