Em Israel há eleições periódicas para os cargos de representação política; o regime parlamentarista leva a coalizões partidárias para alcançar maioria do Parlamento e, com isso, nomear o chefe de governo, o primeiro-ministro. Tudo parecido com o Reino Unido, Japão, Canadá, não fosse pelas contestações à própria existência de Israel. Ali não há placitude que faça da eleição época tépida, quase tediosa. Qualquer palavra mal posta pode incendiar o Oriente Médio e chamuscar o mundo.
Nesse contexto turbulento, no qual as baionetas servem para tudo – menos para se sentar sobre elas –, deve ser analisada a afirmação do então candidato Benjamin Netanyahu de que, enquanto ele governar, os palestinos não constituirão Estado. Se bravata eleitoral para obter votos na extrema-direita, o preço da vitória no pleito tende a ser alto demais. Se for efetivamente o pensamento do agora governante, é desastre na difícil trilha da pacificação.
Povos do leste da Europa se acostumaram às trocas de Estado: reino da Polônia, Império Austro-Húngaro, Romênia, União Soviética, Ucrânia, Rússia. A identidade cultural permanece estável enquanto a identidade política muda conforme a estação do ano, a exemplo da população da Crimeia. O laço étnico-territorial vale mais que a cidadania porque a política oscila tanto que não propicia liame suficiente entre as pessoas para se verem como membros da mesma sociedade política. Assim, a alteração do Estado causa ranhuras leves na derme psíquica.
A criação do Estado de Israel, em 1947/48, não foi só troca de dirigentes políticos; mexeu-se no vínculo entre a identidade palestina e o território
Na região que fica entre o Sinai e as colinas de Golan houve superposição, exclusão, inclusão, eliminação, submissão de povos ao longo de agitada história. As doses de sofrimento geraram acumulação de rancores figadais que ainda aparecem na vida cotidiana e nas decisões políticas. Mudanças na relação entre etnias e território são muito mais abrasivas do que as modificações da superestrutura estatal.
A criação do Estado de Israel, em 1947/48, não foi só troca de dirigentes políticos; mexeu-se no vínculo entre a identidade palestina e o território. Realpolitik, mas nem por isso se deve olvidar a tristeza, as mágoas que não cicatrizam, porque a legitimidade do poder político tem componente subjetivo, emocional, que pode gerar apoios ou rejeições irracionais.
É verdade que Netanyahu desdisse o que disse e depois disse que não havia dito o desdito e o dito ficou por dito, ma non troppo detto. Coisas da política, em qualquer país. Contudo, o problema está flutuando no ar e a resposta ainda não se materializou em nenhuma ideia ou ação que possa dar curso ao mapa da paz mínima, com os dois Estados lindeiros em convivência não belicosa.
Obama manifestou contrariedade à posição de Netanyahu. Quem sabe Maduro e Benjamin Netanyahu se aliem para denunciar conspiração norte-americana contra seus governos. Tom jocoso à parte, a amputação territorial da Palestina precisa receber a prótese da soberania política para mitigar as dores do membro “fantasma”.
As condições postas pela ONU para o reconhecimento do Estado de Israel são irredutíveis porque a sociedade internacional não deve admitir uma diáspora moderna para remediar a diáspora remota.
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