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Quando a pandemia de Covid-19 começou, em 2020, falou-se muito sobre o pós-pandemia e os possíveis cenários decorrentes dela. Mais de dois anos depois, a pandemia ainda não acabou, mas já é possível ter um vislumbre de seus inúmeros reflexos na vida cotidiana, inclusive no sistema educacional e na educação em geral. Os impactos são muitos e profundos. No entanto, o legado deixado por esse período não é apenas negativo, visto que as necessidades trazidas pela pandemia têm contribuído para acelerar as transformações necessárias à educação.
Muitas pesquisas realizadas sobre a relação entre o período pandêmico e o ensino apontam que é necessário agir para minimizar os efeitos negativos identificados na área. O relatório do Banco Mundial, por exemplo, afirma que, mesmo em países desenvolvidos, há uma redução de meio ano escolar na aprendizagem, sinalizando que a desigualdade do aprendizado deve aumentar.
Resultados semelhantes estão nos estudos de Fernando Reimers, diretor na Faculdade de Educação da Universidade de Harvard. Eles reforçam que muitos estudantes não aprenderam bem no ensino remoto e que muitos sequer voltarão à escola.
A história nos revela que mudanças abruptas não funcionam no caso da educação – e temos consciência de que essas transformações são lentas.
No Brasil, o Instituto Casagrande realizou uma pesquisa com 10 mil participantes de várias regiões do país. O levantamento indicou que, com o ensino remoto, crianças e jovens aprenderam menos que 30% do esperado. Isso significa que os educadores têm um grande desafio no pós-pandemia que, finalmente, parece estar no horizonte: muita aprendizagem a ser recomposta nos próximos anos.
Por outro lado, vale ressaltar que, apesar de todos os problemas gerados, a pandemia colaborou com a quebra de paradigmas e resistências que impediam ou retardavam os processos de transformação da escola. A história nos revela que mudanças abruptas não funcionam no caso da educação – e temos consciência de que essas transformações são lentas. Mas no sistema no qual estamos envolvidos, essas transformações eram mais lentas que o aceitável.
Enquanto a sociedade já caminhava a passos largos para uma grande metamorfose, em especial na esfera digital, a escola insistia em permanecer no modelo analógico, afastando-se cada vez mais dos alunos, das famílias e da realidade fora de seus muros.
Hoje, felizmente, os docentes já percebem melhor as contribuições fantásticas das tecnologias educacionais, entendendo como essas ferramentas podem auxiliar o processo de aprendizagem dos estudantes e facilitar as rotinas pedagógicas.
Com a participação do renomado educador português Antonio Nóvoa, a Unesco está preparando um relatório sobre o futuro da educação. O documento afirma que, em razão de alterações demográficas, tecnológicas e no mundo do trabalho no século XXI – que são muito diferentes daquelas do século XX – haverá mais transformações educacionais nas próximas décadas do que houve nos últimos 200 anos, e que a educação do futuro não ocorrerá apenas no interior da escola-tempo, fechada dentro de seus muros. Ela se dará em lugares diferentes e de modos muito diversos.
O relatório também menciona que a escola continua a ter um importante lugar no processo educacional e na estruturação social, apesar das previsões de muitos, que vão sendo dissipadas, de um futuro negativo para a instituição, sob afirmações de que ela dificilmente teria espaço na sociedade digital.
Para a Unesco, pelo contrário, é preciso proteger e renovar as escolas. Essa transformação deve ocorrer no seu interior, com maior abertura no trabalho dos professores, ainda muito individualizado. Para a nova educação, na nova escola, é preciso que os professores trabalhem em conjunto, com modelos que ultrapassem suas disciplinas, suas turmas e as paredes da escola, em novos espaços que garantam a aprendizagem efetiva por parte dos alunos.
O educador Piaget ensinou que “o principal objetivo da educação é criar pessoas capazes de fazer coisas novas e não simplesmente repetir o que outras gerações fizeram”. Sendo assim, o momento é de reflexão sobre novas formas de ensinar e aprender e, acima de tudo, um tempo de ação e de construção de novas rotas para a educação.
Artigo de opinião de Renato Casagrande discute os efeitos negativos e persistentes da pandemia na educação. Leia na Gazeta do Povo. Renato Casagrande, educador, conferencista, escritor e pesquisador em Educação e em Gestão e Liderança, é fundador e presidente do Instituto Casagrande, organizador do III Congresso Internacional Um Novo Tempo na Educação.