A Pontifícia Universidade Urbaniana recentemente deu o nome do papa emérito Bento XVI à sua sala magna. Ele, em troca, honrou a universidade enviando um curto discurso, centrado na contínua relevância do trabalho missionário e da apresentação intelectual da fé como algo verdadeiro, e não apenas uma opção a mais em um "cardápio de mitos religiosos". Recordemos, ele diz, que a Igreja de Jesus Cristo nunca se confinou a um único povo ou uma única cultura, mas desde o começo orientou-se à humanidade inteira. A verdade da revelação cristã devia ser comunicada a todo o mundo e não apenas se tornar a tradição religiosa preferida de umas poucas tribos instaladas às margens do Danúbio, do Reno e do Tibre.
Os comentários do papa emérito se contrapõem à ideia, popular entre os filósofos pós-modernos, de que não existe uma verdade universal, e que toda tentativa de apresentar algo como tal levará à violência. Em outras palavras, são uma crítica à parábola de Tolstoi sobre os cegos e o elefante, na qual um grupo de cegos tocava as orelhas do animal; outro, a tromba; um terceiro, a cauda; e todos imaginavam que estavam sentindo o elefante como um todo quando haviam apenas tocado uma parte dele. Essa parábola é usada para tratar do diálogo religioso como sendo semelhante às pessoas que se encontram, trazendo sua percepção das diferentes partes da anatomia de um elefante, e juntando as peças para construir uma imagem mais ampla. Implícita nessa comparação está o princípio de que ninguém tem a compreensão completa.
No seu discurso à Urbaniana, Bento descreve essa compreensão do diálogo inter-religioso como nada menos que "letal para a fé". Retoricamente, ele questiona se o diálogo (mesmo o melhor diálogo possível) pode substituir a missão. O papa critica qualquer tipo de engajamento intelectual que pressuponha que a verdade autêntica sobre Deus é humanamente inatingível. O papa ainda observa que as questões fundamentais sobre a fé são todas relacionadas às questões fundamentais sobre o ser humano. Erros teológicos levam a erros antropológicos. A revelação existe para que a humanidade seja pessoalmente guiada por Deus sobre sua (da humanidade) própria natureza e suas próprias capacidades.
Bento XVI pede aos estudantes da Urbaniana que os católicos proclamem Jesus Cristo não para simplesmente inflar os números da Igreja, e muito menos por causa do poder. Em vez disso, "falamos Dele porque sentimos que precisamos compartilhar com os outros essa alegria que nos foi dada". Assim, o propósito de todo diálogo tem de ser a conversão. O diálogo nunca pode substituir a missão e a evangelização. A verdade não pode ser sacrificada no altar do pragmatismo, e nem ser diluída em um esforço de trazer mais pessoas para os bancos das igrejas.
Em outro pronunciamento feito após sua renúncia, uma carta ao matemático ateu Piergiorgio Odifreddi, Bento XVI argumentou que a "religião da matemática" professada por Odifreddi não era capaz de explicar a liberdade, o amor e o mal, e qualquer coisa que chame a si mesma de religião é completamente vazia se não tiver nada a dizer sobre esses três elementos básicos ao drama da vida humana.
Em resumo, a mensagem de ambos os textos é o de que o logos sempre precede o ethos. A verdade sempre vem primeiro, e dá forma a todo o resto.
Tracey Rowland, decana do Instituto João Paulo II para o Matrimônio e a Família, em Melbourne (Austrália), é autora de A fé de Ratzinger e membro da Comissão Teológica Internacional.
Tradução: Marcio Antonio Campos.
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