Jacques Lambert, quando cunhou a figura dos "dois Brasis" em seu livro de mesmo nome, se referia ao Brasil desenvolvido e ao subdesenvolvido, à Bélgica e a Índia, do mítico país da Belíndia imaginado por Edmar Bacha. A síntese de Lambert continua válida, o subdesenvolvimento ainda é uma constante para uma boa parte da população nacional, mas há uma outra divisão ainda mais preocupante: a do Brasil que aprende e a do país que se recusa a aprender com seus acertos, seus erros, os acertos dos outros e os erros dos outros, Os grotões geográficos vão se reduzindo progressivamente, mas persistem entre nós os grotões culturais, corporativos, sociais e políticos que nos imobilizam e nos atrasam. De um lado, a modernidade, a esperança e os ventos da mudança sopram em muitos lugares e em muitas direções; mas, de outro, a insistência em velhas práticas, antigos vícios, a incapacidade de superar os problemas, vislumbrar novos horizontes continua solidamente enraizada em muitas de nossas lideranças e de nossas elites.
Esta semana, o Brasil teve oportunidade de ver alguns flagrantes de seus grotões expostos à luz do dia: crianças voltam às escolas e encontram salas de aula depredadas por vândalos, professores intimidados por traficantes e ladrões, prédios malcuidados, bibliotecas raquíticas, administradores e políticos desinteressados da educação apesar da retórica grandiloquente... Em São Paulo, o maior estado da federação, cem mil professores fazem um teste de capacitação técnica e 1.500 deles tiram zero; 40 mil não alcançam a média cinco; isso significa que sabem menos do que a metade daquilo que pretendem ensinar às pobres crianças. E aí vem a imagem acabada do grotão: o sindicato dos mestres vai à Justiça para evitar que essas pessoas, que não sabem nem para consumo próprio, sejam autorizados a ministrar aulas na rede estadual... Pior ainda conseguem.
Na política, os grotões reinam absolutos. Os nobres parlamentares gastam R$ 15 mil por mês, com dinheiro público, em despesas várias e a Câmara Federal havia prometido que passaria a detalhar, para conhecimento dos contribuintes que afinal são os que estão pagando a conta o conteúdo das notas fiscais que apresentam para justificar a despesa. Agora, adiaram a medida moralizadora sine die, com a concordância de todos os líderes partidários. Cadê a tão decantada transparência? De quebra, José Sarney que é o símbolo puro e acabado do arcaísmo, do atraso e do anacronismo em matéria de prática política, voltou à presidência do Senado. Que fazer? Como dizia Jonathan Swift, emendando o Sermão da Montanha, "bem-aventurados os que não esperam nada, pois não serão decepcionados".
Mas, há compensações como o privilégio de ir a Cascavel, como fiz, acompanhando o ex-governador Jayme Canet Jr. para visitar o 21º Show Rural promovido pela Coopavel. O Show, que este ano receberá mais de 150 mil visitantes, é um espetáculo entusiasmante por mostrar não o que a gente do Paraná foi capaz de realizar em poucas décadas, que todo mundo sabe; mas o que nossa gente fará nos próximos anos. Uma tecnologia de altíssimo nível, comparável às agriculturas mais modernas do mundo; uma multidão de produtores de todos os tamanhos, grandes, médios, pequenos e muito pequenos a perguntar, observar, encomendar e comprar sementes de alto rendimento, embriões, máquinas e implementos. Cadê a crise? Não pergunte para eles.
O Paraná é isso, o resultado de um gigantesco espetáculo de aprendizado coletivo e nada é mais moderno do que aquilo que se chama em teoria organizacional de "organizações que aprendem". Parafraseando Mateus e Swift: "Bem-aventurados os que não desanimam, pois pode demorar, mas um dia e em algum lugar, eles receberão sua recompensa". Minha recompensa me foi entregue em Cascavel.
Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do Doutorado em Administração da PUCPR.
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