A postura de restrição monetária deve en­­ca­­re­­cer o custo do crédito para consumo e in­­ves­­timento, em um ambiente de fragilização do front externo

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Inquestionavelmente, a economia brasileira vive um estágio bastante favorável desde 2007, interrompido por dois trimestres recessivos (o último de 2008 e o primeiro de 2009), em razão dos impactos domésticos da crise internacional, e antecedido por dois momentos não menos relevantes, especialmente quando examinados pela ótica econômica e institucional.

O primeiro evento compreendeu o interregno 1994-1998, marcado pelo combate consistente à inflação, pela desmontagem dos mecanismos de indexação automática dos contratos e pela intensificação das privatizações. O segundo tempo coincidiu com o intervalo 1999-2006, caracterizado pelo ajuste das contas externas, por meio do funcionamento do câmbio flutuante e da acumulação de um colchão de reservas internacionais, e das finanças públicas, com a geração de superávits fiscais primários e a instituição da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

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Presentemente, ao registrar saldo em reservas internacionais no BC, no conceito de caixa, superior a US$ 250 bilhões, o Brasil figura na sétima posição no mundo, atrás da China (US$ 2,4 trilhões), Japão (US$ 1,04 trilhões), Rússia (US$ 447 bilhões), Índia (US$ 278 bilhões) e Hong Kong (US$ 260 bilhões).

Contudo, ainda é prematura a celebração, o aceite e a aposta definitiva no diagnóstico, reinante nos meios oficiais e adjacências, de ingresso do país em um novo círculo virtuoso. Isso porque é prudente reconhecer a redução do ímpeto de crescimento do PIB brasileiro, a partir do segundo trimestre de 2010, em face do aparecimento de alguns pontos adversos.

Dentre eles sobressai o imprevisível fator representado pela recaída contracionista europeia e os inevitáveis efeitos do retorno, no Brasil, da prática de austeridade fiscal, centrada na retirada do incentivo tributário do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a aquisição de veículos, móveis e materiais de construção (este último vigente até o fim de junho de 2010) e no corte orçamentário de mais de R$ 30 bilhões no primeiro semestre.

Há ainda a contenção monetária, materializada na elevação dos juros e dos recolhimentos compulsórios dos bancos, em nome do combate à inflação, projetada em pouco mais de 5% para o ano, pelo inquérito Focus do Banco Central (BC), enraizada na majoração dos preços internacionais e internos dos insumos e dos focos salariais determinados pela escassez do fator trabalho.

Na mesma balada, emerge a decisão tomada no mês de junho de 2010, pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), em manter a meta de inflação em 4,5% para o exercício de 2012, juntamente com a faixa de tolerância de dois pontos porcentuais, para cima e para baixo, que vigoram desde 2005. Isso para um padrão internacional de sistema de metas que oscila entre 2% e 3%, empregado por nações que praticam o mesmo regime.

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Tal raciocínio carrega o equivocado, ou ao menos ultrapassado, pressuposto de associação entre crescimento econômico e inflação e confirma o descaso, por parte do governo, com a chance de promoção de definitiva desinflação no aparelho econômico. Esta poderia acontecer pelo desmanche das expectativas inflacionárias dos agentes, em resposta ao estabelecimento de metas variação de preços menores, algo factível pela própria credibilidade conquistada pelo BC, durante a vigência do sistema a partir de 2009.

Aliás, a determinação de metas mais frouxas oportuniza a preservação de fortes componentes de indexação, ainda responsáveis pela propagação automática dos reajustes de preços pretéritos, caso dos itens administrados, das tarifas dos serviços públicos privatizados, dos planos e seguros de saúde, dos aluguéis, dentre outros preços.

A postura de restrição monetária deve encarecer o custo do crédito para consumo e investimento, em um ambiente de fragilização do front externo, evidenciada pela perda de embalo das exportações e pela ascensão das remessas e lucros e dividendos, e pela exaustão da capacidade de endividamento primário da população, materializada no incremento dos valores de crédito concedido que foi duas vezes maior que a variação da massa de salários (19,9% contra 9,9% nos últimos 12 meses encerrados em junho de 2010).

Os resultados ruins do setor externo podem ser atribuídos, respectivamente, ao câmbio valorizado e à considerável desnacionalização do sistema produtivo e financeiro do país, acontecida a partir da segunda metade dos anos 1990. As saídas líquidas de lucros e dividendos saltaram de US$ 3,3 bilhões em 2000 para US$ 33,8 bilhões em 2008, recuando para US$ 25,2 bilhões em 2009, em face dos efeitos da crise internacional.

Gilmar Mendes Lourenço, economista, é coordenador do Curso de Economia da FAE, Conselheiro do Corecon/PR e autor do livro Conjuntura Econômica: Modelo de Compreensão para Executivos.

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