Um novo projeto de lei de autoria da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) – que reúne as maiores empresas do mercado de saúde complementar do Brasil – circula nos gabinetes da Câmara Federal e deve gerar muita polêmica, caso ganhe holofotes. Ele tem por objetivo alterar a Lei 9.656/1998, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde. A proposta pede a desregulamentação dos planos junto à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e cria uma série de regras que prejudicam os usuários. O projeto de lei prevê, entre outras, as seguintes alterações:
1) possibilidade de previsão de cobertura fragmentada em pacotes específicos (emergência, internação, internação em centros de terapia intensiva, pagamento de honorários de profissionais da saúde, exames e medicamentos, taxas para admissão em centros cirúrgicos, acompanhantes para adultos, atividades de fisioterapia, nutrição, fonoaudiologia e psicologia), ou seja, as operadoras poderão
comercializar pacotes que contemplem um ou mais serviços;
2) admissibilidade das operadoras estabelecerem reajustes diferenciados conforme a região do país e tipo de plano adquirido pelo consumidor. Além disso, o reajuste será vinculado à variação do custo médico-hospitalar e das novas tecnologias diagnósticas e terapêuticas, possibilitando-se, com isso, o aumento exorbitante nos preços dos planos de saúde;
3) possibilidade dos valores da coparticipação serem ampliados, conforme a utilização do plano de saúde pelo consumidor;
4) permissão para que as operadoras de planos de saúde descumpram os prazos para atendimentos e procedimentos, atualmente definidos pela Resolução Normativa n. 259/2011 da ANS, sem que haja qualquer tipo de punição para elas;
5) admissão de exclusão de pessoas com doenças crônicas e idosos, dos seus contratos coletivos, obrigando-os a aderir planos individuais (mais onerosos que os coletivos). Será permitida também a aplicação do reajuste por faixas etárias e idade, inviabilizando que os idosos mantenham seus contratos com as operadoras;
6) finalmente, a proposta estabelece um teto para o valor das penalidades a serem aplicadas às operadoras, e prevê a possibilidade de redução da multa de acordo com a capacidade econômica, porte da operadora e a gravidade da infração, de modo que as multas perderiam o seu papel de inibir as práticas abusivas praticadas por elas.
Se por um lado o projeto beneficia as operadoras de planos de saúde, na medida em que seu conteúdo tem o nítido caráter protecionista, visando a possibilidade de aumento dos lucros no setor da saúde suplementar, por outro lado, se aprovada, trará inúmeros prejuízos aos usuários de planos de saúde.
Atualmente, a assistência privada à saúde no Brasil é regulamentada pela Lei 9.656/1998, a qual prevê a cobertura assistencial integral aos beneficiários dos planos de saúde e estabelece um plano-referência de assistência à saúde de todas as doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), da Organização Mundial de Saúde.
Com a nova proposta, esta determinação simplesmente não existirá, pois será permitida a contratação de coberturas fracionadas, ou seja, os beneficiários terão que adquirir módulos específicos para ter acesso a exames, terapia, UTI, salas de cirurgia, emergência, especialidades (exceto as básicas), etc.
Haverá a ampliação dos lucros para as operadoras de planos de saúde, a desregulamentação das coberturas e a diminuição da proteção ao direito a uma atenção abrangente à saúde, inclusive com a possibilidade de serem excluídos os atendimentos de emergência, assegurados na lei em vigor.
Não bastasse isso, o projeto de lei esbarra nos princípios norteadores da Lei 9.656/98, que compreende a prevenção, a recuperação, a manutenção e a reabilitação da saúde, além da ampliação das coberturas, a elegibilidade de doentes e idosos e a padronização de contratos para os consumidores de planos de saúde.
A proposta também desarmoniza o equilíbrio das relações estabelecidas entre operadoras de planos de saúde e os seus usuários, ferindo princípios descritos no Código de Defesa do Consumidor (legislação aplicável aos contratos de plano de saúde, conforme preceitua a Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça), especialmente os princípios da boa-fé, da igualdade, da proporcionalidade e da proteção.
Em verdade, o projeto de lei se caracteriza como um verdadeiro retrocesso legislativo, na medida em que reduz os direitos e garantias dos beneficiários dos planos de saúde, que correspondem hoje cerca de 47 milhões de pessoas.
Fernando Augusto Sperb e Suhéllyn Hoogevonink de Azevedo são advogados da Sociedade de Advogados Alceu Machado, Sperb e Bonat Cordeiro.
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