Desde o fim do Apartheid, no fim dos anos 90, a África do Sul vinha sendo exaltada como um exemplo na luta por justiça e igualdade. No Índice de Liberdade Econômica de 2018 da Heritage Foundation, o país foi classificado como “moderadamente livre”, com um aumento de 0,7 ponto em seu desempenho, graças a melhorias importantes na liberdade de investimento e na eficácia do Judiciário.
Mas tudo isso pode mudar, e logo. Desde que chegou ao poder, o presidente Cyril Ramaphosa tem respondido às pressões econômicas internas alinhando-se à extrema-esquerda na defesa da expropriação de terras de fazendeiros brancos sem nenhum tipo de compensação. Essa retórica deveria preocupar qualquer um que reconheça a importância da propriedade privada e da liberdade econômica.
Até há pouco tempo, a política sul-africana para a apropriação de terras por parte do governo era de “willing buyer, willing seller” – ou seja, ambos os lados deveriam estar dispostos a negociar. Mas, em 1.º de agosto, Ramaphosa disse que o Congresso Nacional Africano, o partido hoje no poder, pretendia mudar a Constituição do país para permitir ao governo expropriar terra sem pagar indenizações. Ao permitir isso, Ramaphosa e o CNA dão passos perigosos para desrespeitar os direitos dos sul-africanos à propriedade. Eles estão em risco; afinal, não pode haver um autêntico direito à propriedade enquanto o governo puder tomá-la arbitrariamente.
Embora Ramaphosa seja presidente tanto do país quanto do partido governante, quem mais tem colocado lenha na fogueira da expropriação de terras é Julius Malema, um ex-membro do CNA que foi expulso por ser extremista demais, bem como por ter cometido vários crimes. Malema, então, criou seu próprio partido, os Guerreiros da Liberdade Econômica, que tem hoje 25 das 400 cadeiras na Assembleia Nacional sul-africana. Os Guerreiros se definem como “um movimento radical e militante de emancipação econômica”, Malema se diz “comandante em chefe” do partido e a alta cúpula é o “comando central”.
Se aprendemos alguma coisa com a história, saberíamos que partidos políticos radicais e militantes não trazem nada de bom a um país
Se aprendemos alguma coisa com a história, saberíamos que partidos políticos radicais e militantes não trazem nada de bom a um país. Malema já disse com todas as letras que pretende nacionalizar as minas e tomar as terras dos fazendeiros brancos sem indenizá-los.
A postura de Malema que mais causa divisão e é mais extrema, no entanto, tem origem nas alegações de que ele gostaria de punir fazendeiros brancos com a morte. Em março de 2010, relatos dizem que Malema foi ouvido cantando a canção Shoot the boer (“atire no boer” – boers são os descendentes dos colonizadores de língua holandesa) em um câmpus universitário. Um artigo publicado no The Citizen trazia um tuíte em que Malema respondia às acusações de ter orquestrado a morte de fazendeiros brancos, dizendo “talvez; talvez não”.
Por mais que quase todo mundo concorde que matar pessoas por causa de sua cor de pele é condenável, muitos acham que uma redistribuição forçada de terras e riqueza vai, de alguma forma, melhorar a vida de todos. Mas a história mostra que mercados livres, cooperação e governo justo têm sido muito melhores para a coletividade que a perda do direito à propriedade, coerção e governo arbitrário. Basta ver os padrões de vida no ocidente desenvolvido, em comparação com qualquer país que tenha passado pela experiência comunista. O Índice de Liberdade Econômica tem mostrado que as pessoas que moram em países com maior liberdade econômica, o que inclui o respeito ao direito à propriedade, vivem melhor.
É o mercado livre que permite às pessoas sair da pobreza e ter uma vida mais confortável. Mas esse mercado livre, que permite ao engenho humano atingir seu potencial máximo, não existirá se as pessoas precisarem se preocupar com a possibilidade de o governo tomar o que elas têm.
Paulo Cruz: A senzala ideológica de uma francesa no Jardim Europa (2 de agosto de 2018)
Leia também: O país dos impuros (artigo de Demétrio Magnoli, publicado em 11 de maio de 2011)
Os líderes sul-africanos têm duas opções. Eles podem se curvar à ideia de expropriação de terra defendida pelos radicais demagogos de extrema-esquerda, ou podem aderir ao lema do país, “unidade na diversidade”, e deixar seus cidadãos determinarem seu futuro, independentemente da cor da pele. O país está em uma encruzilhada. O Índice de Liberdade Econômica coloca a África do Sul como a quarta nação mais livre da África Subsaariana, e isso significa que outras nações do continente veem o país como um exemplo a seguir. Seria vergonhoso se a África do Sul escolhesse as mesmas políticas autoritárias que fracassaram na União Soviética, na Venezuela, em Cuba e no Zimbábue – só para ficar em alguns poucos países.
Em vez disso, Ramaphosa deveria ajudar os sul-africanos a enfrentar gente como Malema. Ele deveria respeitar a liberdade econômica dos sul-africanos, seu direito a escolher como querem viver e fazer suas próprias decisões econômicas, sem medo de um confisco de terras por parte do governo.
Milhões de pessoas em todo o mundo conseguiram escapar dos grilhões da repressão econômica e da pobreza quando passaram a ter o tipo de direito à propriedade que, agora, o governo da África do Sul parece muito interessado em abolir.
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