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Se você é pai ou mãe de uma criança em idade escolar, já sentiu (ou sentirá) o coração estremecer quando a escola entra em contato para esclarecer sobre alguma situação cotidiana atípica em que o seu filho se envolveu. Ouvir o que ele tem a dizer sobre os fatos é importante. Mas cuidar como tratar a situação diante dele é essencial.
A partir disso, podemos relembrar que, em fevereiro de 2024, foi noticiado na mídia nacional que jovens dos Estados Unidos levavam seus pais para entrevistas de empregos por sentirem-se inseguros, conforme uma pesquisa realizada naquele país pela consultoria educacional norte-americana Intelligent. Da mesma forma, alguns sites de notícias do Brasil também informaram, em 2023, sobre o fato de que professores universitários têm recebido os pais dos estudantes para esclarecimentos a respeito de notas e trabalhos.
A ideia deste artigo não é apontar atitudes certas ou equivocadas, mas fazer uma reflexão e tentar entender as causas deste que pode ser visto como um retrocesso no desenvolvimento natural do ser humano no sentido da conquista da sua independência, e como a escola regular pode ajudar essas famílias neste caminho, que é educar.
Se pudéssemos elencar o primeiro ponto que pode contribuir no amadurecimento das crianças (mesmo as bem pequenas) e adolescentes, seria observar que a intervenção desmedida de alguns pais, preocupados em impedir todo e qualquer sofrimento, pode gerar uma sensação de que eles não são competentes o suficiente para resolver seus ruídos na escola ou em qualquer outro convívio social. Posso afirmar que, absolutamente, isso não é verdade. Em muitas situações, confiar em uma conversa da coordenação, professora e alunos envolvidos em dissabores cotidianos pode ensiná-los a fazer acordos, estabelecer limites e provocar uma sensação de independência que os ensinarão a resolver os conflitos no futuro.
Reagir com parcimônia quando a criança chega com uma reclamação em casa após a aula, é fundamental. Questionar sobre o enredo das situações a ensinará sobre resolução de conflitos, como, por exemplo: "Você buscou ajuda de um adulto? Como ele conduziu?". Caso a resposta seja de que houve uma conversa, individual ou coletiva com os envolvidos, é fundamental que, se o adulto perceber que o assunto foi resolvido, finalize com uma palavra positiva, como: "Que bom que vocês conversaram; desentendimentos acontecem; agora siga em frente".
A escola é uma instituição especializada em crianças e adolescentes, e a confiança dos pais é o único caminho possível para a construção de relações saudáveis. Não há na vida atitudes ou escolhas que tomamos que podem nos eximir dos problemas. A questão que se coloca é como vamos lidar com eles, o que tornará a jornada mais ou menos significativa. Os pais precisam tomar consciência de que são a maior referência para seus filhos e isso pode ter um impacto positivo ou não em suas vidas. Mostrar o quanto são capazes de enfrentar sozinhos as peculiaridades do cotidiano não significa negligência.
É claro que situações mais densas serão resolvidas por adultos, mas a intenção é propor uma reflexão no sentido de se manter vigilante e aprender a colocar as situações em prateleiras: escolher entre o que pode ser resolvido apenas pela criança, ou quais circunstâncias a escola intervirá, e ainda quando é necessário que o responsável esteja presente. Outro ponto a ser observado é quanto à exposição destas crianças. Colocar informações em grupos de pais, nos aplicativos de conversas, situações particulares, como notas de disciplinas ou desentendimentos, podem colocá-las numa situação sensível no grupo da escola.
A verdade é que não existe receita exata, mas escolhas feitas com critério podem refletir na construção de um ser humano mais autônomo. Conversar sobre todas as coisas é certamente um caminho de êxito. Estabelecer, por exemplo, um período do dia, de preferência sem celulares por perto, para olhar nos olhos e contar sobre as situações, parece uma ação simples. Mas isso poderá construir uma aliança de respeito mútuo e segurança que contribuirá mais do que qualquer bem material que os pais ou responsáveis possam dar ao seu filho, seja ele de dois ou vinte anos.
Carolina Paschoal, pedagoga e diretora da Escola Pedro Apóstolo.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos