Pelo menos dois aspectos ficaram evidentes na discussão sobre a liminar da “cura gay”. Primeiro, a própria expressão “cura gay” tem um enorme potencial de viralizar nas redes sociais. A prova é que ela não figura em nenhum documento oficial do embate. Não passa de um poderoso “meme” capaz de suprimir a capacidade crítica de muita gente. Segundo, definir um termo apenas em um campo do saber é desonestidade intelectual.
“Cura”, em termos médicos, depende de uma etiologia (critérios objetivos) e nem sempre se remete a uma solução definitiva. Em psicopatologia os critérios são obscuros, mas não menos importantes e observáveis, por isso de difícil classificação. Mais difícil ainda se falar em cura, mesmo com todos os estudos e avanços em saúde mental que já se conhecem. A comunidade científica e o senso comum sabem que distúrbios mentais graves, lesões cerebrais e má formação na região cerebral não têm reversão, mas pode haver controle dependendo do grau de comprometimento. Nestes termos, homossexualidade não é doença, e sim uma questão de identidade.
Estabelecer a identidade sobre os afetos não é o único caminho, nem o mais importante
Historicamente, instituições clássicas como a família e a educação forneciam sentido de identidade, mas elas estão terrivelmente fragmentadas e em ruínas. Numa sociedade pluralista, há tantos caminhos possíveis para se determinar a identidade que é comum as pessoas se perderem por eles. Estabelecer a identidade sobre os afetos não é o único caminho, nem o mais importante. Identidade é a coerência interna com algo que nos é dado e que nos confere o sentido do que devemos ser e fazer no mundo. Os valores morais, a capacidade de distinguir entre o bem e o mal. As narrativas em que nos inspiramos para construir nossas referências. Quem nunca desejou exercer a profissão dos pais ou de ser igual a uma figura ilustre da história? A capacidade humana de ter domínio sobre a criação, realizar projetos e transformar o mundo à sua volta: o trabalho é fonte de identidade. A necessidade de amor humano: quanto mais nos aproximamos da realidade do amor, mais nossa coerência interna se organiza.
O Conselho Federal de Psicologia erra em muitos aspectos ao tomar como verdade única um discurso ideológico, impondo-o aos profissionais que representa e à sociedade. Ele fere o próprio código de ética, no seu artigo 2.º, pois está “induzindo a convicções políticas e ideológicas”, além de estar usurpando um princípio fundamental do código, que é “não considerar as relações de poder no contexto de sua atuação”. Ao determinar que a identidade de um sujeito não pode ser construída fora do âmbito da sexualidade, como alegam os movimentos LGBT, por exemplo, o CFP está equivocadamente desprezando outros saberes consolidados na história da humanidade, impondo indevidamente seu poder de representatividade. Desqualificar profissionais da área usando apenas este argumento falacioso da “cura gay” é, no mínimo, desonestidade ou, na melhor das hipóteses, incompetência.
Lamento como a questão tem sido apresentada à sociedade. Aos 55 anos, a reputação da psicologia no Brasil se reduziu a defender lutas de determinadas classes, e não direitos humanos. As contribuições da psicologia deveriam ir além dos modos como se vive a sexualidade, até porque ela não é a única que tem algo a dizer sobre este campo complexo cheio de variáveis.
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