Ouça este conteúdo
Faltando praticamente um ano para as eleições do ano que vem, arrisca-se um palpite de que desta vez a campanha terá um ingrediente novo, diferente de tudo o que já se viu anteriormente. Além dos temas consagrados como educação, saúde e segurança, os candidatos ao Congresso e ao Planalto vão incrementar promessas ao repertório tradicional.
Embora não se saiba ainda a lista completa de candidatos que irão disputar a Presidência 2022, três nomes bastante cotados despontam nos noticiários: Bolsonaro, Lula e Sergio Moro. Cada um deles, ao seu modo, foi impactado por decisões recentes do STF. Na verdade, quem serão os candidatos não importa – seja lá quem forem, estarão afinados com a nova onda nacional: discutir as atribuições do Supremo Tribunal Federal.
Ao engatilhar a pauta aqui especulada, o STF adicionou um tempero extra na campanha que vai atiçar o apetite dos candidatos à Câmara, ao Senado e ao Planalto. Neste contexto, não será difícil prever que, na disputa acirrada pelo voto, se ouvirá de tudo um pouco, desde propostas mirabolantes antecipando nomes para compor a suprema corte até ideias de reformas substantivas. Políticos são guiados por marés com maior chance de triunfo.
Quem serão os candidatos não importa – seja lá quem forem, estarão afinados com a nova onda nacional: discutir as atribuições do Supremo Tribunal Federal.
A anulação de processos envolvendo o ex-presidente Lula e a declaração da suspeição do juiz Sergio Moro pelo STF darão o norte aos candidatos na ofensiva para atrair os eleitores, mas, no calor da competição, outras questões já esquecidas serão lembradas, até mesmo episódios miúdos como a tentativa do STF de furar a fila da vacina. Dito isto, cabe ressaltar que a premissa aqui defendida perderá fôlego caso Lula ou Moro, por alguma razão, fiquem fora da disputa.
Caciques tarimbados como Bolsonaro e Lula já sentiram na pele que vencer eleição não é suficiente para governar; então, se esforçarão em construir alianças robustas, alocando pessoas confiáveis para o parlamento nas convenções partidárias. Em relação ao STF, irão dissimular ressentimentos, acenando trégua. Se perguntássemos a Bolsonaro, por exemplo, como foi a experiência de governar com a espada do STF no pescoço, ele responderia algo como “Veja bem, no tocante às desavenças que tivemos aqui e ali com o Supremo foram todas superadas, vamos agora seguir em harmonia aí com os poderes da República. O mais importante é que no próximo mandato, terei a oportunidade de indicar novos ministros lá, e reforçarei o compromisso em escolher pessoas comprometidas com a verdade, com a vida e com as liberdades de expressão. Agora com mais experiência no traquejo de governar, e livre dos confinamentos dos trabalhadores levado a cabo por alguns governadores e prefeitos respaldados pelo Supremo, as coisas vão melhorar mais ainda no Brasil daqui em diante”.
Da mesma forma, se perguntássemos a Lula se ele considera justo que o STF tenha esperado que ele cumprisse toda uma fração da pena em regime fechado para só então invalidar o julgamento que o condenou, o petista diria algo assim: “A gente não queria isso, mas de fato essas coisas desagradáveis acabaram acontecendo. Você tem a convicção de que vai ficar só uns três dias na cadeia, mas na hora de se entregar fala demais perante os companheiros, e na empolgação critica as entidades do país, colocando o Supremo no rolo, esquecendo que a tevê tá lá filmando tudo. Daí, quando a gente se dá conta, lá se foram 500 dias enjaulado. Mas é importante frisar também: a justiça tardou mas prevaleceu. Não convém ficar olhando o retrovisor, agora é bola pra frente, e no próximo mandato a prioridade é nomear os melhores nomes para o STF”.
As propostas mais impactantes relacionadas ao STF caberão aos aventureiros mal cotados nas pesquisas, que, nada tendo a perder, arriscarão se expor na crista da onda com promessas inviáveis. Aos mais afoitos, só melhorar o futuro não basta; será preciso remexer decisões passadas. Para conquistar o coração do povo urge mostrar coragem, nem que seja só bravata.
Neste cenário especulativo, o terceiro nome corre por fora, dedicado e confiante, pavimentando a própria via em direção ao Planalto. Estrategista de fala mansa, saberá sorrir na hora certa. Dos três pré-candidatos citados, é o que, em tese, amarga o maior revés junto ao STF. Assim, não lhe restará outra opção, e o presságio é que chegará mordendo muito e assoprando o necessário.
Florentino Fagundes é escritor e professor de Matemática na PUCPR.