A pré-campanha eleitoral está nas ruas. E as pesquisas, ferramentas que tentam antecipar as tendências do eleitorado e os prováveis eleitos, são a manchete do momento. A escolha dos governantes, não obstante o caráter pessoal e secreto do voto, não é, no processo de formação da opinião, um ato solitário. A opinião dos cidadãos se forma num ambiente de diálogo e interação. As pesquisas contribuem para o estabelecimento do grande debate cívico. Elas representam, portanto, uma manifestação concreta do direito à informação. Além disso, democratizam o noticiário. O processo eleitoral na Velha República não era distorcido apenas pela corrupção e pela fraude. A maior manipulação decorria da falta de acesso à informação. A livre circulação da notícia é capaz, por exemplo, de minimizar os efeitos manipuladores do poder econômico. O acesso à informação contribui, e muito, para o amadurecimento do eleitorado. Por isso, as pesquisas têm contribuído para o fortalecimento das democracias.
Mas a importância das pesquisas não elimina a necessidade do seu aprimoramento, sobretudo no que diz respeito à sua divulgação pela mídia. De fato, os problemas não costumam estar nas pesquisas (os institutos brasileiros de pesquisa têm uma tradição de seriedade e profissionalismo), mas na maneira como são interpretadas e divulgadas. Recente pesquisa feita para a Confederação Nacional da Indústria pelo Ibope foi destacada por manchetes equivocadas. "Lula aumenta vantagem sobre Alckmin, indica pesquisa Ibope". "Lula tem o dobro dos votos de Alckmin". Ora, caro leitor, quando a pesquisa foi feita a candidatura Alckmin sequer tinha sido homologada pelo PSDB. As manchetes, involuntariamente, induziam o leitor ao erro. Já a pesquisa do Datafolha, posterior ao lançamento formal da candidatura do governador de São Paulo, mostrava um quadro bem diferente. Lula permanecia estável, mas Alckmin subira seis pontos. Culpa dos institutos? Não. Interpretação precipitada da imprensa, sim.
É um equívoco reduzir a cobertura política a uma mera reprodução dos índices fornecidos pelos institutos de pesquisa. Trata-se, certamente, de uma postura informativa que brota de uma reta intenção: transmitir um quadro isento do momento eleitoral. Tal decisão, no entanto, tem o seu reverso negativo e exige, talvez, uma mudança de orientação. O simples registro das pesquisas pode apresentar um quadro superficial da realidade. Ocultam-se, por exemplo, aspectos relevantes do perfil dos candidatos, seu passado político, as forças que o sustentam, suas idéias, a consistência de suas propostas.
Outra distorção, grave e recorrente, ameaça a qualidade da cobertura eleitoral: a passividade da imprensa diante da força do marketing político. Vende-se, freqüentemente, um produto fraco, mas embalado num pacote atraente. Mata-se a política e cria-se o espetáculo. O candidato passa a ser valorizado não pelos seus méritos intrínsecos, mas pela sua performance nas pesquisas. Novas sondagens realimentam o clima do show eleitoral. Tem faltado à imprensa capacidade de criar sistemas e metodologias de trabalho que lhe permita sair da superfície e dos apelos do marketing e aprofundar, efetivamente, na discussão das idéias. Trata-se, estou certo, de papel irrenunciável do jornalismo de qualidade. Os jornais não podem ser simples transmissores, mas, também, contraponto, um espaço para uma reflexão mais séria.
Foco no cidadão. Eis a melhor receita. É importante não perder a perspectiva de que os sujeitos de todo o processo eleitoral são as pessoas. No cerne dos institutos que pesquisam, do público que é pesquisado, das empresas que processam e divulgam a informação, dos leitores que recebem os dados e dos candidatos e partidos políticos que apresentam seus programas e plataformas estão pessoas individuais. Não se pode despersonalizar o processo eleitoral, sob pena de se eliminar a responsabilidade. Não são entes jurídicos, mais ou menos abstratos, que respondem pelo andamento das eleições. São pessoas concretas. Com nome e sobrenome. Dessa realidade encarnada na pessoa deriva a estabilidade e a segurança do processo eleitoral.
Carlos Alberto Di Franco é diretor do Master em Jornalismo, professor de Ética e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra e diretor da Di Franco Consultoria em Estratégia de Mídia.
E-mail: difranco@ceu.org.br
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