Por mais que alguns dos principais problemas do Brasil sejam de conhecimento global, o brasileiro sempre foi conhecido pela cordialidade e receptividade aos estrangeiros. Nas redes sociais, espaço em que praticamente dominamos a internet, há alguns anos a frase “come to Brazil” se tornou habitual. É essa a mensagem frequentemente deixada por brasileiros nas redes sociais de diversos artistas e celebridades estrangeiras, pedindo-lhes que venham ao Brasil. Os internautas estrangeiros, percebendo sua constância, transformaram nosso hospitaleiro convite em meme. Logo, nas redes, passaram a circular vídeos e memes de pessoas que são abduzidas e trazidas à força ao país. Analisando o atual cenário político-social brasileiro, podemos nos indagar: será que estamos fazendo nossa parte para que de fato as pessoas queiram vir ao Brasil? Que imagem temos projetado?
Apesar de diversos problemas serem antigos, como a insegurança e a corrupção, o Brasil sempre causou curiosidade e entusiasmo. Na imprensa internacional, as imagens do carnaval do Rio, da rica biodiversidade na Amazônia e das Cataratas do Iguaçu têm sido ofuscadas por notícias que ajudam a desconstruir a nossa imagem de um tolerante país paradisíaco. Em 6 de julho de 2019, quando questionado sobre os incêndios na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro respondeu: “O Brasil é a virgem que todo tarado de fora quer”. Em agosto do mesmo ano, os alertas de desmatamento na Amazônia haviam sido 120% maiores do que no mesmo período do ano anterior e explicavam as grandes queimadas que se tornaram motivos de protestos nos Estados Unidos e em diversos países da Europa. Segundo o Instituto de Pesquisas da Amazônia (Ipam), os dez municípios com maiores somas de queimadas também foram os mais desmatados. O governo de Bolsonaro foi responsável por afrouxar o combate ao desmatamento, cortar o orçamento destinado à preservação, reduzir a fiscalização e ainda demitir autoridades como Ricardo Galvão, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), por divulgar dados que comprovavam a relação direta entre o desmatamento e as queimadas.
Será que estamos fazendo nossa parte para que de fato as pessoas queiram vir ao Brasil? Que imagem temos projetado?
Como se não bastasse a imagem de negacionistas climáticos, após o início da pandemia de Covid-19 voltamos a estampar negativamente manchetes mundo afora. Dessa vez, devido às declarações polêmicas do presidente da República defendendo o uso de tratamentos ineficazes contra a doença, discursos minimizando a letalidade do vírus e menosprezando o valor da vida humana. É claro que tudo isso foi corroborado pelo ex-ministro de Relações Exteriores Ernesto Araújo, cujo trabalho resumia-se a espalhar fake news, criticar o tal “globalismo” e dizer que o nazismo e o fascismo são ideologias de esquerda. As principais funções de um corpo diplomático podem se resumir a dois itens: promover nosso país e defender nossos interesses. Não é um exagero afirmar que, nos últimos anos, nada disso tem sido feito.
Dias atrás tivemos o assassinato do imigrante congolês Moïse Mugenyi Kabagambe, 24 anos, no Rio de Janeiro. A comunidade congolesa e a família de Moïse compartilharam uma carta afirmando que o jovem foi vítima do racismo estrutural e da xenofobia do Brasil. O caso ganhou repercussão na imprensa internacional, sendo divulgado por meios como BBC, Washington Post, Al Jazeera e Reuters.
Volto a fazer as mesmas perguntas que fiz no começo deste artigo: Será que estamos fazendo nossa parte para que de fato as pessoas queiram vir ao Brasil? Que imagem temos projetado? A resposta é não. Seja a própria população cometendo crimes hediondos, ou simplesmente sendo conivente com atitudes nefastas de nossos representantes, definitivamente não, pois isso diz muito sobre como somos enquanto povo. Vamos fazer nossa parte e depois, mais adiante, poderemos voltar a convidar nossos amigos estrangeiros para que venham ao Brasil.
Uriã Fancelli é graduado em Relações Internacionais com mestrado duplo em European Studies and Culture pela Universidade de Groningen (Países Baixos) e pela Universidade de Estrasburgo (França), e autor de “Populismo e Negacionismo”.
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