Com expressiva antecedência de quase três semanas antes do fim do período legal para a propaganda, o candidato-presidente Lula, das alturas de favorito destacado em todas as pesquisas, acaba de bater mais um recorde para enriquecer sua coleção do melhor do mundo em todos os tempos: nunca na crônica das campanhas, desde a descoberta do Brasil, um candidato faltou a tantos compromissos para entrevistas e debates organizados pelas redes de televisão e por alguns jornais.
Aceitou todos os convites, formulados com os rapapés da insistência, não compareceu a nenhum. Em alguns casos, como no último com O Globo, nem era um debate com os adversários do primeiro turno. Mas uma série de entrevistas individuais com os candidatos, sabatinados pelos cronistas e repórteres do jornal. Lula confirmou presença, tergiversou, mudou de conversa e só na última hora, comunicou a ausência.
Não é o primeiro de uma longa fila de fujões de debates e entrevistas. Trata-se de um drible tático, equilibrado em contradições de uma falta de compostura e de ética de fazer corar uma garota de programa. Caso típico da esperteza alvar, que não engana a ninguém, sustentado pela lógica de trapaceiro com baralho de cartas marcadas: o favorito não tem nada a ganhar e arrisca todas as fichas ao entrar em desvantagem no debate, com todos contra ele. Faz sentido nas pendengas de ladinos.
No caso de Lula, além do evidente receio das cobranças das suas contradições notórias, sabidas e numerosas, um trauma veterano, que remói as lembranças da campanha de 1989, envenena sua alma com o pânico de um novo fracasso, como o que decidiu a derrota para seu mais recente aliado, o ex-presidente Fernando Collor de Mello.
Não foi um debate qualquer, apenas mais um. Mas, o mais importante e sensacional da curta história dos confrontos ao vivo. Coube à TV Bandeirantes o pioneirismo no gênero, que fenece com a fuga dos favoritos.
Foram dois os programas no segundo turno. No primeiro, Lula surpreendeu Collor com excelente desempenho e disparou nas pesquisas. No segundo, às vésperas da eleição, a expectativa de que seria decisivo garantiu a audiência fantástica da virtual totalidade dos aparelhos ligados.
Dele participei como um dos entrevistadores, indicado pela TV Manchete. No primeiro, Carlos Chagas foi o escolhido com marcante participação.
Com organização impecável, só tiveram acesso ao estúdio, além dos dois candidatos e um assessor de cada um, os técnicos e jornalistas participantes. Dividido em quatro blocos, comandado pelos representantes das principais redes de televisão: Boris Casoy, do SBT; Alexandre Garcia, da Globo; Eliakim Araújo, da Manchete; e Marília Gabriela, da Bandeirantes.
Collor foi o primeiro a chegar, com minutos de antecedência. Caminhou em passos firmes para a tribuna, sobraçando uma coleção de pastas coloridas, e dela não arredou.
Minutos depois, Lula entrou no estúdio e, por acaso, deu comigo. Cumprimentos amáveis e afobados, emendando no pedido de informação sobre o caminho do banheiro. Estranhei o rosto com marcas de noite insone, os laivos espalhados pela fisionomia e a urgência da bexiga.
A sua atuação foi calamitosa. Errou nomes, números; engasgou nas respostas, enrolou-se nas armadilhas de Collor, não soube informar qual era o subsídio de deputado e nem onde tinha comprado um modesto aparelho de som do malicioso alçapão armado pelo adversário.
De volta ao hotel, na companhia de Eliakim Araújo, companheiro da Manchete e lulista roxo, adverti com plena convicção: "Seu candidato perdeu a eleição".
Anos depois, o Ricardo Kotscho decifrou a charada: Lula passara a noite até a madrugada e o dia inteiro em reuniões com petistas e religiosos e estava com os nervos em pandarecos. Em frente à Bandeirantes, ameaçou não comparecer ao debate. E foi um custo demovê-lo do vexame da cadeira vazia, a denunciar a fuga a milhões de espectadores.
Lula aprendeu a lição errada e pegou o vício.
Talvez, esta seja a última campanha com debates de candidatos no primeiro turno. As tevês, rádios, revistas, jornais também recolheram os ensinamentos da frustrante experiência.
Governadores e oposição articulam derrubada do decreto de Lula sobre uso da força policial
Tensão aumenta com pressão da esquerda, mas Exército diz que não vai acabar com kids pretos
O começo da luta contra a resolução do Conanda
Governo não vai recorrer contra decisão de Dino que barrou R$ 4,2 bilhões em emendas