“Adolescente de hoje”. Você certamente já escutou – ou até repetiu – esta frase para se referir à juventude atual. Consciente ou não, provavelmente já demonstrou sua opinião negativa e, perdoe-me, superficial sobre o jovem "de hoje". Quiçá torceu nariz a filho adolescente por sua irritante – ainda que natural e esperada – imaturidade. Enfim, em algum momento, você com certeza já reforçou e engrossou o coro de desaprovação ao atual perfil adolescente.
Confesso: também participei desse grupo de críticos contumazes ao jovem de hoje. Porém, enquanto o depreciava, uma questão também me inquietava: quem, afinal, seria responsável por formar esse jovem “tão difícil” senão pais e mães? A óbvia resposta foi ainda pior: eu mesma, mãe de dois adolescentes “de hoje”, ou seja, a única e maior responsável por dar “boa safra” ao mundo.
Fui mãe no automático caindo na cilada de rotular filho adolescente com clichês e frases feitas.
Dar bom fruto demanda empenho do agricultor, boa semente e prudente semeadura. Como bons agricultores, também pais e mães precisamos cuidar de cada etapa de desenvolvimento dos filhos, atentos às necessidades de cada fase e circunstância. Frente à premissa, nova questão então sobrevém: como nós, pais de adolescente – também “de hoje” – nos preparamos para dar bom fruto à sociedade em realidade tão diferente do passado?
Fui mãe no automático caindo na cilada de rotular filho adolescente com clichês e frases feitas. Ocupada em nomear – mais do que conhecer a nova geração – adotei o termo "adolescente de hoje" para descrevê-lo com simplismo típico de quem recorre a atalhos para o que desconhece.
Cegos ao desvario de desmerecer filho, seguimos desatentos em parcimoniosa atuação como pais de adolescente.
Enquadrá-lo a padrões me aliviava o trabalho de conhecê-lo e, junto, me levava a ignorar sua identidade, desprezar sua personalidade e desmerecer os novos tempos. Misturado à massa homogênea e impessoal, tachei filho de “adolescente de hoje”, destacando sobretudo seus “defeitos”, e me cegando a suas qualidades. A responsabilidade – e o dever – de desvendá-lo e semear bom fruto pouco a pouco foi sendo substituída por opiniões demeritórias e, admito, preguiçoso desinteresse por ele e sua vida.
Não tardou e minha incompetente atuação veio à tona: viver a nova fase junto de filho adolescente virou um desafio quase impossível. Não só a fase mudara como também as circunstâncias do mundo moderno. Tudo estava diferente e meu despreparo e desconhecimento na função davam mostras de minha inabilidade de dar conta da missão de formar um adulto saudável para o mundo.
Contaminada por teses e discursos pessimistas sobre o novo perfil adolescente, absorvi e compactuei com analogias simplistas entre presente e passado que paulatinamente iam me paralisando em uma realidade imaginária, enquanto filho e mundo seguiam mudando. Àquela altura, elencava razões externas para justificar o péssimo relacionamento com filho adolescente. Outorgava ao “mundo” – seja lá quem fosse – a causa (quando não a culpa) de tamanho insucesso na formação desse chamado “adolescente de hoje”.
O mundo de hoje nos exige mais. A nós, pais de adolescentes, é delegada a missão de dar bons frutos.
Não raro escutar, validar – até repetir! – críticas ao adolescente de hoje inflamadas por rejeições ao mundo atual e reiteradamente desqualificar toda uma geração. Cegos ao desvario de desmerecer filho, seguimos desatentos em parcimoniosa atuação como pais de adolescente. Armados de pejorativos clichês sobre a fase e rasas definições sobre o mundo transformado, negligenciamos o cultivo, relaxamos na busca de opções alinhadas às novas necessidades, deixamos de desbravar o desconhecido e culpamos terceiros por maus resultados.
Ao afiançar a depreciativa retórica sobre o adolescente de hoje ratificamos a ignorância e a displicência de quem tem a missão de “criar filho para o mundo” comprometido a dar bom fruto, não importam as circunstâncias cada vez mais desafiadoras.
A semente dada continua boa; a diferença está no cultivo, tarefa sempre desafiadora, mas que, nas mãos do agricultor competente, cresce e multiplica.
Dar bom fruto é tarefa exigente e, concordo em dizer, especialmente nos dias atuais. Mas, cultivar continua exigindo o mesmo de sempre: mão na massa, conhecer e se envolver com a terra e implementar práticas – novas, inclusive – em prol de bons frutos. Portanto, praticar a esmo não basta: é preciso conhecer filho e o que o influencia quando as condições são diferentes do que conhecemos.
A experiência dos cultivos de outrora são hojevestígios de um caminho traçado em outro contexto e que, por isso, não atendem totalmente às novas necessidades de hoje. Conviver com o adolescente de hoje – felizmente a quem enxerga oportunidade de crescer junto ou não, a quem vive sob o jugo da obrigação em si de formar outro ser – exige esforço e, sim, coragem para desbravar terrenos inóspitos.
Dar bom fruto ao mundo hoje requer pais presentes e dispostos a aprender sobre a fase e também sobre o filho. Não para defini-lo ou controlá-lo, mas para se relacionar com ele e ajudá-lo a se tornar fruto que a sociedade precisa para também ser melhor.
Pais agricultores que somos – ou deveríamos ser – precisamos abrir novos caminhos para, senão assegurar o resultado desejado, mitigar riscos de insucesso da safra. E para tanto precisamos nos capacitar continuamente. Dar bom fruto é resultado perseguido por quem é comprometido com qualidade. Assim também devemos ser pais de adolescente: perseverantes e comprometidos com a missão de formar adultos saudáveis ao mundo, não importam as condições.
Estamos desbravando caminhos desconhecidos. Talvez por isso sejamos pais e adolescentes muitas vezes injustamente criticados. Afinal, o caminho está sendo trilhado diferente em um mundo totalmente transformado e que nos faz errar mais do que antes.
Mas não nos abatamos; sigamos comprometidos! Sejamos bons agricultores: aqueles que acreditam, persistem, aprendem e, sobretudo, se empenham em aprender em vez de rechaçar as mudanças se aperfeiçoando junto com o filho adolescente. O mundo de hoje nos exige mais. A nós, pais de adolescentes, é delegada a missão de dar bons frutos. Para tanto, precisamos nos aprimorar continuamente. A semente dada continua boa; a diferença está no cultivo, tarefa sempre desafiadora, mas que, nas mãos do agricultor competente, cresce e multiplica.
Xila Damian é escritora, palestrante e criadora do blog "Minha Mãe é um Saco!".
A festa da direita brasileira com a vitória de Trump: o que esperar a partir do resultado nos EUA
Trump volta à Casa Branca
Com Musk na “eficiência governamental”: os nomes que devem compor o novo secretariado de Trump
“Media Matters”: a última tentativa de censura contra conservadores antes da vitória de Trump