A notícia de que a Universidade Estácio de Sá dispensou mais de 1,2 mil professores foi apontada como reflexo da reforma trabalhista, que criou o artigo 477-A na CLT, que prevê a desnecessidade de prévia negociação coletiva para as dispensas plúrimas (de muitas pessoas) ou coletivas. Será mesmo?
A universidade informou que irá contratar novos docentes em janeiro de 2018, nos mesmos moldes que os anteriores, com registro CLT e tudo o mais, algo que a legislação já permitia antes da reforma trabalhista. Ou seja, estamos falando de substituição de profissionais com altos salários por novos trabalhadores com salários mais baixos, algo que não é novidade no mercado de trabalho em razão de readequação financeira que os tempos atuais ainda exigem.
A Estácio não é a primeira instituição de ensino a fazer isso, e com certeza não será a última, o que demonstra que não é “culpa” da reforma trabalhista. A Anhanguera Educacional, por exemplo, também efetuou o desligamento de professores nas viradas de 2011 para 2012 e 2015 para 2016, substituindo cerca de 1,5 mil profissionais em cada ocasião, demonstrando que esse tipo de ação não é novidade e, portanto, não é fruto da reforma trabalhista, como muitos estão falando.
As demissões anunciadas não se enquadram como dispensa coletiva
Ainda assim, fica uma dúvida: antes da reforma trabalhista este tipo de dispensa deveria passar por prévia negociação coletiva? De fato, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho vai no sentido de que as dispensas coletivas devem passar por prévia negociação coletiva, mas o que seriam essas dispensas coletivas? A legislação não traz este conceito, algo que o próprio TST aponta em alguns de seus julgados como sendo um problema para a análise desses casos. Desta forma, temos de buscar na doutrina os elementos para caracterizar se uma dispensa de muitos trabalhadores poderia ser encarada como dispensa coletiva.
O jurista Orlando Gomes, no artigo “Dispensa coletiva na reestruturação da empresa – aspectos jurídicos do desemprego tecnológico”, de 1974, oferece a melhor caracterização do que seria uma dispensa coletiva, apontando a necessidade da coexistência de dois elementos: o rompimento contratual, sem que haja a substituição dos dispensados; e uma única causa vinculadora, ou seja, um fato único, seja de ordem econômica, tecnológica ou estrutural, alheio à pessoa do empregado.
No caso da Universidade Estácio de Sá, vemos que a dispensa foi realizada com o intuito de substituição de profissionais com alto salário por novos professores com salário mais baixo, ou seja, não é o caso de redução de pessoal em definitivo. Sendo assim, a dispensa ocorrida não se enquadraria como dispensa coletiva, que teria a necessidade de prévia negociação coletiva mesmo antes da reforma trabalhista.
Leia também: Os efeitos da reforma trabalhista (artigo de Antonio Carlos Vendrame, publicado em 13 de novembro de 2017)
Leia também: O verdadeiro viés da reforma trabalhista (artigo de Marlos Melek, publicado em 11 de junho de 2017)
Antes de muitos saírem propagando que a dispensa ocasionada na Estácio seja fruto da reforma trabalhista, seria importante verificar o histórico de casos semelhantes anteriores para perceber que não é nenhuma novidade o que ocorreu – em especial na área educacional.
A suspensão dos desligamentos feita pelo Judiciário trabalhista é para que a instituição de ensino apresente a lista dos nomes que irão substituir os professores desligados, mostrando que a validade das demissões está condicionada ao cumprimento deste critério para não se cair na hipótese de demissão coletiva, ainda que a CLT, após a vigência da reforma trabalhista, preveja que não é mais necessária a prévia negociação sindical.
Do ponto de vista legal, não há nenhum problema nas dispensas se forem contratados novos professores para substituir os desligados. Ainda assim, caberia uma discussão ética sobre o ocorrido; certo é que a reforma trabalhista não tem nada a ver com esse recente episódio.
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