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Pode ser perigoso e difícil desafiar o Zeitgeist – espírito do tempo – promovendo ideias e ações verdadeiramente justas e atemporais, como o tratamento equânime a todos os indivíduos e o julgamento dos desvios praticados pelos autores, não pelos demais.
Não por acaso, muitos dos homens que consideramos grandes na história foram aqueles que confrontaram esse espírito, realizando feitos notáveis que trouxeram progresso inequívoco, como: descobrir a América; libertar os escravos, quando achavam ser fundamento da economia; contrapor ao nazifascismo em um momento que parecia impossível deter o avanço do coletivismo nacionalista na Europa.
Entretanto, de tempos em tempos, nos desviamos dos valores universais e atemporais da liberdade e justiça baseada nas ações dos indivíduos, em prol de uma catarse coletiva mal-ajambrada em nome daqueles vistos por alguns – correta ou incorretamente – como as vítimas de processo de abuso.
Parece ser o caso do momento atual...
O inaceitável tratamento policial a George Floyd, que sucumbiu após sua detenção por suspeição de crime, desencadeou sequencia de eventos avessos à justiça e desproporcionais ao fato. Ao invés de se voltar aos culpados diretos e indiretos – os policiais e os sucessivos governos democratas que vêm governando o estado e a cidade do incidente – e, de certo, os métodos de abordagem policial ora estabelecidos, inflamou-se uma marcha de insanidade que escapa às raias do admissível.
Sob pretexto de se opor ao fascismo, ao racismo e à opressão, aquela que é provavelmente a mais individualista, livre e próspera sociedade da aventura humana, testemunhou uma ira contra suas figuras históricas. Autoras de feitos responsáveis, em maior ou menor grau, justamente por esta valiosa tríade atemporal de resultados que a aproxima da grandeza: a liberdade, a prosperidade e o tratamento do indivíduo como responsável por seus atos, algo que claramente se contrapõe ao fascismo, ao socialismo, alcançando, assim, um alto ideal de justiça.
A raiva descontrolada chegou a impropérios como a incitação à derrubada, em Boston, da imagem de um dos maiores responsáveis pelo fim da escravidão no país – Abraham Lincoln – pois a alegoria do monumento concedia ao escravo o direito de se levantar da posição de subjugado àquela de homem livre. Não foi visto o movimento, mas sim o fato de o mesmo ainda estar de joelhos. O mesmo clamor se voltou à retirada da estátua do navegador que aportou na América, alterando para sempre a história humana. Descoberta que disparou o intricado processo de interações sociais que trouxe o nascimento não somente da referida sociedade mais livre e próspera, como também da grande maioria dos indivíduos que hoje se rebelam.
Não bastando a injúria causada à história e aos valores atemporais, a fúria atravessou o Atlântico, chegou ao desatino de propor a derrubada do mais antifascista dos homens: o mesmo Winston Churchill, líder da nação inglesa, que então foi a única resistência real ao então descontrolado avanço do pesadelo nazifascista no Velho Continente.
Grandes homens que desafiaram o espírito do seu tempo e promoveram conquistas estão sendo mal avaliados pelo atual Zeitgeist, que foge por completo da sensatez e da razão. São alvos daqueles que desejam apagar a história e as grandes conquistas, talvez para galgar degraus no antigo desejo frankfurtiano de destruir tudo o que carrega valor legítimo para ver o que entra em seu lugar, quiçá torcendo para que não o caos.
É atroz o espírito do tempo que vira as costas contra aqueles que até aqui nos trouxeram, flanando pela ingratidão e pela ignorância de desconhecer os caminhos que levaram a um estado melhor. Zeitgeist este que precisamos debelar.
Christian Vonbun é economista e professor do Instituto Mises Brasil.