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O Projeto de Lei 280/2016, que discute novas definições sobre crimes de abuso de autoridade, vem sendo objeto de um acalorado debate durante os últimos meses. O debate é importante e deve ser observado de forma parcimoniosa, uma vez que o seu conteúdo é importante para preservação de muitas das garantias trazidas por nossa Constituição Federal. O projeto em muito amplia o alcance da Lei 4.898/65, a atual lei de abuso de autoridade, que caminha em descompasso com a Constituição de 1988.

O atual protagonismo do Poder Judiciário acaba por trazer maior destaque ao tema. A discussão favorece o sistema de Justiça criminal, uma vez que o eficaz combate à prática de atos abusivos acabará por contribuir para a construção de um processo penal mais democrático e orientado pelo respeito às garantias constitucionais tanto das autoridades quanto dos cidadãos. A essência de um projeto de lei dessa natureza deve ser a defesa do cidadão contra abusos promovidos em nome do Estado. Para aqueles que exercem suas funções públicas com serenidade e o cuidado necessário, a aprovação do projeto de lei, mesmo com a redação que hoje se observa, pouco influenciará em suas práticas cotidianas.

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A discussão sobre o abuso de autoridade é um reclame social antigo

A ação penal prevista no projeto é pública condicionada à representação do ofendido. Somente em casos excepcionalíssimos é que a ação penal é pública incondicionada, o que, entendendo-se a dinâmica dos abusos do poder estatal, mereceria um melhor exame.

O abuso de autoridade no projeto é entendido como um ato doloso que venha a ofender um direito assegurado ao cidadão. O projeto contempla 30 tipos penais que preveem condutas cuja ilegalidade, em sua maioria, o cidadão médio não teria qualquer dificuldade em reconhecer. Grande parte das condutas já encontra similar descrição em outras leis. Ameaças, exposições à execração pública, constrangimentos, uso de meios ilegais para obtenção de provas, utilização e a divulgação de provas ilícitas, impedimentos ao acesso de autos de investigação, obstáculos ao exercício da defesa e utilização indiscriminada de algemas estão entre elas. A criminalização do uso de meios ilegais, artificiosos ou truculentos, é a tônica do projeto.

No projeto em discussão, algumas condutas acabam por ter tratamento penal mais brando com a autoridade estatal do que para com o cidadão comum. Um exemplo é o artigo 27, que prevê a requisição de instauração de procedimento investigatório sem a demonstração da prática de algum crime, conduta que bem se amolda ao tipo penal alusivo a denunciação caluniosa (artigo 339 do Código Penal) que tem a pena prevista no dobro da apresentada no projeto.

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Outra questão relevante a ser debatida é a indevida similitude entre o constrangimento mediante violência ou grave ameaça, relatado no artigo 11 do projeto, e o crime de tortura tipificado no artigo 1.º da Lei 9.455/97.

Apesar de não haver crime de abuso de autoridade culposo, é importante serem debatidos os muitos tipos penais demasiadamente vagos que se encontram presentes no projeto.

Embora vivamos um conturbado momento político, a discussão sobre o abuso de autoridade é um reclame social antigo. Um amplo debate sobre a questão é necessário, pois infelizmente não é raro observarmos a prática de condutas ilegais e absolutamente inaceitáveis por parte de autoridades públicas sem que se tenha resposta administrativa ou judicial satisfatória.

Alexandre Salomão é advogado criminalista.