Postagens na internet e matérias na mídia têm apontado, de forma equivocada, a interferência do presidente da República no âmbito da Polícia Federal. Não quero simplesmente defender Jair Bolsonaro, mas concordo quando ele diz que “essa turma está lá há muito tempo, tem que dar uma arejada”. A polêmica começou com a recente troca de superintendentes. “O motivo foi a troca de 11 superintendentes sem falar comigo. Fui sugerir para o Rio um de Manaus, aí teve essa reação toda”, afirmou Bolsonaro. Como a direção da PF divulgou outro nome, o presidente lembrou que tem o poder de trocar o próprio diretor-geral.
O certo é que há muitos anos as indicações de superintendentes e do diretor-geral sempre foram políticas ou de governadores ou da Associação Nacional de Delegados da Polícia Federal (ADPF), que pauta as diretrizes do diretor-geral aprovando ou não todas as indicações dentro e fora da Polícia Federal; até na criação de uma delegacia do interior houve indicação política. A alegação de interferência em assuntos policiais, portanto, não procede. Sobre a possibilidade de o atual diretor-geral, Maurício Valeixo, sair, Bolsonaro estaria agindo dentro da legalidade, por ser sua competência exclusiva a escolha do diretor-geral, sem qualquer atrito com Sergio Moro, com quem está sempre em articulação e contato.
Para colocar a PF nos eixos internamente, o ideal seria selecionar o diretor-geral, o corregedor e o diretor de Logística fora dos quadros
Quando o delegado Fernando Segóvia foi indicado pelo presidente Michel Temer, houve a acusação de que a indicação teria partido do ex-presidente José Sarney, uma vez que Segóvia havia sido superintendente no Maranhão. Resultado: ataque de dentro da Polícia Federal, principalmente por parte do seu sindicato, a ADPF, até a destituição do diretor-geral escolhido. Com a chegada da turma de 1993 e a ascensão de Lula e de Márcio Thomaz Bastos no Ministério da Justiça, começou a dança das cadeiras. É possível conferir a movimentação no portal do Departamento da Polícia Federal, as diretorias, as superintendências e as adidâncias.
A Polícia Federal e a Receita Federal, assim como as Forças Armadas, devem se submeter ao controle do Poder Executivo, que, por sua vez, deve manter a autonomia da investigação e da fiscalização. Também pode ser inserido nesse contexto o Ministério das Relações Exteriores, porque essas instituições funcionam conforme as políticas de governo. Quando o Executivo orienta uma estratégia de segurança pública e a PF se nega a participar em razão de imposição feita pela ADPF sobre a questão da autonomia, fica claro o impasse criado. Por exemplo, na intervenção federal de segurança no Rio de Janeiro, a PF daquele estado fez certo “corpo mole” com relação à cooperação reclamada pelos interventores. Inclusive, nas últimas eleições, tanto os sindicatos de policiais federais como a ADPF apoiaram veladamente (e às vezes ostensivamente), o candidato presidencial derrotado.
A garantia da alta cúpula da PF sempre foi o seu sindicato, exigindo até do presidente da República retratações e mudanças de atitude em nome da pseudoautonomia. A autonomia investigativa já ficou provada nas operações da PF, principalmente na Lava Jato. Somente com autonomia os resultados grandiosos da maior operação contra corruptos do mundo teve tanto êxito, apesar de situações como a de um ministro de Estado ser também advogado e ter informações privilegiadas. Afinal, a própria Polícia Federal foi certamente aparelhada pela gestão anterior.
Para colocar a PF nos eixos internamente, o ideal seria selecionar o diretor-geral, o corregedor e o diretor de Logística fora dos quadros. A maioria das delegacias no interior do país foi criada por meio de solicitação política; nem sempre houve um estudo de viabilidade. O ideal seria acabar com a maioria delas e montar um escritório apto para receber as grandes operações a um custo bem menor. Já que a PF foi criada pelos militares, essa é a grande oportunidade de o presidente fazer as devidas correções na sua estrutura. A PF que trabalha duro e traz resultados é feita por heróis anônimos sem influência das associações. Até hoje, sua história foi feita por policiais dedicados a investigar a autoria e a materialidade do crime, pensando sempre no bem-estar da população brasileira.
Os críticos alegam que, se o presidente mexer internamente em certos órgãos de Estado, tal ato não seria nada republicano. Muito pelo contrário: mudanças fazem parte da formação de sua política estratégica na área de atuação dos órgãos estatais. Qualquer mudança nos quadros da PF, no mínimo, levará a uma carta aberta do sindicato, criticando a interferência do presidente e exigindo autonomia total para a Polícia Federal.
Carlos Arouck é policial federal, formado em Direito e Administração de Empresas, instrutor de cursos na área de proteção, defesa e vigilância, e consultor de cenários políticos e de segurança pública.
Julgamento do Marco Civil da Internet e PL da IA colocam inovação em tecnologia em risco
Militares acusados de suposto golpe se movem no STF para tentar escapar de Moraes e da PF
Uma inelegibilidade bastante desproporcional
Quando a nostalgia vence a lacração: a volta do “pele-vermelha” à liga do futebol americano