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Em 2002, buscando alternância social, votei no candidato Luiz Inácio Lula da Silva. Ante a substituição do presidente Fernando Henrique Cardoso, mereci charge, de Paulo Caruso, na Revista Isto É, de 27 de maio de 2002. Nela, estou na porta de um restaurante, com a faixa presidencial no peito e vem chegando, com mala de viagem com etiquetas “Spain” e “Italy” o titular da Presidência. Tabuleta anunciando o cardápio “HOJE FRUTOS DO MAR – LULA”. O título “Avenida BRASIL”, subtítulo “em... INTERINIDADE INDIGESTA”. Nela foi lançada dedicatória, de próprio punho: “Ao amigo Ministro Marco Aurelio, com abraço do amigo Lula, 29/10/02”.
Renovei o voto na reeleição, em 2006.
Em julho de 2017, fechei o Seminário de Verão na Universidade de Coimbra e discorri sobre a tendência mundial de eleger candidato populista de direita. Falei sobre o perfil, mencionando Polônia, Hungria e Estados Unidos. Disse temer pelo Brasil – eleger presidente de República, nas eleições do ano seguinte, o deputado federal Jair Bolsonaro, que fizera a caminhada batendo em minorias. Página hoje virada, ante a mudança de postura, para o bem, no exercício da Presidência, persistindo os arroubos de retórica. É conferir os Anais da Universidade de Coimbra.
Como ex-juiz não posso subscrever o nome de quem, durante oito anos foi presidente da República e teve o perfil político manchado pelos célebres casos “MENSALÃO” e “LAVA JATO”
Nas eleições de 2018, votei no candidato Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores.
Nestas eleições, anunciei que votaria em quem estivesse, nos levantamentos, em terceiro lugar. O voto foi, no primeiro turno, em Ciro Gomes, candidato que tão bem conhece, como poucos, as entranhas brasileiras. A apuração desaguou na atualidade. Bolsonaro, na busca da reeleição, segundo colocado, e Lula em primeiro lugar, sem alcançar a maioria exigida constitucionalmente – metade mais um dos votos válidos.
Com pureza d’alma e tendo a coragem como síntese de todas as virtudes, norte de quarenta e dois anos em colegiado julgador, recorde que dificilmente será batido – iniciei o oficio de juiz em 1978, no Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, chegando, em 1981,ao Tribunal Superior do Trabalho, com idade mínima de trinta e cinco anos, e ao Supremo em 1990, sendo alcançado, em 2021, pela expulsória dos 75 anos, venho dizendo que, no segundo turno, próximo domingo, votarei no atual presidente.
Indaga-se, a razão da guinada. É simples, muito simples: como ex-juiz não posso subscrever o nome de quem, durante oito anos foi presidente da República e teve o perfil político manchado pelos célebres casos “MENSALÃO” e “LAVA JATO”. Que veio a ser condenado a substancial pena de reclusão, executada em parte. Dir-se á que o Supremo anulou os processos-crime. No julgamento fui, com outros colegas, voto vencido.
Nos bancos da Nacional de Direito, e acredito ter sido bom aluno, aprendi que incompetência relativa preclui, ao contrário da absoluta, exemplo a em razão da matéria. A territorial é, sabidamente, relativa. Foi sepultada com o término dos processos-crime relativos a delitos contra a Administração Pública – corrupção e lavagem de dinheiro. Mas o Supremo, na voz da sempre ilustrada maioria, bateu o martelo, vindo a ressuscitar, politicamente, o candidato Lula, gerando polarização que inviabilizou terceira via. O absolveu? A resposta é desenganadamente negativa.
Em habeas corpus, via instrumental afunilada, assentou, por maioria, a existência de direito líquido e certo de ser julgado pela Justiça Federal não do Estado do Paraná, mas da capital do país – Brasília. Deu o dito, pelo não dito, ficando em segundo plano a dinâmica e a organicidade do Direito. Em colegiado, órgão democrático por excelência, há somatório de forças técnicas e humanísticas distintas. Nisso,os integrantes complementam-se mutuamente.
Vence a maioria e proclamado, no Pleno, o resultado do julgamento, esgotada a fase dos embargos declaratórios, cabe a observância. O fato não afasta a consciência do eleitor na análise da vida dos candidatos. Eis as razões pelas quais, no domingo, 30 de outubro de 2022, embora aos 76 anos de idade o voto não seja obrigatório, cumprirei o direito-dever de eleger o representante maior, sufragando o nome do candidato Jair Messias Bolsonaro, que vem de obter expressiva vitória nas eleições para a Câmara dos Deputados e Senado da República, com vários ex-ministros eleitos, destacando-se a figura ímpar do vice-presidente Mourão, senador pelo brioso estado do Rio Grande do Sul.
O fato sinaliza o bom trabalho desenvolvido. Com a palavra os eleitores. O eleito há de ser diplomado, tomar posse e entrar em exercício, atento às mazelas nacionais que tanto nos envergonham. Que assim o seja, com avanço cultural, mediante a constante busca de dias melhores para a sofrida República retratada pelo Brasil.
Marco Aurélio Mello, Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) de 1990 a 2021, é presidente do Instituto UniCeub de Cidadania.