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Planos de saúde: quanto custa quebrar as regras?

No melhor dos mundos, o brasileiro teria acesso à saúde pública de qualidade e, por vontade própria, recorreria ao setor privado como alternativa diferencial de conforto, um serviço complementar. Mas a população tem essa escolha atualmente? Ao usar de sofismas, alguns propagam que os beneficiários de planos de saúde pagam por algo com que não podem contar quando precisam. Se assim fosse, as ruas estariam repletas de doentes, um vai e vem de enfermos entregues à própria sorte. Mas isso não se vê nem nos filmes.

Na vida real, os 50 milhões de pessoas que hoje têm planos médicos não querem prescindir dessa proteção, porque sabem que poderão contar com assistência sem ter de aguardar meses na fila. Não por acaso, por determinação da agência reguladora, as operadoras são obrigadas a constituir reservas financeiras que assegurem o atendimento em caso de insolvência. O erro, no entanto, é acreditar que a saúde suplementar é um sistema infinito de acumulação de recursos, uma poupança pessoal para o futuro. Sem entender a lógica que torna os planos e seguros de saúde viáveis – dentro da qual um cidadão financia o tratamento médico do outro –, a sociedade continuará a demonstrar insatisfação e usar mal esse serviço.

Assim como outros tipos de seguros e diferentemente da previdência privada, o plano de saúde tem como fundamentos o mutualismo e a repartição simples de contribuições, para o caso do pagamento de indenizações. Desta forma, nenhum componente de capitalização é adicionado aos recursos que são correntemente arrecadados na forma de mensalidades. No entanto, o impacto e a repercussão social que o setor produz geram interpretações como as que levam a acreditar que qualquer reivindicação deve ser atendida, a despeito de que possa prejudicar a coletividade – isto é, os demais contribuintes da carteira – e a viabilidade econômica do sistema.

Muito citado em decisões judiciais na área da saúde – embora imperfeito principalmente em face da complexidade e imprevisibilidade dos serviços prestados nesse segmento –, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) brasileiro determina que o cidadão não é obrigado a pagar por nada além do que consome. Mas, utilizando-se o mesmo princípio, deveria ele obter algo que custa além do previsto para o que paga? É justamente essa distorção interpretativa que faz crescer a onda de protestos e a fila da judicialização.

Imagine o consumidor pagar por um serviço, obviamente de qualidade, estabelecendo suas escolhas em entendimento comercial selado pela transparência contratual, mas obter na Justiça a concessão de levar algo que não foi acordado. Qual estabelecimento sobreviveria? É justamente o que ocorre com a saúde suplementar quando, por meio de liminares, alguns afortunados cidadãos obtêm vantagens não previstas em contrato. Há de se admitir que várias queixas sejam motivadas por falhas de prestadores de serviços – e estes devem ser punidos, até para que não comprometam a imagem daqueles que buscam prestar o atendimento correto. Mas inegavelmente, e falemos sem rodeios, há um bom número de litígios gerados por distorções consumeristas.

Um sistema econômico viável e duradouro não pode ficar sujeito ao improviso, em nenhuma esfera da sociedade. Se assim o for, famílias, empresas e países podem falir. A saúde suplementar é economicamente importante e promissora, mas não invencível. Se perdurarem a cultura de quebra de contratos e a falta de revisão das políticas e da regulação do segmento, é possível que um dia, finalmente, não restem ao brasileiro alternativas ao padrão público de atendimento. Cabe questionar se essa é realmente a vontade da maioria.

Marcio Serôa de Araujo Coriolano é presidente da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde). Sandro Leal Alves é gerente-geral da FenaSaúde.

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