O que provavelmente será debatido no Congresso Nacional neste ano é uma repetição do que se tentou aprovar em 2005
A recente trajetória (re)democrática brasileira nos mostra que o primeiro semestre legislativo de presidentes recém-empossados é prolífico em reformas. Vide os governos Fernando Henrique Cardoso em 1995 e Lula em 2003.
Em seu discurso de posse, Dilma Rousseff considerou que a reforma política é "tarefa indeclinável e urgente". Falou pelo Executivo. Uma pesquisa recente do Instituto FSB ouviu 340 deputados federais e senadores da Legislatura 2011-2015. E descobriu que 65% deles têm a reforma política como uma de suas duas prioridades no 1.º semestre do ano. As outras mais citadas foram a reforma tributária (50%) e o código florestal (11%). Falaram pelo Legislativo.
O reconhecimento, pelos políticos, de que é preciso aperfeiçoar as regras do jogo tem sido estimulado por profundas mudanças no ambiente sociopolítico do país: graves denúncias da imprensa, crises de imagem de diferentes partidos, líderes políticos abatidos no topo de suas carreiras, pressão da opinião pública e da sociedade civil organizada e decisões do Judiciário.
Mas qual reforma política será proposta? E quais as chances de sua aprovação no Congresso? Mais importante: quais os possíveis efeitos dessas mudanças?
A primeira pergunta é de mais fácil solução. O que provavelmente será debatido no Congresso Nacional neste ano é uma repetição do que se tentou aprovar em 2005, quando os temas eram: mudança do sistema proporcional de lista aberta para lista fechada, estabelecimento do financiamento público de campanhas, redução da cláusula de barreira e o estabelecimento de prazos mais rígidos para movimentação entre partidos, entre outros.
Até este momento, os sinais mais evidentes dos atores interessados na reforma política sugerem a existência de dois pontos focais: a mudança do sistema proporcional de lista aberta para lista fechada e o estabelecimento do financiamento exclusivamente público de campanhas eleitorais. Os eleitores deixariam de votar em candidatos e votariam em listas de candidatos ordenadas pelos partidos. E as doações de campanha de pessoas físicas e jurídicas seriam proibidas, passando a existir fundo público que seria distribuído aos partidos para o financiamento das campanhas.
A resposta à segunda questão é que, segundo os próprios dados da pesquisa FSB, são grandes as chances de mudança das regras, a ponto de introduzir alterações radicais no funcionamento do sistema político brasileiro.
Com isso, chegamos à terceira pergunta: essas mudanças são boas para o Brasil?
Os debates sobre as reformas institucionais têm enfatizado a necessidade de redução do espaço para corrupção política no Brasil. A Lei da Ficha Limpa é um exemplo. A criação de listas fechadas e financiamento público exclusivo das campanhas, contudo, não é garantia de redução da corrupção política. Não há país no mundo que tenha sistema similar e que possa nos mostrar os efeitos práticos dessa interação e suas reações adversas. Daríamos um salto no escuro.
Os resultados podem ser excelentes. Mas também podem criar cartéis partidários, nos quais alguns caciques políticos dominariam as chaves de acesso ao poder. E o "caixa dois" das campanhas não se combate com financiamento público, mas com maior fiscalização, clareza na legislação e punição.
O sistema político brasileiro precisa de aperfeiçoamentos, mas não de uma refundação. Medidas pontuais, simples e eficazes seriam: (1) a redução do teto para doações de empresas, o que diminuiria o peso de grandes corporações no financiamento eleitoral; (2) a criação de novas restrições à propaganda eleitoral, o que diminuiria os custos das campanhas eleitorais; e (3) a redução do número de candidatos de cada partido ou coligação ao Legislativo, o que diminuiria o total de gastos eleitorais e simplificaria o processo de escolha do eleitor e o monitoramento do representante eleito. É hora de mudar. Com segurança.
Lucio Rennó, cientista político, é professor da Universidade de Brasília (UnB) e co-organizador do livro Reforma Política: Lições da História Recente (2006). Wladimir Gramacho, cientista político, e sócio-diretor do Instituto FSB Pesquisa.