Enquanto o Brasil testemunha um espetáculo de impunidade e revisões de multas em favor de empresários e políticos corruptos, uma narrativa muito diferente se desenrola além das fronteiras nacionais. Recentemente, nos Estados Unidos, décadas de suborno no Brasil vieram à tona com a confissão da empresa internacional de commodities, Grupo Trafigura.
Em um tribunal de Miami, o Grupo Trafigura admitiu sua culpa em um esquema de suborno em solo brasileiro que durou uma década, especificamente durante os governos do Partido dos Trabalhadores (PT). A confissão veio como parte de um acordo com o Departamento de Justiça dos EUA. A empresa se declarou culpada por violar os dispositivos antissuborno da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA).
É hora de repensarmos nossos valores e exigirmos uma Justiça verdadeira e imparcial, que não seja influenciada por interesses políticos e econômicos.
A Trafigura, que mantinha relações comerciais com a Petrobras entre 2003 e 2014, engendrou um esquema que envolvia pagamentos de até US$ 0,20 por barril de produtos petrolíferos transacionados com a estatal brasileira. Esses subornos eram mascarados por meio de empresas de fachada e destinados a contas bancárias no exterior pertencentes a funcionários da Petrobras. De acordo com os documentos do Departamento de Justiça dos EUA, a empresa lucrou aproximadamente US$ 61 milhões com esse esquema corrupto. Como parte do acordo de confissão, a companhia concordou em pagar uma multa criminal de US$ 80,4 milhões e teve outros US$ 46,5 milhões confiscados.
Essa descoberta não é algo novo, mas uma continuação das investigações iniciadas pela Operação Lava Jato. No entanto, enquanto no exterior a verdade vem à tona e as empresas são responsabilizadas por suas ações corruptas, no Brasil, a história está sendo reescrita para absolver os poderosos.
O que vemos no país é um espetáculo de inversão de valores e a justiça é subvertida em favor daqueles que estão no poder. Enquanto os brasileiros são forçados a testemunhar o desmantelamento de uma das maiores operações anticorrupção já realizadas no país, os responsáveis por saquear os cofres públicos são protegidos pelas mais altas esferas do Judiciário. Enquanto os tribunais superiores brasileiros se empenham em desmontar a Lava Jato e garantir a impunidade dos poderosos, a Justiça internacional continua seu trabalho em expor a corrupção e responsabilizar os culpados.
É lamentável que, dentro de nossas fronteiras, a história esteja sendo distorcida para salvar a biografia de alguns políticos, empresas e empresários amigos do rei. É hora de repensarmos nossos valores e exigirmos uma Justiça verdadeira e imparcial, que não seja influenciada por interesses políticos e econômicos. O Brasil merece mais do que uma Justiça seletiva e conivente com a corrupção.
Murillo Torelli é professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).
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