Todo mundo já sabe ou ouviu falar da tal “curva de achatamento” e da necessidade de nos mantermos em nossos lares através do isolamento social. O que ainda não ficou claro é o que acontecerá se ao fim, com os resultados do achatamento da tal curva, surgirem novos focos da doença oriundos de áreas não identificadas ou vindos de outras países que possam crescer de maneira exponencial, como vemos atualmente acontecendo no Brasil. Vamos nos enfurnar em nossos lares de novo?
As únicas atenuantes que poderiam trazer algum alívio à tese de que devemos buscar de maneira ostensiva o achatamento desta curva é o entendimento de que aqueles que foram contaminados já não voltariam a ser, porque teriam desenvolvido anticorpos e imunidade à doença. A outra é a de que o governo estaria tentando ganhar tempo para construir hospitais e leitos de UTI, pois somos 210 milhões de pessoas e, como se trata de uma doença infectocontagiosa de rápido e fácil contágio, o Brasil precisaria de um sem-número de leitos e UTI que hoje não possui.
Cientistas de todo o mundo ainda não sabem dizer sobre a reincidência do vírus após uma primeira contaminação, mas já há casos de uma mulher no Japão que testou positivo uma segunda vez quase um mês após ter recebido alta do hospital por internação com o coronavírus. Também houve outro caso na Itália, onde um primeiro paciente, em Turim, testou positivo um mês depois de ser liberado do hospital com um resultado negativo para o vírus. Infecções reincidentes também foram relatadas na China, onde a doença se originou no fim de 2019. Pesquisadores da Universidade de Pequim descobriram duas diferentes cepas do vírus Sars-CoV-2, o que reforça a ideia de que o isolamento social horizontal poderia resultar simplesmente em uma estratégia inócua caso se confirme o ciclo contínuo da contaminação.
Mas dizer que a coisa pode ir e voltar não é o único problema. Temos uma questão ainda maior a ser abordada. No Brasil de hoje, 57% dos brasileiros pertencem à população economicamente ativa, ou seja, 119,7 milhões de pipoqueiros, manicures, profissionais liberais, comerciantes, servidores públicos, empresários, entre outros. Os demais 43% da população, 90,3 milhões, dependem exatamente da primeira metade, e em parte do governo.
Boa parte dos que trabalham, a exemplo dos autônomos do dia a dia, comem do que ganham diariamente. Já os profissionais liberais têm reserva financeira para pouco mais de duas semanas. As empresas que não são de grande porte possuem capital de giro, em média, para 27 dias. E então temos as grandes empresas, com capital para algo em torno de três meses. Finalmente, o Brasil tem os ultrarricos com poupança eterna, que compõem pouco mais de 1% da população.
A pergunta que não quer calar é: como se alimentaram nesses primeiros 15 dias de quarentena os nossos autônomos que vivem do dia a dia? Como será a vida daqui para a frente dos profissionais liberais que estão no limite de suas reservas? O que acontecerá com as pequenas e médias empresas nas próximas duas semanas, quando acabam tais recursos de capital de giro? Como o Brasil e os brasileiros vão comer para sobreviver, e manter seu sistema imunológico resistente ao coronavírus?
O governo lançou um pacote de R$ 750 bilhões para a população consumir o que o comércio e fábricas não poderão vender ou fabricar, ou porque estão fechados por determinação estatal, ou porque estão demitindo, o que denota a um deflator inflacionário muito importante. Muito dinheiro e pouco produto.
São muitas as perguntas, mas nenhuma maior do que a necessidade de entender a razão de estarmos aprisionados no isolamento horizontal, se tudo pode tornar-se uma pandemia crônica contínua, sub-rogada a uma política aparentemente equívoca de nossos mandatários enquanto nos tornamos followers deste nefasto reality show.
Em 2018, o país ficou apenas 11 dias parado com a greve dos caminhoneiros, o que nos levou a um módico crescimento de 1,1% do PIB brasileiro. Fazendo algumas projeções, cheguei a um PIB negativo para 2020 próximo a um intervalo entre -2,8% e -3,1% caso não tenhamos uma reabertura dos mercados nos próximos 30 dias.
Tudo isso nos levaria a transformar nosso país e nosso espectro macroeconômico em um cenário dramático de princípio de convulsão social, e que poderia resultar até em vandalismo, saques, fome, desemprego, depressão e até morte de dezenas de milhares de pessoas que representam a maioria absoluta da população brasileira que está fora do grupo de risco dessa pandemia. São milhões de brasileiros impedidos de trabalhar, que estão abaixo dos 74 anos – idade considerada na Itália o principal grupo afetado e que representou 95,4% dos casos, 88% deles com pelo menos uma doença pré-existente.
Não há melhor solução que aquela que seja aceitável, a da lógica soberana, em vez de heroísmos romanticistas e partidarismo político. A ideia adequada de quarentena e isolamento social deveria ser única e exclusivamente vertical, com concomitante processo de implantação de estratégias de isolamento da população de risco pelas famílias e pelo Estado. Iniciativas como construção de hospitais de campanha; antecipação de formandos das faculdades de Medicina; aumento das testagens e retestagens dos brasileiros; fabricação da cloroquina com azitromicina, ou da hidroxicloroquina, que já se provou 100% eficiente; instruir a nação sobre como cuidar de seus familiares; e tutelar a população de risco, idosa e carente, alocando-a em hotéis que hoje encontram-se fechados pela vacância absoluta, é o que se pretende de um Estado eficiente e eficaz. Vale mencionar que tais equipamentos seriam um imperioso legado para o Sistema Único de Saúde nos próximos anos.
Abraham Maslow, o psicólogo norte-americano conhecido pela Teoria da Hierarquia das Necessidades Humanas e criador da famosa Pirâmide de Maslow, estabeleceu como regra base e fundamental de sua pirâmide da fisiologia que sem comida, água, sono ou homeostase, o ser humano não tem condições básicas de sobrevivência. Concluímos, portanto, que ficar doente não deveria ser a primeira preocupação neste caso.
Alexandre Nigri, economista e administrador de empresas com especialização em Real Estate, é professor convidado do curso de Real Estate e Finance do IBMEC e CEO do Grupo Maxinvest e da MCP Realty.
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