Há uma constante vertente dos atores econômicos que oscila no que eu chamo “pecado capital”. Pecam pela simplicidade os que atacam incessantemente os fundos de investimentos sem compreender a função social do capital. Pecam, muitas vezes, os gestores de fundos, que falam em seus resultados sem demonstrar exatamente o que ganha a sociedade. São dois pecados amarrados em uma mesma ação: a incapacidade de ouvir os dois lados da sociedade e compreender a necessidade de investir para geração de empregos e renda.
Os fundos de investimentos gerem capital. E, claro, os investidores buscam o lucro. O lucro é constantemente alvo de ataques como se fosse um palavrão. Precisa deixar de ser. No Brasil existe uma poupança total de capital voltado para investimentos de cerca de R$ 7 trilhões. Neste montante estão os pequenos investidores, assalariados, que buscam preservar seus ganhos sem que sejam corroídos pela inflação. Buscam um resultado positivo para seus investimentos amealhados pelo suor. As aplicações financeiras – quaisquer aplicações – dependem de o agente investidor ter lucro na gestão do capital alheio. Enfim, o lucro para o pequeno poupador vem do lucro que os fundos conseguem ter.
A crítica sobre os fundos é de que seriam gestores de capital não produtivo, o que merece uma explanação um pouco mais longa. Didaticamente, existe o capital financeiro, que soma toda a poupança da sociedade e se apresenta na forma líquida (dinheiro) ou quase líquida (papéis, títulos etc.). Existe o capital produtivo, que está instalado nas fábricas e nos serviços. O comportamento desse capital financeiro é diferente do comportamento do capital produtivo. O primeiro é muito mais arisco, assustado. Diante de uma adversidade, o capital financeiro busca se preservar e migra com facilidade, pois está na forma líquida. Diante da mesma adversidade, o capital produtivo enfrenta o problema porque está instalado na forma física, e superar problemas é motor da geração de oportunidades. A resiliência corre no sangue do capital produtivo. Buscar soluções em turbulências e aproveitar oportunidades é a sua vida. A face mais importante desta dança de (aparentes) opostos é quando o capital financeiro “casa” com o capital produtivo através do investimento em aportes de capital, promovendo o crescimento com geração de emprego e de renda. É quando se encontram o interesse individual do poupador/investidor com o interesse coletivo da sociedade. Este casamento é motor do desenvolvimento social.
No Brasil existe uma poupança total de capital voltado para investimentos de cerca de R$ 7 trilhões. Neste montante estão os pequenos investidores, assalariados, que buscam preservar seus ganhos sem que sejam corroídos pela inflação.
Os fundos exclusivamente de Private Equity tinham, no fim de 2020, um Capital Comprometido Total de R$ 182,4 bilhões. Já os Venture Capital tinham um Capital Comprometido Total de R$ 45,2 bilhões no fim de 2020. Estes dois modelos de investimentos financiam exatamente empreendedores e empresas que precisam crescer e não possuem capital próprio suficiente.
O ano de 2020 terminou com um total de 259 empresas investidas com um valor médio por empresa de R$ 94 milhões. Somando os investimentos até este ano e a partir de 2013 o total é de 1.556 empresas. Nos investimentos mencionados não estão citados os aportes de investidores-anjo e sementes, que são os fundamentais para as startups. Hoje existem cerca de 14 mil startups no país, distribuídas em 710 cidades. As startups representam a face da vanguarda de soluções em tecnologia e o desenvolvimento do empreendedorismo prioritariamente jovem no Brasil.
A lógica irrefutável é a de que os investidores esperam que as empresas sejam eficientes na geração de resultados para que ganhem. As empresas precisam crescer para gerar os resultados esperados, e isso gera emprego, renda e impostos recolhidos.
O desenvolvimento das empresas de micro, pequeno e médio portes depende da disponibilidade de capital de risco. Sem ele a grande maioria sucumbe por falta de capital. A oportunidade de conseguirem investidores é a de repartirem os riscos e manterem-se no espectro principal: crescimento que invariavelmente gera postos de trabalho.
A distribuição de renda em um país como o Brasil depende de geração de empregos. Empregos geram renda e movimentam o mercado interno. É o primeiro passo para promover a justiça social em que a cidadania seja mais do que uma palavra, e sim a possibilidade da vida com dignidade. A redução do desemprego significa desonerar o Estado e a possibilidade de investimentos públicos naquilo que vai retirar o Brasil de um cenário incompatível com o seu potencial: a educação. Erradicar a pobreza é um passo necessário que caminha ao lado de repousar os olhos sobre o futuro.
O país já foi muito castigado pela criação de opostos e grandes inimigos. E este é um pecado que não podemos mais permitir permear a vida. O capital não é anjo nem demônio. É um instrumento para fazer empresas crescerem gerando emprego, renda e crescimento do mercado interno. Empregabilidade desonera o Estado, aumenta a arrecadação e ajuda a estabilizar as contas públicas. O pecado capital para o país é cada qual defender o seu quinhão de pensamento sem se importar com as necessidades que temos.
Gilberto Zancopé é economista, ex-presidente da Montana Agrícola e da Wap, onde permanece como presidente do conselho, e criador do Fundo Order VC.