| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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O governo federal é autor de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) relacionada à uma nova política de combustíveis. A PEC em estudo autoriza ao chefe de governo federal (o presidente da República) e aos chefes de governo estaduais (os governadores) a reduzir – e mesmo zerar – os impostos que recaem sobre os combustíveis, tais como gasolina e diesel, por exemplo.

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Quando esta PEC chegar ao Congresso Nacional, encontrará em estágio avançado de tramitação o Projeto de Lei 1.472/2021, do senador Rogério Carvalho (PT-SE), com relatoria do senador Jean Paul Prates (PT-RN). O PL 1.472 já foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal em 7 de dezembro do ano passado e encontra-se pronta para ir ao Plenário da casa, aguardando apenas inclusão na ordem do dia. Vamos fazer uma análise de ambas as propostas com um pouco mais de detalhamento. Há aspectos similares entre elas.

A PEC autorizaria o presidente da República e os governadores a diminuir ou zerar os impostos incidentes sobre os combustíveis (diesel, gasolina e álcool), bem como da energia elétrica e gás de cozinha, sem a necessidade de indicar fontes alternativas de recursos. O governo também propusera, inicialmente, um Fundo de Estabilização para a gasolina, mas ele foi retirado do texto. Também a própria gasolina entrou no limbo, podendo haver uma redução provisória de tributos, mas ficou descartada uma eliminação completa dos impostos que recaem sobre esse combustível. Dessa forma, a PEC a ser enviada acabou por concentrar-se no preço do diesel, a fim de facilitar a aprovação da matéria.

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O governo federal teve de enviar a sua proposta no formato de PEC por estabelecer a eliminação de impostos sobre os combustíveis sem apresentar uma fonte alternativa de arrecadação, conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal. Uma PEC dispensaria a apresentação de fonte alternativa de recursos, pois a PEC se sobrepõe à LRF. Já o PL 1.472 propõe linhas gerais de uma nova política de preços sobre os combustíveis, aí incluídos o diesel, a gasolina e o gás liquefeito de petróleo (GLP). Além disso, propõe um Fundo de Estabilização dos preços de combustíveis e estabelece um imposto de exportação sobre o petróleo bruto. O PL 1.472 determina que os preços internos dos combustíveis passarão a ter como parâmetro não apenas as cotações praticadas no mercado internacional, mas também os custos internos de produção e os custos da importação.

O PL 1.472/2021 determina, ainda, alíquotas progressivas do Imposto de Exportação sobre o petróleo bruto a fim de financiar o Fundo de Estabilização, que teria como função maior evitar oscilações bruscas nos preços domésticos dos combustíveis. Nota-se que o PL 1.472 acabou se tornando mais abrangente que a PEC enviada pelo Planalto, em função da retirada de alguns itens que faziam parte originalmente da matéria por diferentes motivos. O Fundo de Estabilização foi retirado da proposta pelo tempo que levaria para sua constituição, pelos custos operacionais e pelos valores que ele envolveria, sem garantia de resultados. Ou seja, levaria muito tempo para o Fundo de Estabilização funcionar e mostrar a que veio. Já a gasolina foi retirada da proposta da PEC pelo impacto orçamentário previsto. Estudos do Ministério da Economia estimam que zerar os impostos federais incidentes sobre a gasolina, o diesel e o gás de cozinha levaria a uma renúncia tributária no valor de R$ 75 bilhões, sem apontar para uma fonte alternativa de arrecadação. Já a isenção dos impostos incidentes sobre o diesel acarretaria uma perda de arrecadação de apenas R$ 20 bilhões, mais administrável pelo governo federal.

Integrantes do Ministério da Economia sustentam que o diesel atinge mais a classe trabalhadora (pelos preços nas tarifas de ônibus) e tem um impacto inflacionário maior, por repercutir nos preços dos fretes realizados por via terrestre, que se baseiam fortemente no transporte rodoviário e no diesel. Já a gasolina teria um impacto maior sobre a classe média, que usa automóveis particulares. De qualquer forma, restou na proposta do Palácio do Planalto um aspecto controverso. Ao autorizar os chefes dos governos estaduais a reduzir ou eliminar impostos incidentes sobre os combustíveis (essencialmente, o ICMS), a PEC entra em uma queda de braço com os governadores, o que poderia resultar no atraso ou mesmo na não aprovação da proposta federal em um ano eleitoral, quando os projetos de lei, e ainda mais as PECs, tramitam com mais vagar. Os governos estaduais preferem o PL 1.472 por permitir que cada estado adeque a redução dos impostos estaduais (como o ICMS) a sua capacidade de arrecadação e a sua disponibilidade orçamentária.

Os chefes dos Executivos estaduais argumentam que, caso zerassem os impostos sobre os combustíveis, teriam uma perda tributária da ordem de R$ 27 bilhões sem ter como apresentar uma alternativa a tempo de compensá-los em pleno eleitoral. Além disso, pelo princípio da anualidade fiscal, um imposto só pode entrar em vigor no ano seguinte à sua criação e aprovação pela casa legislativa (no caso, as Assembleias Legislativas dos estados). Dessa forma, os governadores não teriam como criar tributos em pleno ano eleitoral para só começar a arrecadá-los no ano seguinte (em 2023), gerando um rombo nas contas estaduais. Os governadores ficariam expostos, ainda, às penalidades impostas pelos Tribunais de Contas estaduais ao apresentaram contas desequilibradas ao fim de seu mandato. Isto seria um risco muito elevado para correr, argumentam os governadores. Líderes do governo federal no Congresso argumentam que a PEC é autorizativa e não impositiva, ou seja, os governadores não estariam obrigados a reduzir os impostos sobre os combustíveis, mas poderiam fazê-lo se o desejassem.

O que esperar, então, da PEC e do PL 1.472/2021? A PEC, caso aprovada em negociação com os governadores, permitiria que o governo federal reduzisse imediatamente os impostos federais (Cide, PIS e Cofins) sobre os preços do diesel e do gás de cozinha, o que já retiraria uma grande fonte de pressão sobre os preços e, consequentemente, sobre as taxas de inflação. A aprovação do PL 1.472, por sua vez, permitiria uma estabilização dos preços estaduais dos combustíveis, mudando a data-base de fixação de preços. Dessa forma, a PEC e o PL 1.472/2021 são, na verdade, complementares; se implementados em conjunto, podem contribuir para uma nova política de combustíveis para o país.

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Ricardo Caldas, economista e cientista político com Ph.D. em Relações Internacionais, é especialista da Fundação da Liberdade Econômica.