Só há uma coisa que me deixa surpreso em todas as polêmicas criadas em torno de declarações da ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves: a desonestidade intelectual e a pobreza de análise de jornalistas e escritores, especialmente no caso do vídeo não oficial que retrata palavras retiradas de contexto (“meninos vestem azul e meninas vestem rosa”). Para ser honesto e responsável, ao afirmar algo sobre o posicionamento da ministra são três os pontos principais que devem ser devidamente analisados: sua carreira como assessora política, seus discursos oficiais e seu posicionamento real demonstrado através de expedição de instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos.
Primeiro ponto: não há nada que possa ser considerado preconceituoso na carreira dela como assessora; ter conceitos contrários a certas ideologias não configura preconceito. Segundo: no primeiro discurso oficial, na entrevista à Globonews e no encontro que teve com Toni Reis, grande defensor dos direitos LGBTI, houve respeito, diálogo e certeza de que direitos conquistados não serão discutidos. Terceiro: Damares defende a luta contra a pedofilia, o feminicídio e em favor da igualdade salarial (tema sobre o qual Bolsonaro foi reticente, mostrando que ela vai ao contrário do pensamento do presidente). Neste pouco mais de um mês de ministério nada há em leis ou decretos que mostrem uma postura preconceituosa.
Não há nada que possa ser considerado preconceituoso na carreira dela como assessora
Até Aguinaldo Silva , grande dramaturgo, saiu em defesa de Damares, e por uma razão simples: não há nada factual que mostre ser a ministra leiga ou intransigente. A causa é contra a “ideologia de gênero” (assim a direita denomina os trabalhos de vários teóricos) que nasce com Judith Butler, e contra a revolução sexual que nasceu com Foucault e Kinsey. Não sejamos leigos nem tolos. Muitos entendem tais autores como importantes nas mudanças sociais de fins de século 20 e começo de século 21, pois ofereceram todo um arcabouço teórico nas redefinições de gênero que viriam a ser feitas, mas outros os analisam de forma extremamente negativa, como fazem o escritor Jordan Peterson (de Doze regras para a vida) e o escritor e jornalista argentino Augustin Laje, autor de El libro negro de la nueva izquierda. Não consideremos alguém apto ou não a um cargo baseados em seu norte ideológico, e sim na sua capacidade de respeitar a pluralidade e a diversidade, na competência técnica para o cargo e na honestidade.
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É compreensível que diferentes grupos que tiveram sua voz ouvida e sua causa acolhida durante os governos anteriores estejam apreensivos com os novos rumos da nação. A oposição deve agora atuar para garantir que não haverá extremismos nem falta de diálogo apropriado entre o governo e grupos de representatividade minoritária. A palavra que cabe para oposição não é resistência, mas entendimento e diálogo, elementos que se forem de fato ausentes, tanto em apoiadores como em opositores do governo, resultarão em ineficiência do mesmo. A oposição deve estabelecer um dialogo sóbrio, fugindo de superficialidades e buscando coibir excessos de militantes mais aguerridos.