O trabalho de conscientização para reduzir a violência contra meninas e mulheres começa em casa| Foto: Marcelo Casal Jr./Agência Brasil
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É comum afirmar que, ao cuidarmos de nossas crianças, estamos cuidando do futuro. No entanto, gostaria de levantar uma reflexão: como adultos responsáveis, estamos realmente protegendo as futuras gerações da violência, incluindo a contra as mulheres? Levanto esse questionamento diante dos números do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024, que retrata os casos de violência ocorridos do ano de 2022 para 2023. Nesse período, houve um crescimento de 30% nos registros criminais não letais – como abandono de incapaz, abandono material, maus-tratos, lesão corporal, pornografia infanto-juvenil, exploração sexual infantil e estupro –, contra crianças e adolescentes. Segundo o levantamento, a maioria das violências foram perpetradas por aqueles que têm o dever primário de cuidar, sustentar e educar as próprias famílias.

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É um cenário que atinge meninos e meninas, mas em alguns casos as meninas são muito mais vulneráveis. Hoje, a cada hora, o Brasil registra sete estupros de crianças e adolescentes. A maior vítima de estupro não é a mulher, mas a menina. Outro levantamento divulgado pela ONU Mulheres em novembro apontou que a cada 10 minutos uma mulher ou menina é morta no mundo, isso dá um total de 144 mulheres e meninas mortas todos os dias. Em 2023, 85 mil mulheres e meninas foram mortas intencionalmente e 63% destes homicídios foram cometidos por seu parceiro íntimo ou por um membro da família. Além de políticas públicas de enfrentamento contra esta violência, que são tão necessárias, dispomos de outras ferramentas para amenizar esses números: conscientização e educação.

Tanto a escola como a família precisam se constituir como espaços de predição, prevenção e proteção integral, de confiança e trocas de experiência

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O período de férias escolares é uma oportunidade para as crianças se relacionarem com os familiares, colegas, vizinhos e amigos, possibilitando novas experiências de aprendizagem. Para as meninas, é um momento especial para conscientizá-las sobre os seus direitos assegurados por lei, esclarecer quando uma atitude é errada, explicitar os diferentes tipos de violência, seus impactos e as formas de identificá-las. A educação consciente pode transformar vidas e criar sociedades mais justas e seguras.

A educação é uma ferramenta de empoderamento, pois favorece que crianças e adolescentes se reconheçam como sujeitos de direitos, saibam reivindicá-los e ao mesmo tempo tornam-se menos vulneráveis à violência e, futuramente, cidadãos mais críticos e engajados. Além disso, a educação, quando incentiva atitudes de respeito, empatia e não violência, promove mudanças de comportamento. Ao ensinarmos sobre os benefícios da cooperação e as consequências da violação de direitos, as crianças passam a ser mais protagonistas e conscientes na construção e manutenção de relacionamentos saudáveis.

Em se tratando da violência contra as meninas, é fundamental pensar nos “papéis sociais de gênero”, pois muitas vezes no âmbito da família e da escola se pode reproduzir violências físicas, simbólicas, psicológicas e até mesmo sexuais contra a figura feminina pelo simples fato de terem sido transmitidas de geração em geração, uma espécie de naturalização das atitudes erradas, que violam direitos. As instituições escola e família, como responsáveis em criar condições de futuro para as novas gerações precisam interromper esse ciclo de violência, buscando contribuir para uma sociedade com equidade de gênero e formando cidadãos mais humanos e empáticos.

Tanto a escola como a família precisam se constituir como espaços de predição, prevenção e proteção integral, de confiança e trocas de experiência. O primeiro passo é estabelecer uma comunicação aberta entre pais, filhos e outros membros da família, criando um ambiente mais saudável e seguro para as crianças e adolescentes. Com isso, os laços familiares se fortalecem. Vivendo em uma ambiência acolhedora e transparente, as crianças se tornam mais conscientes do papel que podem desempenhar na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Além disso, reforçar que ao se sentirem incomodadas existem meios de pedir ajuda que vão além da família, como os serviços de denúncia de maus-tratos a crianças e adolescentes ou violência doméstica e familiar. O trabalho de conscientização para reduzir a desigualdade de gênero e a violência contra meninas e mulheres começa em casa. Vamos fazer a nossa parte para uma sociedade melhor.

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Paulo Soares é coordenador do Comitê de Proteção Integral às Crianças e Adolescentes do Marista Brasil.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]