O escândalo político que assola a credibilidade da Assembleia Legislativa paranaense é resultado de um árduo trabalho investigativo conduzido pelos jornalistas da Gazeta do Povo.
Pela primeira vez, a opinião pública paranaense tem acesso ao histórico de corrupção endêmica que se instalou na Assembleia Legislativa e, de maneira cética, atormentada e aflita, acompanha os detalhes de uma coleção de desvios perpetrados pelos donos do poder. Ou seja, por políticos eleitos que deveriam representar os legítimos interesses da população paranaense.
Já se disse, em relação ao Brasil, que uma das maiores dificuldades para afirmação dos princípios democráticos republicanos no país diz respeito à incapacidade da sociedade civil e, em especial, de suas elites dirigentes, para separar o que é público do que é privado. Com isso, os donos do poder, uma vez no comando político dos aparelhos de Estado, costumam agir às margens da lei, apropriando-se privadamente dos bens públicos e enriquecendo-se impunemente à custa dos impostos da nação.
A sensação de impunidade, de descrença social e, por vezes, de conluio que se instala na cúpula dos três poderes da República pode e deve ser reduzida sempre quando denúncias jornalísticas de grande impacto social possam sensibilizar e mobilizar outras esferas institucionais do poder. Cabe ao Ministério Público aprofundar o curso das investigações e aos juízes decidirem de maneira autônoma, competente, republicana e dentro do prazo os processos que envolvem atos de corrupção política.
No caso da denúncia dos Diários Secretos, o Judiciário será levado a confrontar e decidir com base em duas perspectivas jurídico-políticas antagônicas: arquivar os processos, e, talvez, punir alguns servidores anônimos para servirem de bode expiatório e encerrar o caso. Com isso, os donos do poder continuam livres para inverter impunemente, de maneira vil, insensível e covarde os princípios constitucionais democráticos que definem e orientam a maneira correta de os políticos eleitos agirem diante da administração dos recursos públicos. A outra opção seria o Judiciário, sem prejuízo das premissas constitucionais do devido processo legal, tomar uma decisão no sentido de inibir o roubo e a impunidade no trato da coisa pública.
A escolha do Judiciário pela segunda opção reabre a esperança de que milhares de homens, mulheres, jovens e crianças famintos, sem emprego, sem moradia, sem escola e sem perspectiva de vida digna sejam beneficiados pelas políticas públicas do Estado. Essa multidão de corpos e rostos anônimos, que engrossa as favelas, inunda as avenidas urbanas e perambula pelas ruas em busca de um lugar ao sol, é, em grande medida, o subproduto da impunidade e da corrupção na política.
Em fim, espera-se que uma denúncia jornalista corajosa e socialmente desconcertante não durma nos porões da burocracia do Judiciário e sirva apenas para alimentar a impunidade, o aumento da desigualdade econômica e do ceticismo popular em relação às instituições democráticas.
Cezar Bueno, doutor em Sociologia, é professor da PUCPR