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| Foto: Divulgação/Netflix

Os muitos comentários nos últimos dias sobre a série 13 Reasons Why, da Netflix, me “obrigaram” a assisti-la. De cara, me assustei com o tempo que gastaria para entender que risco ela traria ao meu cotidiano profissional. Mas, finalizada a tarefa, devo admitir que valeu a pena passar um tempo no sofá.

Primeiro, é válido ressaltar que sempre haverá o receio de se abordar o tema do suicídio e desencadear o “efeito Werther” (de Os sofrimentos do jovem Werther, de Goethe, obra literária que desencadeou uma série de suicídios na Alemanha em seu lançamento). Mas tal temor não pode nos impedir de abordar o tema, tamanha sua importância. E não me parece que a produção da Netflix tenha se ausentado desta responsabilidade, já que divulgou diversos avisos, links de apoio, uma parceria com o Centro de Valorização da Vida, comentários de especialistas após o 13.º episódio e, o mais importante, não glamourizou o suicídio de Hanna, a adolescente cuja história é contada na série. A cena de sua morte é forte, marcante e difícil de assistir sem fechar os olhos. A série mostra ainda a intensidade do sofrimento dos pais de Hanna após seu suicídio, deixando bem claro seu efeito devastador aos que ficam.

Na série, o suicídio é apenas um dos temas impactantes

Muitas críticas a 13 Reasons Why se baseiam em recomendações (do ano de 2000) da Organização Mundial da Saúde e em orientações da agência sobre como a imprensa deve lidar com a divulgação de casos de suicídio, justamente para tentar se evitar o efeito Werther. Pequenas comunidades em todo o mundo, onde a imprensa local tende a noticiar detalhes e romantizar a vida dos que faleceram tragicamente por suicídio, podem – sem intenção – sugerir um efeito em cascata. A série mostra que isso estava por ocorrer na trama, por meio de diversas homenagens, flores, fotos e reportagens sobre Hanna no jornal da escola. A ficção se desenrolou em outra esfera, mas na vida real seria fácil deduzir que tevês locais fizessem séries de reportagens e manifestações sobre a morte da garota, que poderiam ser facilitadores do efeito Werther. Fato é que 13 Reasons Why não é vida real; portanto, não precisaria abordar temas tão importantes de forma superficial (como é sugerido pela OMS à imprensa, em se tratando de suicídios reais).

Então, para nossa vida real, o que 13 Reasons Why tem a dizer? Na série – que já nas primeiras cenas faz uma referência clara de que “tudo era muito melhor antigamente” –, parece-me que o suicídio é apenas um dos temas impactantes. E, nesta linha de influência ao desenvolvimento emocional dos adolescentes, 13 Reasons Why vai navegando pelos mares do distanciamento dos pais em relação aos jovens e o desconhecimento deles sobre quem são e o que pensam seus filhos. Há também a crítica à instituição educacional, que claramente se preocupa mais em se proteger de acusações do que realmente identificar sinais de alerta entre seus alunos. Há referências ao recorrente uso indevido de álcool e outras drogas. Há relações juvenis favorecidas pelo grupo e pelo funcionamento narcisista comum à idade. O cyberbullying e o impacto que isso pode trazer à vida de alguém que ainda está com seus processos cerebrais e de personalidade em formação também são temas abordados.

Enfim, 13 Reasons Why é uma série forte e impactante. E sim, pode vir a ser perturbadora aos jovens que se identificam com alguma situação ou que já apresentam algum sintoma de quadros psiquiátricos (lembrando que transtornos de humor, psicóticos e de ansiedade tendem a ter, por característica, seus primeiros sinais na adolescência). Apesar disso, não me parece que a série deva ser condenada em uma sociedade onde crianças de 10 anos têm seus próprios celulares com acesso a qualquer tipo de conteúdo, com pleno e frequente contato com pornografia, violência e jogos de desafios. Fora o inerente risco de, mesmo inocentemente, munidas de um smartphone e sem a devida orientação e participação dos pais, qualquer criança poder se tornar um bully – o causador do bullying.

Por isso, não creio que as famílias devam proibir os jovens de assistir a 13 Reasons Why – controlar e supervisionar o acesso de suas crianças à internet, Facebook, WhatsApp e outras mídias sociais, isso sim. Em vez de proibir, os pais deveriam sair dos seus meios individuais de mídia, em seus respectivos quartos e camas, para dividir a sala em um programa familiar para ver e conversar a respeito da série – sem esquecer de desligar seus telefones celulares e laptops enquanto Hanna e Clay apresentam sentimentos e comportamentos comuns na difícil e desassistida fase que é a adolescência. Na esperança de que, como diz Clay no fim da série: “It has to get better. The way we treat each other and look out to each other”.

Carlos Augusto Maranhão de Loyola, médico psiquiatra, pós-graduado em Dependência Química, em Terapia Cognitivo-Comporamental e em Medicina Legal e Perícias Médicas, é membro da Associação Brasileira de Psiquiatria e da Câmara Técnica de Psiquiatria do CRM-PR.
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