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Os canudos de plástico são mesmo os grandes vilões?

(Foto: Pixabay)

Na medida em que cresce a população, cresce também o consumo e, consequentemente, os impactos ambientais oriundos tanto da nossa maior velocidade ao consumir quanto da ausência de infraestrutura para a reciclagem dos resíduos em todo país.

Tal fato deveria levar a todos nós, consumidores, a refletir naturalmente o aspecto mais básico desta cadeia: o que acontece com o resíduo que descartamos? Existe possibilidade de reduzir o impacto do nosso consumo ou precisamos de fato consumir menos? A ausência desta reflexão nas esferas pública, privada e na sociedade civil tem criado um ambiente perigoso para todos nós: a proibição de produtos e materiais sem a devida análise.

Em julho de 2018 foi o Rio de Janeiro. Depois, Teresina e, dias atrás, São Paulo resolveram aderir à onda proibitiva. As aprovações da lei que proíbe o fornecimento de canudos em estabelecimentos comerciais é um reflexo da atual demonização do plástico sem a devida reflexão sobre a nossa responsabilidade enquanto consumidores pelo modo como o utilizamos e descartamos. A iniciativa da proibição poderá ter um efeito contrário ao que teoricamente se propõe, caso não haja uma educação ambiental adequada da população e a ampliação dos projetos de coleta seletiva.

Um relatório produzido pela Fundação Ellen MacArthur – instituição criada com a missão de acelerar a transição rumo a uma economia circular – e divulgado na edição 2017 do Fórum Econômico Mundial demonstra que 86% de todas as embalagens de plástico que chegam ao mercado mundial são destinadas ao meio ambiente e aterros sanitários. Além disso, o levantamento ainda aponta que em 2050 os oceanos poderão conter mais plásticos do que peixes.

Muitos substituíram os canudos por copos plásticos, cujo impacto é significativamente maior

Entretanto, a falta da conscientização sobre o papel de cada um no processo de destinação seria o grande culpado por tais danos. O problema não está no material plástico em si, mas no fato de ele ser utilizado por um curto período, no caso dos produtos de uso único, e em seguida ser descartado incorretamente. Os canudos plásticos não vão parar sozinhos nos rios e oceanos; é necessário que alguém os descarte incorretamente, e a falta de informação sobre o que fazer com canudos e as embalagens de forma geral, tanto da população como das empresas, é a grande questão.

O estudo também conta que anualmente são desperdiçados de US$ 80 bilhões a US$ 120 bilhões em embalagens plásticas por não retornarem ao ciclo produtivo por meio da reciclagem. Isso significa que esse é um mercado inexplorado e que pode criar diversas oportunidades. Estamos trocando geração de empregos e renda por leis que não nos levam a lugar algum.

Além de lucrativo, o processo de reciclagem do plástico exige menos energia, por exemplo, que o do alumínio, material que hoje reciclamos a uma taxa de 98% no Brasil e nos torna referência internacional no assunto. A cadeia do alumínio nos dá um ótimo exemplo do que pode ser feito em um mercado bem estruturado tributariamente e operacionalmente para isso. Porém, apesar do excelente exemplo, o país recicla apenas 3% das quase 80 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos geradas anualmente.

Devido à nova lei, atualmente, estamos diante de um nó górdio: o poder público exige a substituição dos canudos por outros de papel ou biodegradáveis, mas as indústrias produtoras não têm dado conta da enorme demanda gerada repentinamente no mercado, e muitas empresas não têm tido alternativa a não ser buscar a importação do produto da China.

Além disso, o que já está acontecendo no Rio de Janeiro, especialmente com os pequenos empreendedores, é ainda mais grave do que se continuassem oferecendo os canudos de plástico: muitos os substituíram por copos plásticos, cujo impacto é significativamente maior, caso o copinho seja descartado incorretamente. Para se ter uma ideia, estima-se que os copos tenham pelo menos quatro vezes mais plástico que um canudo.

Com isso, a lei pode ter um efeito contrário ao pretendido, que seria a diminuição da poluição plástica, visto que mais copos plásticos estão sendo oferecidos e não existe campanha de conscientização da população para o descarte correto. Se nós, consumidores, não mudarmos nosso comportamento, os danos ambientais vão continuar. De pouco adianta usar canudo de papel ou outro material biodegradável se os jogamos fora misturados com outros resíduos, impossibilitando sua reciclagem ou compostagem, por exemplo.

É necessária a participação de toda a sociedade no entendimento sobre a importância da separação de resíduos nas residências, sobre o que é a coleta seletiva e como contribuir com a logística reversa de embalagens em geral. Se criarmos uma cadeia engajada para aproveitar o potencial comercial do plástico como acontece em relação ao alumínio, o material não mais será o problema. Quando as empresas reconhecerem esse fato, quando o poder público deixar de bitributar o plástico reciclado, quando as pessoas entenderem que elas têm um papel fundamental nesse sistema, fazendo o plástico chegar para a coleta seletiva, estaremos seguindo o caminho certo.

O comércio de plásticos gera corte de custos com destinação de resíduos, criação de empregos, nova fonte de receita para empresas recicladoras e cooperativas e um impacto ambiental positivo ao planeta. Tudo isso por meio da reinserção do resíduo na cadeia produtiva. Mas é necessário que todos participem ativamente deste processo, que trará benefícios para as empresas, para as pessoas e para o meio ambiente. A falta de informação é um dos maiores gargalos para a reciclagem, pois impede a boa separação e a destinação correta dos materiais. Já passou da hora de assumirmos a nossa responsabilidade enquanto consumidores. Não dá mais para transferimos para o material um problema do comportamento social.

Renato Paquet, formado em Ecologia com ênfase em ecologia industrial e gestão, é diretor-presidente de Cleantechs da Associação Brasileira de Startups e fundador da Polen, startup de sustentabilidade.

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