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| Foto: Nicholas Kamm/AFP

Os Estados Unidos da América optaram por Donald Trump em 8 de novembro do ano passado, afastando Hillary Clinton, candidata democrata, da presidência do país. Desde a época da campanha, passando pelo período pós-vitória e, agora, oficialmente empossado no cargo, Trump deixou o mundo atônito, num exercício de futurologia, tentando desvendar o que do prometido na campanha seria oficializado.

Personagem excêntrico, Trump ganhou enorme destaque na mídia nos últimos anos por suas separações, por seus negócios ousados ou por suas ruínas financeiras. Figurinha carimbada de programas de tevê, filmes, documentários e reality shows, Trump ganhou até uma estrela (recentemente vandalizada) na Calçada da Fama, em Hollywood. Durante a campanha, carregou no discurso politicamente incorreto, lançando ataques nada velados a muçulmanos, imigrantes e mulheres. Aos imigrantes ilegais, ameaçou expulsá-los, para “devolver” os postos de trabalho aos americanos. Esqueceu de dizer que, na construção da Trump Tower, muitos dos operários eram imigrantes ilegais, aos quais Trump pagava um terço do que pagaria a um cidadão americano ou imigrante legalizado. Em relação aos mexicanos, classificou todos como traficantes. Quanto aos muçulmanos, sugeriu a proibição de sua entrada em território americano.

Universalidade, integralidade e igualdade não devem influenciar conceitualmente o novo sistema

Com essas palavras, Trump trouxe para si milhões de votos de americanos, pobres em sua maioria, que ainda não se recuperaram totalmente da última crise. O mais assustador é que essa última eleição dos Estados Unidos pode ser preditiva do que irá ocorrer nas próximas eleições ao redor do mundo, configurando um movimento de “direitização” do poder.

Outro alvo da campanha de Trump foi o Obamacare, a reforma sanitária de Barack Obama. “Obamacare” é como ficou conhecido, popularmente, o Patient Protection and Affordable Care Act (Lei de Proteção e Cuidado ao Paciente), sancionada em 23 de março de 2010 e em vigor plenamente em janeiro de 2014. A lei obriga todos os cidadãos americanos a terem um plano de saúde privado, sob pena de multa. Aparentemente autoritária, a lei foi muito criticada no começo e o (agora ex-)presidente Obama, ridicularizado. A maioria da população tinha uma visão negativa da lei entre 2009 e 2010. Em 2013, 40% dos americanos já eram favoráveis, aumentando para 47% de aprovação em 2015 (contra 44% contrários).

A batalha de Obama não foi fácil, pois os republicanos votaram em peso contra o projeto de lei, mas a maioria garantida pelos democratas permitiu a aprovação. Longe de ser um “SUS” da vida, o Obamacare garantiu que mais americanos tivessem acesso aos serviços de saúde sem precisar pagar integralmente pelos custos. Com o aumento no número de segurados e com a proibição de seguradoras de recusar idosos ou indivíduos com doenças pré-existentes, o Obamacare trouxe vantagens inegáveis aos cidadãos.

E, conforme ameaçado na época da campanha, Trump assinou, em 20 de janeiro, um decreto contra o Obamacare, para supostamente minimizar o peso financeiro dessa lei. O Senado americano (leia-se os republicanos) segue a mesma linha, discutindo uma proposta para substituir o Obamacare, prevendo que os estados, em vez do governo federal, passem a cuidar das políticas de saúde. O que faltou foi um delineamento claro e definido da nova proposta. Duvido muito que o sistema proposto por Trump ou pelo Senado traga vantagens reais aos americanos. O risco de criar uma instabilidade nos mercados de seguro de saúde é real. Se fosse para transformar o sistema público de saúde americano em algo parecido com o nosso Sistema Único de Saúde (SUS), os americanos iriam realmente se beneficiar. Mas universalidade, integralidade e igualdade, princípios basilares do SUS, não devem influenciar conceitualmente o novo sistema. Uma coisa é certa: Trump não quer o Obamacare. No mínimo, irá criar uma nova lei, o Trumpcare!

Rodrigo Batista de Almeida é professor do curso de Farmácia no câmpus Palmas do Instituto Federal do Paraná (IFPR).
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